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Minha questão é: Quem são os políticos e partidos com mais condição e interesse para combater essa atual guinada conservadora/religiosa na política brasileira?
Ou, de forma mais abrangente: quem pode representar os interesses dos céticos e humanistas em nosso país?
Caro Lakatos, eu acho que existem alguns exageros nesse texto, como chamar essa ala realmente conservadora de ULTRA conservadora ou dizer que agora demos uma guinada às masmorras quando temos representantes dos desmatadores, ou “da bala” sendo eleitos.
Ora, essa distorção de termos provoca erros obrigatórios nas discussões.
Veja, o texto também pontua que o EC precisa desses ultra conservadores para se manter ali, firme.
Desculpe pela demora para responder. Concordo que há exageros no texto, minha intenção com ele foi apenas contextualizar os pontos para onde eu queria direcionar o tópico, que é a influência aparentemente crescente das alas conservadoras do congresso (e da sociedade) sobre a política. Esse tipo de coisa está longe de ser sem precedentes, dado que o Brasil é um país majoritariamente conservador. O que me chamou mais a atenção foi isso estar acontecendo em um momento que aparentemente é favorável a avanços, visto que é o que ocorre em países "parecidos" com o Brasil em termos geopolíticos.
Vamos aos seus pontos:
1)A pauta do desmatamento não esteve nas últimas propostas de eleição presidencial, de forma coerente, pragmática e transparente.
Discordo em partes. Achei que os discursos de campanha demonstraram alguma preocupação com desenvolvimento sustentável, preservação e afins. O discurso da Marina Silva deu particular destaque a essa questão. Se foi coerente, pragmático e transparente é algo difícil de julgar, já que raríssimas propostas de políticos sobre qualquer tema chegam a sê-lo.
2)Tem gente famosa “de esquerda” e “de direita”, ou não ligada tão diretamente às atividades políticas mas que se conecta a ela, que se beneficia diretamente de grandes fazendas e, por consequente, do eterno conflito indígena.
Concordo, pelo menos em relação a partidos "grandes" (PT, PSDB, PMDB, DEM etc.).
3)As condições criadas para o “lobby das armas” tem origem não interna no congresso, mas na realidade violenta do país.
Concordo parcialmente. A realidade do país é violenta, mas me parece que a noção subjetiva quase apocalíptica sobre o estado da violência no Brasil que muitas pessoas possuem é um reflexo muito maior das informações de veículos de comunicação a que elas são expostos do que pelo que elas realmente presenciam. Não estou dizendo que há uma conspiração midiática que conscientemente tenta denegrir a imagem do estado vendendo uma realidade mais assustadora do que realmente é. Parece muito mais razoável que as razões sejam puramente mercadológicas. Já foi demonstrado que notícias negativas atraem mais atenção e geram mais engajamento de leitores, então é natural que, independentemente de como seja a realidade, quem quer vender jornal ou ter audiência na TV vai mostrar preferencialmente o que houver de pior acontecendo no país. Posto isso, é necessário separar o que é a "realidade violenta do país" do que é "a noção que as pessoas têm sobre a realidade violenta do país". Acredito que o clamor popular pela liberação de armas de fogo é muito mais efeito da segunda do que da primeira.
4)Pautas sobre a utilização de drogas, ou não, só serão utopicamente discutidas nesse país, enquanto se tem níveis de educação lastimáveis, meio “retrógados” mesmo.
Faz sentido, mas e o México? E o Uruguai? Colômbia? Equador? Argentina? Estão tão a frente de nós na questão educacional? Aparentemente estão no mesmo nível ou pouca coisa melhor, mas conseguiram avançar essas pautas muito mais rapidamente que aqui.
5)o ULTRA conservadorismo talvez seja melhor representado nos moldes oriente-médio ou similares. Se é esse, brasileiro, que representa algo ultra conservador, nós temos um ultra-conservadorismo meio light então.
Ok. "Ultra" realmente é um exagero.
6)Meio osso dizer que A América Latina avança, no contexto do presente artigo, quando quem vai bem por aqui não é exatamente o oposto, politicamente falando, do que se oporia ao conservadorismo.
Generalizar para a América Latina é apressado, claro, temos muitos outros países conservadores por aqui. O que a manchete quis dizer foi algo como "enquanto outros países da America Latina, com problemas sociais e políticos similares aos nossos, conseguem avançar, nós estamos retrocedendo". Quando se fala em América Latina, vêm logo à mente Bolívia e Venezuela, com regimes de características totalitárias e conservadoras, por isso torcemos o nariz, mas a coisa é muito mais ampla. O texto está nos pedindo para olhar para países como Uruguai, Equador, Argentina, Chile e México, todos progredindo em pautas de direitos civis.
7) O EC se mantém, onde está, com o suporte de vários representantes de pontas diferentes do espectro político, incluindo "esquerdistas" famosos, que precisam retroativamente do suporte do EC para não cair também.
Sim. A única oposição firme a ele vem de partidos minoritários irrelevantes como PSOL e Rede.
Isto posto, entendo que não houve qualquer guinada, mas sim ou uma manutenção dos caminhos meio tortos que já vinham historicamente sendo tomados, ou uma caída da cortina mentirosa que levou muita gente a acreditar que estávamos vendo conquistas sociais duradouras e sustentáveis sem precedente, ou uma resposta natural ao tom histérico que muito discurso veio tomando.
Mas é fato que tivemos conquistas sociais sem precedentes nos últimos anos. Geralmente quando alguém como eu fala em conquistas sociais, as pessoas já pensam "lá vem o petista defender o Bolsa Família", mas falo de coisas não apenas no campo de distribuição de renda. Falo de coisas como o Estatuto do Idoso em 2003, a Lei Maria da Penha em 2006 (tenho minhas críticas, mas foi uma conquista social), a liberação do casamento gay pelo STF em 2013, e até coisas apenas simbólicas como a eleição de uma mulher para presidente da república, o primeiro beijo gay na novela da Globo ou outros fatos que eu demoraria para lembrar agora. Enfim, é difícil não admitir que passávamos por uma época particularmente liberal e que uma nova onda conservadora surgiu e ganhou corpo de uns tempos pra cá. Essa onda, ao menos cronologicamente, acompanha a queda de popularidade (merecida) do governo federal, dado que essas conquistas ficaram - correta ou incorretamente - associadas ao governo petista.
Parto para tentar responder a sua pergunta agora, mas sem entender que houve guinada. Os políticos e partidos brasileiros com mais condição de combater essa frente religiosa são, até agora, inexistentes ou por já falhar consistentemente em levar a frente essa missão, ou por fazerem parte do mesmo bolo obrigatoriamente, quando não há pauta exatamente sendo defendidas por partidos “com representação séria e efetiva” que não as deles mesmos, da manutenção de poder e mamata.
Talvez o NOVO represente alguma luz no fim do túnel, ainda a ser confirmada. Que provavelmente, do ponto de vista humanista, não se dará tão direta e caricatamente como se espera, mas que por (tentar) garantir o avanço econômico do país, vai novamente criar condições para que as transformações sociais ocorram de modo sustentável.
O problema que vejo com o Novo é o tipo de gente que está apoiando o partido. Há uma minoria de liberais
stricto sensu, ou seja, liberais econômicos e civis, e uma maioria (pelo menos no barulho) de liberais econômicos e conservadores civis, que viram nessa proposta uma alternativa aos grandes partidos de oposição e que certamente vão cobrar essa representação dos políticos que elegerem. A grande questão é se o partido vai ignorar as demandas conservadoras de seus eleitores (que devem ser numerosos nas próximas eleições) e se conformar em ser um partido pequeno representando os interesses dessa minoria de liberais ou se vai ceder à busca pelo poder e passar a representar os interesses da maioria conservadora e virar uma versão brasileira do Partido Republicano. De longe, esse último cenário me parece muito mais provável.
A parte disso, eu não vejo qualquer entidade séria o suficiente pra levar a frente “os interesses dos céticos e humanistas em nosso país”. Agrupamentos populares podem existir com essas intenções, mas infeliz e fatalmente lhes falta poder para prosseguir, o que vai surgir daqui, no máximo, serão os grupos mais radicais e violentos tentando dar uma solução na coisa, mas que por muitos dos defensores de causas “humanistas” não vai ser interpretado como algo certamente positivo.
Compartilho desse pessimismo.