Nós deveríamos aprender a cultivar um saudável e lúcido desprezo por argumentos. Hitler argumentava magistralmente. Provavelmente assim também Lenin.
O advogado que vence o caso é o que melhor argumenta, para prejuízo do réu inocente condenado. Ou da sociedade quando o criminoso é absolvido.
A realidade tem prioridade sobre argumentos; estes aceitam toda a verdade que o argumentador preferir.
O argumento deveria se restringir a um conjunto de premissas das quais se possa inferir formalmente uma conclusão. E a avaliação do argumento recai unicamente em checar se tais premissas são verdadeiras e se nenhuma outra premissa pertinente foi seletivamente ignorada. ( Pressupondo-se que se trate de um argumento logicamente válido. )
Mas que percentual do eleitorado tem realmente esse tipo de predisposição intelectual?
O que um candidato diz, e como diz, tem ínfima importância. O que importa realmente é saber quem está apoiando o candidato, quem está pondo dinheiro naquela campanha, e em uma medida um tanto menor, quais grupos estão se opondo a ele. Estas são as chaves para se presumir que direção pode seguir uma futura administração do candidato.
Em relação ao candidato virtualmente eleito, Jair Bolsonaro, percebo nitidamente pelo menos três grupos impulsionando essa candidatura: a turma do boi, da bala e da bíblia. Mas às vezes me pergunto se não tem mais nada por trás, porque a máquina de propaganda que montaram pra essa campanha nas redes sociais é impressionante. Tanto em tamanho quanto em competência no que tange a saber como influenciar quem pra eles vale a pena ser influenciado.
Nenhum outro partido - e o dele é minúsculo! - tá sabendo como competir com esse tipo de propaganda em uma eleição em que o peso da mídia tradicional vai ser muito menor do que sempre foi. Os caras tão fazendo coligações esdrúxulas para ganhar segundos de televisão que serão desperdiçados em uma propaganda eleitoral que pouca gente vai ter paciência pra ver.
Enquanto isso, no mundo real, estão todos com a cara enfiada no seu smartphone: no ônibus, no metrô, na praia, no banco, na fila do pão... seus cérebros aprendendo a interpretrar o mundo utilizando um padrão ainda mais superficial de superficialidades que se formam e se desfazem rapidamente em um caleidoscópio de informações fugazes e intercaladas, condicionando o sistema digestivo de ideias ao apetite pelos argumentos fast-food, que é justamente o discurso que é servido pela campanha dos conservadores nas redes sociais.
Bolsonaro já venceu. Tentando ver pelo lado bom, é uma chacoalhada no mundo político que vai ter que começar a acordar para a realidade de que, para quem insistir nesse nível de descaso, corrupção e incompetência, vai ficar cada vez mais difícil ser eleito.