Spencer, peço que dê uma olhada em todos os comentários que fiz em seu tópico. Penso que você não estava errado quando disse que "aos céticos que lhes falta algo quando exigem provas irrefutáveis da existência de Deus, ou espíritos, etc". É tão difícil como explicar música para um surdo, mas, no fundo, creio que na verdade os céticos sejam os mais ardentes buscadores da verdade. Vemos uma grande massa religiosa por aí que, em termos práticos, vive uma vida absolutamente pragmática e material. Qual o sentido disso? Muitos se dizem católicos, evangélicos, espiritólicos, etc, mas definitivamente não parecem estar sendo absolutamente sinceros consigo mesmos. Pense comigo - se alguém realmente acreditar, aqui e agora, que há um Cristo e um Céu, ela não deveria reorientar totalmente o leme de sua vida, e empenhar absolutamente todos os seus esforços na conquista de sua perfeição espiritual? Não há nem como ponderar ou colocar na balança - seria o Agora versus toda a Eternidade! E, como especula Pascal, apostar contra o infinito é perda definitiva. Mas, na prática, o que vemos? Pseudomédiuns se servindo de todo tipo de artifício para impressionar e se impor sobre os incautos, pseudocatólicos contrariando todos os mandamentos de amor com seus pensamentos reacionários, pseudoevangélicos rezando por um aumento, um carro... Rezar por um carro! Qual a explicação disso? O sujeito acredita que a vida dele é passageira, um teste de virtude para a conquista da imortalidade, e, ao invés de usar o material em prol do espiritual, ele busca o espiritual em prol do material! Pessoas que recorrem a centros de umbanda, esoterismo, etc, buscando curas para problemas, doenças, etc. A pessoa crê no Espírito em prol da cura de seu corpo Físico? Qual o sentido disso? Pseudo"cirurgias espirituais" por aí... Por esse tipo de coisa, formei a convicção de que a única experiência espiritual autêntica precisa ser uma experiência arrebatadora. Uma transfiguração radical da personalidade natural do indivíduo, um ataque impiedoso à sua consciência egóica, mesquinha, cotidiana, e sua substituição paulatina pela sabedoria, pelo silêncio e pela virtude. Por isso, comecei a me interessar pela ideia de "Iluminação", pesquisando o surgimento e o legado de "Iluminados" ao longo da História. Aprendi que iluminados foram buscadores ardentes da verdade que rasgaram os véus da experiência ordinária da realidade e da vida, e, com seus rasgos, deixaram trilhas que os que vieram depois tentaram seguir. A religião é um fenômeno interessante - pessoas seguindo o caminho de pessoas que supostamente se iluminaram. Pessoas seguindo o caminho de pessoas que seguiram seu próprio caminho. Pessoas seguindo o caminho de pessoas que não seguiram o caminho de ninguém, e, justamente por isso, experimentaram "O Outro" em seus próprios corações e consciências. O que é esse "Outro"? O "Outro" em nós é o que há, em nosso âmago, que não é nosso. Ele não nos pertence, e, por isso, precisamos abordá-lo mais por meio do que ele "Não É" do que tentando dizer algo a respeito. O que ele Não É - nossos apegos, vícios, egos, desejos, palavras, ideias, lógicas, etc. Ele não pode ser apreendido pela consciência objetiva, porque ele é de outra natureza. Isso não quer dizer que ele seja irracional, ilógico ou abstrato, porque somos nós mesmos que criamos essas coisas (aberrações, distorções, abstrações), e ele é justamente o "Incriado" em nós. Gosto muito dos céticos porque, assim como os Buscadores da iluminação, são pessoas sinceras, o primeiro passo da senda. Não devemos ter medo de perder nossas crenças e "sistemas explicativos da realidade" porque, na verdade, são só isso - crenças e pseudoexplicações da realidade. Deveríamos ter medo é de perder nossa sinceridade, de nos tornarmos mais um zumbi hipócrita jogando o jogo de autoengano e autoafirmação das fileiras de algum culto institucionalizado. Por isso, por transparecer sua verdadeira essência, um cético é muito mais um buscador da luz do que qualquer pessoa que simplesmente leia e adote sistemas convenientes de explicação do sofrimento e da vida. O que acontece é que o cético ainda está tentando escutar a música com seus próprios olhos. Ele tenta subjugar O Outro, O Todo, O Tao, O Atma, A Mônada à sua consciência objetiva e cotidiana, quando é esta que deveria cair de joelhos diante de sua majestade. O cético tenta apreender O Outro com as ferramentas dO Eu, quando O Eu é que deve se render ao Outro para que, fecundado, desabroche na rosa mística, a jóia do lótus, o ouro alquímico, o que nada mais é do que a Conquista da Sabedoria. O Outro, O Absoluto, O Incognoscível é o verdadeiro "Senhor de toda a vida". Quando percebemos o quanto somos efêmeros e pequenos, e nos dobramos diante do milagre da Vida, da Natureza e do Amor, então reconhecemos que não temos como apreender estas coisas com ferramentas do Eu, como crendices ou argumentações, porque tudo isso se torna insignificante. A "Queda" do homem foi sua consciência de si, quando se julgou independente, completo e separado do resto. A Sabedoria Suprema, para corrigir esta ruptura, inspirou em seu coração a Fé, a Contemplação, o sentimento de Transcendência, o anseio pela Reintegração, pela Religação. Ela deseja o tempo todo fazer uma aliança conosco, e somos nós que protelamos indefinidamente seu pedido - dizemos que ainda não, não estamos prontos, são tantos apegos, tantos desejos... A verdade, Spencer, é que os céticos não estão mais errados do que todos que se dedicam incessantemente a discussões teológicas e especulações metafísicas. Não estão fazendo, no fundo, nada mais do que adiar sua reconciliação com a divindade em si. Antes disso, querem especular sobre todo tipo de experiências fora de seu alcance, precisam "arrumar desculpas" para a iluminação. Um homem atravessando uma floresta foi alvejado por uma flecha envenenada, seus parentes e amigos chamaram o cirurgião para retirar a seta e cuidar da ferida, mas o ferido recusou dizendo:"Esperem um pouco. Antes que retirem a flecha, quero saber quem a atirou. Foi homem ou mulher? Foi algum nobre ou camponês? De que era feito o arco? O arco que atirou a flecha era grande ou pequeno? Ele era feito de madeira ou bambu? De que era feita a corda do arco? Era ela feita de fibra ou tripa? A seta era de rota ou junco? Que penas eram usadas? Antes que extraiam a seta, quero saber tudo a respeito dessas coisas."
Antes que estas informações possam ser obtidas, seguramente o veneno terá tempo de circular em todo o sistema e o homem poderá morrer. A primeira providência a ser tomada é retirar a flecha, para que seu veneno não se espalhe. Se um homem postergar sua busca e prática da Iluminação até que suas questões sejam solucionadas, ele morrerá antes de encontrar o Caminho. Que as rosas floresçam em vossa cruz!