Desculpe, não acompanhei toda a conversa então a minha questão pode ser redundante. Mas li, páginas atrás, que pra você o ectoplasma era uma interpretação particular do espiritismo para um determinado fenômeno real. Para o qual, possivelmente, caberiam outras interpretações. Mas não vi em nenhuma parte você provar que um tal fenômeno existe.
Existir significa ser objetivamente físico e externo ou significa acontecer? Se a resposta for o primeiro, então coisas como memória, raciocínio e subjetividade inexistem? Essas coisas, apesar de não terem existência concreta e externa,
acontecem. O que digo, então, é que existe
algo que acontece, e que, dentro de um ambiente espírita, passa a ser interpretado como ectoplasma, assim como outras coisas que neste ambiente passam a ser interpretadas como comunicações do além, por serem vistas de forma parcial e situada dentro da doutrina.
Tô perguntando isso porque um fenômeno que possa ser interpretado como um ectoplasma é evidentemente algum fenômeno que possui materialidade, e portanto não pode ser totalmente subjetivo, psíquico.
Claro, mas o erro consiste justamente na interpretação, que é
motivada (wishful thinking)
Em quê você se sustenta para acreditar que possa ocorrer mesmo algum fenômeno passível de ser interpretado como uma materialização ectoplasmática?
O fenômeno em si são sempre as coisas tais como acontecem, vistas de maneira neutra e objetiva. Por exemplo - escutar vozes é escutar vozes, apenas isso. Se eu ressignificar isso dentro de um contexto no qual essas vozes são "almas", "conscientes", "desencarnadas", "comunicando", etc etc, tudo isso já não é mais o fenômeno em si, mas a minha interpretação motivada e supersticiosa. O fenômeno em si (da materialização de um espírito, por exemplo) é a própria visão que todos estão tendo. Ponto. Isso e apenas isso é o fenômeno, falando objetivamente, e que pode perfeitamente acontecer por meio do processo que vou descrever na minha resposta ao Gigaview.
Viu as fotos acima? São pessoas nojentas enfiando tiras de pano no nariz e na boca. Se existe algum fenômeno que possa, de boa fé, ser interpretado como um ectoplasma, então porque todos os "registros" que espíritas fazem do fenômeno sempre vieram a ser fraudes toscas como estas?
Sinceramente, não sei como o CX e outros líderes espíritas puderam ser coniventes com isso e eu mesmo, se ainda praticasse o kardecismo, teria grande dificuldade de aceitar e responder. Entretanto, não devemos confundir o que alguém nos diz a respeito de algo com a coisa em si. Se alguém tentar por exemplo, tentar explicar darwinismo com péssimos argumentos, com falácias, de maneira desajeitada e confusa, muitos crentes se gabarão e acusarão alegremente as falhas e imperfeições do expoente pensando, com isso, estar refutando o próprio darwinismo em si. Só que a interpretação de um grupo acerca de um fenômeno não é o fenômeno.
"Pessoas sugestionáveis em ambiente espírita, onde se conversou muito sobre esse assunto, à noite e na hora de dormir, podem aceitar uma sugestão de que alguns ruídos são evidências da manifestação de espíritos e até compreendidos como sons de vozes que passam a ser identificadas por todo o grupo num processo de histeria coletiva."
E é uma descrição genérica que sempre funciona porque você vivenciou um fenômeno psicológico absolutamente normal.
Você pode substituir ambiente espírita por cemitério ou hospício desativado, pode substituir as pessoas por escoteiros ao redor de uma fogueira num acampamento numa floresta escura compartilhando estórias "verdadeiras" de sacis, mulas sem cabeça, etc...ou imaginar um grupo de alunos no fundo do colégio contando estórias sobre o espírito da "loira do banheiro". Alguns deles vão ouvir alguma coisa estranha, ver moitas se mexendo estranhamente ao redor, e se mijando de medo para não encontrar a "loira". Se os integrantes do grupo encontram apoio entre si, ruídos se transformam em vozes, moitas adquirem olhos de fogo e a "loira" ameaça sair do banheiro.
Reconheço a boa intenção, mas simplesmente não é assim. Não são ruídos que se transformam em vozes através de um processo sugestivo. São efetivamente vozes, altas, claras e sonoras, que percebemos diretamente. O mesmo se dá com imagens, quando a sensibilidade é maior ainda. Não são informações sensoriais reprocessadas e transformadas por sugestionabilidade. São efetivamente experiências diretas de natureza não-física, que se apresentam diretamente à consciência sem intermédios.
Explicando como acredito que aconteça, sem uso de termos esquisotéricos:
Nós temos uma instância de nossa faculdade de imaginação situada sob nosso controle consciente (ex: visualização, memória, reflexão etc) mas também uma situada fora - um processamento automático constante que independe de nossas decisões e atitudes. De ambas as formas, temos um mecanismo que bloqueia os estímulos advindos dessa camada da mente para que nos voltemos para a existência física e objetiva, voltado para as funções biológicas, sobrevivência etc, de forma que o
input sensorial se sobrepõe à informação que circula no nosso sistema. Quando dormimos, por exemplo, e cessamos a atividade consciente, a mente começa a procurar outro
input de informação que sirva como base para projetar o holograma da experiência (já que essa é a própria função da mente). Com a ausência de estímulo sensorial, a glândula pineal começa a trabalhar e, junto com a secreção de melatonina, o mecanismo bloqueador do estímulo onírico vai sendo desativado na mesma proporção em que os músculos e nervos (exceto em caso de sonambulismo) vão sendo desligados e aos poucos a informação do próprio sistema começa a ser utilizado pela mente como input para projeção, substituindo os sentidos físicos - nesse momento, aquele mesmo processo autônomo começa a se apresentar para nós na forma de cenas, sons e imagens (o processo se apresenta a nós como se fossem experiências físicas, justamente por serem formas de interpretação com as quais a mente está habituada - mas isso também se modifica, por exemplo, no caso de pessoas que possuem inteligência musical, matemática, ou outra, e a informação se expressa diretamente dessa forma, já que a mente aprendeu a trabalhar nela). O reaparecimento de estímulo sensorial (como por exemplo no caso da luz solar, que desativa a glândula pineal) faz a mente voltar a tomar a experiência objetiva como
input, reativando os músculos e cessando a experiência onírica a qual me referi anteriormente.
Eu falei anteriormente em um
campo onírico compartilhado. Como seria possível compartilhar um plano onírico? Não seria cada manifestação onírica exclusiva a cada mente que o experimenta? Apesar de que cada um só pode experimentar o onirismo a partir de si mesmo, o onirismo é compartilhado por todos nós enquanto instância da mente. É como o raciocínio lógico-matemático, por exemplo. Cada um só pode raciocinar através de sua própria mente, mas o raciocínio em si, enquanto faculdade, é por nós compartilhado. Tendo entendido isso, assim como o raciocínio matemático pode seguir um mesmo sistema numérico e, dois indivíduos distintos, ao olhar para a mesma equação "1+1=" podem receber diretamente em suas mentes a representação "2", da mesma forma os indivíduos podem, por compartilharem da mesma subjetividade implícita de crenças+valores+intenções, receber diretamente uma mesma representação que se apresenta à consciência de todos (apesar de cada um experimentar isso a partir da própria mente). Essa apresentação pode se dar na forma de intuição, sensação, sentimento, audição, visão ("clarividência") etc.
Aí entra a hipnagogia. O corte do estímulo físico é necessário para a ativação da glândula pineal. Por isso, os desenvolvimentos mediúnicos, assim como as reuniões esquisotéricas, demandam ambientes calmos, escuros, silenciosos. Já os momentos de ir acordar e ir dormir são os preferidos para o acontecimento dos "desdobramentos", visões etc. O desenvolvimento mediúnico é, no fundo, o desenvolvimento da capacidade de ligar e desligar voluntariamente o bloqueador do estímulo onírico. O que acontece então é que o sonho invade a realidade com experiências vívidas e bem reais para quem experimenta. E, em uma coletividade que compartilha do mesmo background a nível inconsciente, o sonho compartilhado reassegura a todos das crenças que já tinham como premissa.