Agora, sim, vou ler decentemente o que vocês escreveram - e responder de acordo.
[...]
Lada e Skoda eram soviéticos. Mas teu argumento se mantém, ambos são duas bostas
De qualquer forma...
1. É típico do stalinismo, e não de todas as correntes do marxismo uma excessiva burocracia. O trotskismo (por exemplo) é especialmente avesso a ela, e é ela quem causa toda a demora e dor-de-cabeça quando você quer algo do Estado. Mas o stalinismo foi implantado e o trotskismo não.
Como eu escrevi antes, você está especulando com modelos hipotéticos de marxismo, pois eles não foram operacionalizados em nenhum lugar.
Mas quando analisamos os regimes marxistas que foram instalados desde 1917 até o final dos anos 70, observa-se que todos foram centralizadores, burocráticos e repressores de seus povos.
2. Há diversos exemplos de estatais ineficientes, sim. Mas, dê uma olhada nesta pesquisa.
Ela compara a eficiência do sistema de distribuição de água por meios públicos e privados no Brasil, e segundo a pesquisa, a distribuição estatal é um pouco mais eficiente que a privada.
Claro, não dá pra generalizar ("se pra distribuição de água é mais eficiente, pro resto também"), mas ao menos demonstra que sim, iniciativa estatal pode competir no mesmo nível que a iniciativa privada. E se você tem um Estado controlado pela população (controle real, não "no papel" cof cof Brasil), com isso, você tem um ganho considerável do poder da população como um todo.
O DDV já abordou sobre a questão da oferta de água potável, que se dá sob a forma de monopólio natural, assim como a energia elétrica, pelas suas especificidades. Eu somente não concordo com o DDV no que tange à superioridade da oferta concorrencial, em relação aos problemas relacionados ao meio-ambiente.
E não existe (e nem nunca existiu) um Estado realmente controlado pela população e desta condição nenhum Estado socialista ou comunista sequer chegou perto.
3. Boa parte da ineficiência soviética é histórica:
a. Vamos e venhamos, o Império Russo que precedeu a URSS não era nenhum símbolo de eficiência. A URSS herdou isso por questão cultural;
A Rússia Tsarista possuía ilhas de excelência em termos de cultura e conhecimento científico, bastando lembrar os nomes de Pietr Tchaikovsky e Konstantin Tsiolkovsky. Um dos principais motivos que a tornava menos eficiente e pujante, em termos econômicos, era a ausência de uma burguesia que conecta-se a população campesina e operária com a cúpula imperial.
b. Mais uma vez, questão política influindo na economia. É necessário inteligência, conhecimento e capacidade para se opor a algo efetivamente. Quem Stalin expurgou, matou e mandou pra Sibéria? Justamente as pessoas que se opunham a ele efetivamente. Na prática, ele burrificou toda uma geração.
O expurgo stalinista afetou o potencial de crescimento da URSS sem dúvida, mas a maior parte dos atingidos estava no setor de humanas e não no setor de exatas ou biológicas. Um
scholar do tipo sociólogo causava muito mais estragos que um PhD em Matemática.
Penso que o atraso tecnológico soviético, excluindo os setores militares e espacial, ocorreu em função da natureza do sistema produtivo e econômico e não pela falta de mão-de-obra com qualificação.
c. No caso dos outros países, isso era feito ou pela ditadura local, ou a mando da ditadura soviética. Vassalo é assim mesmo...
Todos os países socialistas foram, em diferentes graus, dependentes de Moscou, seja por admiração, seja por dependência financeira, seja por intimidação militar.
No caso brasileiro eu vejo muitos complicadores para implementar uma democracia direta, entre os quais estão a vasta superfície, a população muito grande e uma tremenda heterogeneidade cultural e intelectual. Isto poderia ser resolvido com a fragmentação do país em centenas a milhares de unidades político-administrativas, como as cidades-estado gregas, mas que não poderiam funcionar nos mesmos moldes das atuais unidades devido ao custo operacional elevadíssimo.
Concordo que há muitos complicadores. Mas a tecnologia pode ajudar - e muito - nesse ponto.
E você não precisa obter uma democracia 100% direta para haver já melhorias... se aplicada de forma gradual, mesmo no começo já seriam vistas diversas melhorias.
Uma alternativa seria aplicar apenas no nível municipal e não federal. O que você acha? Isso reduziria boa parte da heterogeinedade e diminuiria em muito os custos.
Aliás, quanto aos custos, eu preciso tomar vergonha na cara e os calcular... mas acho que é menor do que você imagina.
(Curiosamente, essa idéia de fragmentar o país em centenas de unidades é bem parecida com a minha de transformar o Brasil em uma federação de cidades-Estado...)
A simples criação de centenas ou milhares de unidades político-administrativas já demandaria despesas elevadas, pois seria necessária uma estrutura organizacional mínima em cada uma destas unidades, incluindo setores equivalentes aos atuais: executivo, legislativo e judiciário.
E para se calcular os custos com grande precisão seria necessário definir exatamente o tipo de organização de sociedade que se deseja.
A analogia dos sovietes me parece um tanto quanto fraca, porque cidades e países são muito mais complexos de controlar do que uma fábrica, principalmente se forem levados em considerações fatores que eram deconhecidos ou ignorados naquela época, como os ambientais.
É um pouco fraca, sim. Mas já seria algum avanço.
Eu sinceramente não deixaria que a população pudesse decidir sobre certos temas, em especial aqueles que demandam um maior conhecimento tecno-científico.
Quanto àquela sociedade dinamarquesa, do pouco que sei, me parece mais uma "bizarrice" do que um modelo capaz de ser replicável para uma escala maior, como um estado, sem mencionar o fato de que seus habitantes vivem integralmente das benesses produzidas tanto pelo estado dinamarquês como pelo sistema capitalista nativo.
Talvez possamos simplesmente ir repetindo o que eles fizeram e deu certo e ir aprendendo com os erros deles.
Christiania não é o paraíso na Terra, mas também não é o inferno...
Eu não conheço aquela comunidade, mas o ponto que eu quero insistir é que não há nenhuma evidência de que eles vivam sem interagir com as comunidades de entorno que não seguem aquele modelo e nem que eles vivam sem as vantagens obtidas pelo capitalismo nativo.
Todos os casos de "monopólio econômico estatal" resultaram em "monopólio econômico da Nomenklatura". Sem nenhuma exceção. Somente este fato já é motivo suficiente para abandonar esta idéia clássica do Marxismo.
Isso porque todas as implementações foram feitas em base do stalinismo, que tem como pilar "centralizar, centralizar e centralizar": centraliza-se o poder na URSS, centraliza-se o controle nas mãos do núcleo do Partido, centraliza-se até o papel higiênico na casa de uns e não de outros não é à toa que Stalin mandou fechar os sovietes... foi coerente com a ideologia dele de centralização, mas foi uma merda retardada fazer isso.
Até onde eu sei, os equivalentes dos “sovietes” em diversos países não foram fechados, como por exemplo na China de Mao, na Iugoslávia de Tito e na Polônia de Gomulka e Gierek. E em todos eles, a escassez e a baixa qualidade de bens e serviços foram notórios.
E quem vai definir o que é uso “coletivo” e o que é “privado”? O Estado?
Isso precisa ser definido de antemão pela população como um todo. E não só pelo Estado. Na minha opinião, o seguinte esquema:
Se você deixar a população decidir, é provável que se mantenham praticamente intactos os atuais conceitos vigentes nas democracias representativas capitalistas.
Então fatalmente, para que o padrão mude para os moldes que você deseja, esta decisão deverá caber ao Estado socialista, que em todos os casos conhecidos sempre foi manipulado pela Nomenklatura.
Aparentemente não há como escapar disto.
* Público - bens de produção [fábricas, fazendas], recursos minerais, água, eletricidade, sistema de educação, bibliotecas...
* Privado - pra simplificar: moradia e tudo que a gente usa dentro dela
Ou seja, o deus-Estado seria o detentor de quase tudo. Mas, apenas por curiosidade, as casas teriam algum tipo de padrão e ou limite?
Note que embora uma casa possa ser considerada também como um bem de produção, eu pessoalmente acho prefirível que fique nas mãos de quem mora nela, e não do Estado.
Sob a sua ótica marxista,
qualquer coisa pode ser considerado um bem de produção. E porque você acha preferível que a casa seja um bem privado e não do Estado?
E se a gente quiser evitar um 1984, é de suma importância que haja acesso e armazenamento da informação não só por meios públicos, mas também privados.
Em seu modelo, me parece que a conjuntura orwelliana é inevitável.
As empresas estatais que “funcionam” (que são competitivas) estão sob a égide administrativa e econômica do sistema capitalista OU são anomalias subvencionadas pelo Tesouro Nacional de cada país.
E em condições normais de funcionamento, uma empresa capitalista é infinitamente mais eficiente do que uma equivalente estatal, em qualquer setor da economia onde o lucro seja possível.
Não necessariamente - vide na minha resposta pro Fabrício um exemplo contrário...
Como eu também já respondi, o caso da empresa de água e saneamento é específica, assim como ocorre com a energia elétrica. E ainda assim, as empresas privadas são geralmente mais eficientes que as públicas em condições de mercados e macro-econômicos similares.
Os defeitos da “forma como ela foi implantada” são inerentes à propriedade estatal. Ou seja, eles são o efeito e não a causa do seu fracasso.
De qualquer modo eu pergunto: De qual forma ela poderia ter sido implantada para que seu sucesso fosse garantido?
Sucesso 100% garantido? Esqueça, isso não existe...
Concordo. Mas você não estranha o fato de que 100% dos regimes socialistas tenham fracassado na parte macro-econômica e no provimento de bens de consumo e de serviços decentes?
Mas algumas coisas que teriam no mínimo aumentado as chances de sucesso:
* Melhor preparo do proletariado e campesinato russos antes da Revolução.
Isto era impossível, dado o tamanho do território, da população e da distribuição desta.
Esse é um dos poucos erros que não remonta a Stalin, mas a Lênin. As coisas foram muito precipitadas, o que abriu espaço para o Partido depois usar essas duas classes como massa de manobra, e não ao contrário [o Partido ser um instrumento da população].
Então aqui você admite que a Nomenklatura predominou em todas as decisões da ex-URSS desde Lênin. Mas como isto pode ter ocorrido, se o Partido era composto por ideólogos que representavam o “anseio do povo”?
Como é que os ideólogos, todos embebidos com os ensinamentos “progressistas” marxistas, engelianos e feuerbachianos, puderam se aproveitar da população, já que sabiam que boa parte dos males sociais vem da ganância e do autoritarismo?
As duas classes precisavam ser educadas, e não doutrinadas;
E qual é a diferença entre elas em um regime socialista, baseando-se nas experiências e conhecimentos de todos os países que experimentaram a “ditadura de partido único”?
* O Exército deve estar em controle popular. Quando isso não ocorre, dá merda (independentemente do sistema econômico);
Não existiu e nunca existirá um exército eficiente sob “controle popular”, pois a natureza das decisões militares, principalmente em épocas de conflagração, caracteriza-se pela extrema concentração de poder, muito longe da decantada “democracia popular”. No atual cenário geoestratégico e militar é impensável um exército de qualidade nos moldes que você defende.
* Minimização da burocracia;
A experiência mostra que quanto maior for a proporção do Estado, maior é a burocracia. Assim sendo, como é que você vai diminuir a burocracia quando toda população se tornou um tipo de “funcionário público”?
Pelo contrário, você levará a burocratização ao paroxismo.
* Maior liberdade de expressão;
Objetivamente falando: Voce pode citar um só exemplo de um país socialista ou comunista que tenha sido submetido a um regime de partido único, desde 1917, e que tenha tido a tão decantada “liberdade de expressão”?
* Se você tenta extinguir uma classe, ela obviamente fará luta de classes. A forma como Stalin tentou proletarizar o campesinato não foi só brutal e sanguinolenta - foi imbecil. Com um pouco mais de calma, isso poderia ter sido feito sem mortes através de impostos gradualmente mais altos sobre o uso da terra agrícola, depois passar no papel as terras agrícolas pra mão do Estado, pra daí, depois de [digamos] 50 anos, você ter produção agrícola estatal sem ter queda na produtividade.
A produção agrícola sob comando estatal nunca foi satisfatória em nenhum país socialista, tenha ele tentado (ou não) eliminar o campesinato. O motivo inicial reside no fato de que o campesinato teve as suas atividades prejudicadas pelo Partido, seja por interferência, seja por indiferença (tanto Lênin quanto Stálin priorizavam a industrialização de base e não a agricultura).
Posteriormente o aumento de produção não mais ocorreu por aumento da área plantada, mas sim pelo aumento no rendimento das safras, conseguido pela biotecnologia e pela indústria de implementos. E estes quesitos nunca foram dominados pelos países socialistas.
Lênin não fez a NEP [Nova Política Econômica] porque achou bonitinha, foi exatamente por causa disso. Queda da produtividade agrícola = menos comida na mesa = população faminta = população burra. Ninguém pensa direito de barriga vazia, e esse simples erro do Stalin custou não só zilhões de mortos, mas também toda a União Soviética;
Nem mesmo a NEP foi capaz de deter a queda na produção agrícola, pois o campesinato sabia muito bem o que o “futuro socialista” reservava para eles.
* Maior independência dos países comunistas uns dos outros. Leste Europeu e Cuba se foderam por causa disso - dependiam demais da URSS tanto política como economicamente;
A sua premissa de “maior independência” contraria a própria ideia de revolução mundial propugnada com ardor por todos os esquerdistas entre o segundo meado do século XIX e o primeiro meado do século XX, pois para ser realizada tem que contar com a colaboração entre as “forças progressistas mundiais”, não se atendo aos limites de Estados Nacionais.
E de qualquer modo, qualquer país socialista pós-1917 estava fadado ao desastre econômico e ambiental, pois seus modelos de produção e macro-econômico eram (são) completamente anacrônicos e inaplicáveis.
* Permanência dos sovietes como entidades econômicas e políticas e menor centralização do poder político nas mãos do Partido, ou maior inclusão de pessoas no Partido [o que o faria deixar de ser um Partido, mas tudo bem...]
A existência de um só Partido implica em preponderância da Nomenklatura, com a inevitável exclusão da população, enquanto que a inclusão de muitas pessoas na estrutura partidária implica em uma demora extrema, talvez ao ponto de inoperância, nas tomadas de decisões.
Não há saída para este modelo.
* Maior poder nas províncias e cidades - menor poder na federação;
E como conciliar isto, com as necessidades de rápida e efetiva defesa do império, digo, da "mãe-pátria", contra os assaltos e ataques dos estados “imperialistas burgueses”?