Sobre mercado, um trecho do "Teses para a esquerda" do Marcos Rolim..........
18- A idéia da superação do mercado como projeção utópica pressupõe toda a mitologia comunista e é, em si mesma, inconcebível em termos de política econômica. Sem uma instituição do tipo mercado, perde-se qualquer referência entre esforço e resultado, entre quantidade de trabalho utilizado e o valor de uso que ele produz. O que o mercado oferece aos agentes econômicos é este vínculo -por certo imperfeito, mas ainda assim um vínculo que permite alocar recursos com base em critérios objetivos. A idéia do planejamento de uma economia socialista - pela qual a sociedade decidiria democraticamente o que produzir implica em planejar, também, os meios de produzir o que se decide produzir. Teoricamente, isto significaria dispor sobre todas as informações relevantes do processo de produção e, ato contínuo, decidir por maioria de votos o que produzir e como. Qualquer nação contemporânea possui, atualmente, algumas dezenas de milhões de produtos identificáveis, desagregados em tipos específicos como, modelos, cores e tamanhos diferentes de uma mesma peça de roupa, sapato, etc. "Esta produção é sustentada por algumas centenas de milhares de unidades produtivas mais, é claro, milhares de empresas de construção, de transportes, estabelecimentos de venda por atacado e varejo. Nenhuma delas pode produzir ou distribuir nada sem a cooperação coordenada da atividade de numerosas unidades econômicas que produzem, transportam e distribuem. Uma grande fábrica, por exemplo, que produz carros ou equipamentos para a indústria química é uma montadora de partes e componentes que podem ser feitos em, literalmente, milhares de fábricas diferentes, cada uma das quais com diferentes tarefas e que, por sua vez, dependem da oferta de matérias-primas, combustíveis e equipamentos, produzidos por centenas ou mais de outras unidades de produção. Introduza-se a dimensão temporal (as coisas devem ser fornecidas pontualmente e em seqüência), acrescente-se a importância das previsões quanto a consertos, manutenção, substituição, investimentos e capacidades produtiva futura, treinamento e desenvolvimento da força de trabalho, suas necessidades quanto à moradia, lazer, cabeleireiros, lavanderias, calefação e a decorrente necessidade de materiais de construção, grampos de cabelo, combustíveis, móveis...Realmente, muito simples!" (4) As tentativas de superação do mercado na experiência do Socialismo Real implicaram, por óbvio, em ineficiência e atraso tecnológico, de um lado, além de terem sido extraordinariamente funcionais à negação da democracia, por outro. Como a própria pretensão do "planejamento democrático", nos termos da ideologia marxista, é apenas uma ficção, o que se alcançou concretamente foi a planificação estatal da economia a partir da emergência de uma poderosa burocracia que aparece como necessidade funcional do próprio processo de "planejamento total". A suposição do conteúdo "democrático" do planejamento através dos "produtores associados" não se sustentaria um segundo sequer se os ideólogos lembrassem que cada uma das milhões de escolhas necessárias em um processo de produção condicionam todas as demais de uma forma absolutamente imponderável. Assim, se A e B definem-se em favor de uma decisão econômica relevante, C e D - cujas atividades ou interesses se relacionam com aquela área atingida pela decisão - não podem fazer uma opção "consciente" pois não podem saber antes qual será a escolha de A e B. Ainda que toda esta geringonça burocrática funcionasse, caberia perguntar: com base em que eticidade poderia se legitimar a perda do direito ao consumo dos bens desejados pelas eventuais minorias em um processo de "planejamento" da produção? De fato, o mercado é o substrato econômico da autonomia da sociedade civil diante do Estado. Destruir o mercado eqüivale a destruir a sociedade civil, sem a qual não há liberdade política, nem democracia. Se é certo, como nos ensinou Marx, que os meios de produção são as "fontes da vida", disto se depreende que o monopólio dos meios de produção implica o controle monopolista da vida humana. Como o modelo socialista exige a planificação e a concentração das forças produtivas nas mãos do Estado, é evidente que planificação e liberdade são noções excludentes. A economia planificada é irracional e liberticida.