É engraçado como os cristãos se gabam de sua fidelidade às escrituras, quando na verdade o cristianismo é construído com base em uma série de mitos e suposições que não constam dos textos judaicos originais. O caso da associação da serpente do Éden com Satanás é um exemplo disso. Na verdade toda a construção do personagem Satanás, que é central ao cristianismo, é totalmente anti-veterotestamentária.
Pesquisando um pouco, descobri que para os judeus Satanás é apenas um personagem pontual que aparece em poucas passagens do VT, sem qualquer relevância para o contexto bíblico geral. Para eles Deus é a origem de tudo, inclusive do mal. O judeu não têm a necessidade que têm os cristãos de criar um anti-deus.
Também o mito da desobediência e da expulsão de Adão e Eva ( Gênesis 3) não é mesmo um ponto central do judaísmo, como é no cristianismo. Os judeus não acreditam em pecado original, nem em sua transmissão de pai para filho. Diferentemente dos cristãos, os judeus encaram o texto de gênesis 3 como ele é, atendo-se apenas ao que está escrito, sem inventar estórias e interpretações paralelas.
Aí, contrariamente e com base no mesmo texto, os cristãos fazem uma série de suposições e inventam um monte de estórias que nada têm à ver com o que está de fato escrito. Pressupõe que Adão e Eva eram imortais, que tudo era perfeito e que não existia mal no mundo (inclusive a morte, ou seja, nem mesmo os animais morriam), que a serpente, que o próprio texto descreve como sendo um dos animais criados por deus, é ao mesmo tempo um anjo que (segundo outra invencionice cristã que não acha amparo no V.T.) supostamente teria se rebelado contra deus e seria a origem de todo mal, que a desobediência do homem ao comer do fruto proibido teria levado deus a amaldiçoar toda a criação gerando o mal no mundo, que para desfazer este mal seria necessário que deus se sacrifica-se a si mesmo, que tudo foi planejado por deus,...
Vejam quantas suposições que nada tem à ver com o que está de fato escrito no V.T.
Satanás é uma figura muito controvertida na Bíblia. A palavra "Satã" significa em hebraico "acusador", "opositor". Aparece, pela primeira vez no livro de Jó, sendo como um promotor celestial. A sua intimidade com Deus e o direito de entrar no "Céu", de ir e vir livremente e dialogar com Ele, torna-o uma figura de muito destaque. Veja o livro de Jó 1:6 "Um dia em que os filhos de Deus se apresentaram diante do Senhor, veio também Satanás entre eles".
O livro de Jó foi escrito depois do Exílio Babilônico. Sabemos que o povo judeu, tendo retornado a Israel com a permissão de Ciro, rei persa, no ano 538 a.C, assimilou muitos costumes dos persas. Isto ocorreu devido à simpatia e apoio que receberam do rei, que inclusive permitiu a construção do Segundo Templo judaico e ainda devolveu muitos de seus tesouros, que haviam sido roubados. A religião dos persas, o Zoroastrismo, influenciou sobremaneira o judaísmo. No Zoroastrismo, existe o Deus supremo Ahura-Mazda, que sofre a oposição de uma outra força poderosa, conhecida como Angra Mainyu, ou Ahriman, "o espírito mau". Desde o começo da existência, esses dois espíritos antagônicos têm-se combatido mutuamente.
O Zoroastrismo foi uma das mais antigas religiões a ensinar o triunfo final do bem sobre o mal. No fim, haverá punição para os maus, e recompensa para os bons. E foi do Zoroastrismo que os judeus aprenderam a crença em um Ahriman, um diabo pessoal, que, em hebraico, eles chamaram de SATAN - Por isso, o seu aparecimento na Bíblia só ocorre no livro de Jó e nos outros livros escritos após o exílio Babilônico, do ano 538 a.C. para cá. Nestes livros já aparece a influência do Zoroastrismo persa. Observe ainda que a tentação de Adão e Eva é feita pela serpente e não por Satanás, demonstrando assim que o escritor do Gênesis não conhecia Satanás. Os sábios judaicos, interpretando o Eclesisastes 10:11, afirmam (Pirkei de Rabi Eliezer 13) que, na verdade, a cobra que seduziu Adão e Eva era o Anjo Samael, que apareceu na terra sob a forma de serpente. Ele, que é conhecido como o "dono da língua", usou sua língua para seduzir Adão e Eva ao pecado. O poder do mal está em sua língua, e este poder pode ser usado somente para dominar o sábio. Ele não pode prevalecer sobre um ignorante.
Uma outra observação interessante é que o livro de Samuel foi escrito antes da influência persa no ano de 622 a.C. e, no II livro de Samuel em seu capítulo 24:1, você lê com relação ao recenseamento de Israel o seguinte: "A cólera de IAHVÉH se inflamou novamente contra Israel e excitou David contra eles, dizendo-lhe: Vai recensear Israel e Judá".
Agora veja esta mesma passagem no I livro das Crônicas, que foi escrito no começo do ano 300 a.C, portanto, já sob a influência do Zoroastrismo persa, com o já conhecimento de Ahriman/Satanás. No capítulo 21:1 desse livro está escrito: "e levantou-se Satã contra Israel, e excitou David a fazer o recenseamento de Israel". Portanto, o que era IAHVÉH no livro de Samuel aparece agora no livro das Crônicas como SATANÁS (Confira em sua Bíblia).
Assim, está evidenciado que Satanás não é um conceito original da Bíblia, e sim, introduzido nela, a partir do Zoroastrismo Persa.
Passa a existir a partir daí, "uma lenda" entre o povo judeu de que Satanás é considerado como o rei dos demônios, que se rebelara contra Deus sendo expulso do céu. Ao exilar-se do céu, levou consigo uma hoste de anjos caídos, e tornou-se seu líder. A rebelião começou quando ele, Satanás, o maior dos anjos, com o dobro de asas, recusou prestar homenagem a Adão. Afirmam ainda que esteve por trás do pecado de Adão e Eva, no Jardim do Éden, mantendo relação sexual com Eva, sendo portanto, pai de Caim. Ajudou Noé a embriagar-se com vinho e tentou persuadir Abraão a não obedecer a Deus no episódio do sacrifício do seu filho Isaac.
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Extraído de um texto espírita: http://www.saindodamatrix.com.br/archives/2005/12/lucifer_satanas.html
Uma coisa se faz importantíssimo separar e a partir daí entende-se o que realmente é influência cultural e influência religiosa.
O que ajuda a entender a diferença entre a influência cultural da influencia religiosa, seria identificar o que significa cada um dos livros, no caso o Tanach e a Torá, para o Judaismo.
Sendo o Tanach um livro que narra a historia de Israel, dentro de um estilo literário próprio, tentando equalizar informações históricas com ensinamento religioso, na perspectiva de períodos de tempo marcados por eventos de confrontos da nação de Israel frente as culturas dos povos circunvizinhos.
E por outro lado a Tora, o livro maior do Judaísmo que determina a teologia Judaica.
Pode verificar que aceitamos que o povo foi influenciado sim.
Porem tal influencia não é aceita, como também não é estendida a teologia do Judaísmo.
O Tanach narra a história da nação de Israel no período dos Juízes, dos Reis a partir de Saul até os profetas do retorno do exílio babilônico.
E toda esta narrativa esta com uma literatura sob a ótica religiosa!
Mas esta ótica não define a Teologia Judaica.
Quem define Teologia Judaica é a Tora, o nosso maior livro!
A partir da Tora e que se tem as diretrizes da teologia Judaica.
Considerando a Tora não se pode afirmar que o Judaísmo seja marcado pela mesma concepção do Zoroastrismo, pois isto seria um erro.
A Tora Bíblia inicia-se em Bereshit, (Gênesis) - para ensinar-nos que D'us é a Fonte de tudo.
Também em Devarim (Deuteronômio) cap. 30:19 está escrito: “Hoje invoco os céus e a terra como testemunhas contra vocês, de que coloquei diante de vocês a vida e a morte, a bênção e a maldição. Agora escolham a vida, para que vocês e os seus filhos vivam”
Mas no próprio Tanach já no livro de Isaías cap. 45:7 esta escrito: "Eu formei a luz e criei as trevas; Eu crio a paz e crio o mal"
A Tora é claríssima. D´us é a fonte da vida e da morte, do bem e do mal.
Nisto consiste o Monoteísmo Judaico.
Se você conceber a idéia de um ser divino e um ser maligno atuando de forma independente e contrapondo-se um ao outro, você não vive monoteísmo e sim uma concepção dúbia.
O estilo literário do Tanach não expressa exatamente o que seja a teologia Judaica, mas sim o momento que passava a nação de Israel.
Isto tudo nos leva a crer que não foi sem motivo que no próprio Tanach aparece o profeta Isaías no cap. 45:7 declarando:
"Eu formei a luz e criei as trevas; Eu crio a paz e crio o mal"
O profeta Isaias, assim como todos os profetas estavam realizando o seu trabalho de restaurar a cultura do povo influenciadas pelas culturas dos povos vizinhos. Este era o trabalho deles.
Isto nos mostra que o povo Judeu nunca esteve livre de ser influenciado por outros povos, e isto não é negado.
São famosas as queixas dos profetas a respeito do desvio do povo das leis da Torá, para abraçarem costumes dos povos vizinhos.
Porém ao mesmo tempo sempre teve a disposição lideranças que lutaram para afastar o povo de tais influências.
A versão ocidental de Satanás como força antagônica a D´us não é de origem Judaica, é originária do Zoroastrismo. Influência esta que estendeu-se ao Cristianismo, e isto é percebido nos Evangelhos.
A partir do momento que o Ocidente concebe a idéia de Satã como um ser antagônico a D´us, em uma luta constante, disputando almas uma a uma, fica natural que esta forma de pensar sempre tem a tendência de delimitar as interpretações.
Ou seja, a pessoa já começa a estudar os escritos Judaicos procurando determinar a conclusão para a sua forma de entender.
O resultado sempre será uma interpretação desviada do verdadeiro contexto da cultura na qual as escrituras se encontram.
O pensamento ocidental sofre a tendência a forma grega de pensar, que é direta.
É preciso pensar de forma multi-focal, para entender a Tora e o Tanach, pois é assim que se raciocina no modo Judaico. Atenção a todos os detalhes, sem descartar nada.
Caso contrário será sempre induzido a erros, que mesmo sendo pequenos tendem a conduzir a um caminho muito distante do original.
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Resposta de um judeu sobre o tema: http://br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20080828041208AAqsoU9