É um erro pensar que todo criacionista é um fanático religioso,
negador da realidade. Há dois tipos de criacionistas: os que
elaboram os argumentos e os que repetem os argumentos.
A maioria dos "crias" são do tipo "repetidor" mas os argumentos
que eles utilizam foram nitidamente construídos para iludir por
pessoas que têm plena consciência que o relato do Gênesis é um
mito e estão tão convencidas da ancestralidade comum das espécies
quanto qualquer um aqui.
Criacionismo é um movimento político marionetado por um segmento
que atribui a sua crescente perda de influência na sociedade
norte-americana ao que eles chamam de "naturalismo materialista".
Todo o discurso criacionista é sempre elaborado em conformidade
com a estratégia jurídica que por acaso eles estejam adotando
no momento com o objetivo de introduzir o ensino dos seus dogmas
religiosos nas escolas públicas e limitar a influência do
chamado "naturalismo materialista", ou seja, o ensino de ciências,
na formação intelectual dos jovens.
Na década de 20 os criacionistas foram derrotados nos tribunais
quando tentaram impedir o ensino da T.E. nas escolas. Tentaram
então impor o ensino de religião mas ficou estabelecido que
isso seria inconstitucional. A próxima cartada veio quando eles
utilizaram um professor para processar o Estado por ser obrigado
a ensinar a "religião evolucionista". A idéia era descaracterizar
a T.E. como teoria científica para impedir o seu ensino com
base na mesma inconstitucionalidade que impedia o ensino do
criacionismo. Embora essa tática também não tenha dado resultados
até hoje criacionistas repetem que o darwinismo é dogmático,
que é fundamentado na fé, etc... porque esse foi o discurso
cunhado na época.
Na década de 60 eles mudam a abordagem e tentam apresentar
o criacionismo como uma teoria científica alternativa.
Surge o "criacionismo científico" com a teoria das hidroplacas,
do zoneamento ecológico, a baraminologia, e outras aberrações
do gênero, todas desenvolvidas sob encomenda para essa nova
investida jurídica, que também veio a fracassar.
O próximo passo foi o DI, o criacionismo bem disfarçado.
Mas agora resolveram investir em uma nova estratégia, bolada
por aquele advogado, autor de "Darwin no Tribunal" cujo nome
me fugiu agora... Tudo seria uma questão de filosofia. A
Ciência, ou o que eles de maneira bem calculada estão preferindo
chamar de "naturalismo materialista" seria uma posição filosófica,
uma maneira particular de apreender e interpretar o mundo.
Sendo uma abordagem filosófica tem tanto valor quanto qualquer outra
abordagem filosófica. Tem tanto valor quanto a posição filosófica
do "realista teísta". Ou seja, o criacionismo.
Mas isso tudo é apenas retórica de advogado, a ídéia aqui é que
se ficar determinado que no final das contas tudo se reduz a
uma questão de diferentes filosofias então não há nada de
inconstitucional no ensino do DI ou do criacionismo.
Alguém mais atento pode facilmente perceber como essa última
estratégia já começa a influenciar o discurso dos criacionistas
"repetidores". "Crias" já podem ser vistos falando sobre sua
"visão cosmogônica" de mundo em oposição a "visão cosmogônica"
dos materialistas e pessoas com formação em Filosofia estão
sendo cooptadas assim como pessoas com formação científica
foram cooptados para atuarem como propagandistas do criacionismo
científico.
E se isso tudo tá parecendo teoria da conspiração é porque é
conspiração mesmo.
A "responsabilidade" maior do combate ao criacionismo acaba estando nas mãos dos teístas e deístas, acho que são os que têm maior poder de convencer os fundamentalistas sobre esse erro "epistemológico". É complicado, porque de certa forma os fundamentalistas estão argumentalmente até mais certos, dentro de uma perspectiva teísta. Sob esse ponto de vista, a "responsabilidade" cai novamente sobre céticos, ateus e simpatizantes, em mostrar que a fé simplesmente não serve como "método científico", e que o(s) método(s) científico(s) de verdade são uma forma superior de se conhecer a realidade do que a fé.
E de certa forma, colocando as coisas deste modo, o Buckaroo está entrando na deles. É assim
que eles querem que esta questão seja interpretada agora. Não porque esta seja honestamente
uma posição filosófica mas porque esse é o expediente jurídico em que os criacionistas estão
apostando dessa vez.