Autor Tópico: Quem gosta de poesia?  (Lida 44473 vezes)

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Offline Worf

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #100 Online: 08 de Fevereiro de 2007, 07:47:12 »
Imagens que passais pela retina
Dos meus olhos, porque não vos fixais?
Que passais como a água cristalina
Por uma fonte para nunca mais!...

Ou para o lago escuro onde termina
Vosso curso, silente de juncais,
E o vago medo angustioso domina,
- Porque ides sem mim, não me levais?

Sem vós o que são os meus olhos abertos?
- O espelho inútil, meus olhos pagãos!
Aridez de sucessivos desertos...

Fica sequer, sombra das minhas mãos,
Flexão casual de meus dedos incertos,
- Estranha sombra em movimentos vãos.

Camilo Pessanha



Paisagens de Inverno II

Passou o outono já, já torna o frio...
- Outono de seu riso magoado.
Álgido inverno! Oblíquo o sol, gelado...
- O sol, e as águas límpidas do rio.

Águas claras do rio! Águas do rio,
Fugindo sob o meu olhar cansado,
Para onde me levais meu vão cuidado?
Aonde vais, meu coração vazio?

Ficai, cabelos dela, flutuando,
E, debaixo das águas fugidias,
Os seus olhos abertos e cismando...

Onde ides a correr, melancolias?
- E, refratadas, longamente ondeando,
As suas mãos translúcidas e frias...

Camilo Pessanha

Offline Quereu

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #101 Online: 10 de Fevereiro de 2007, 22:38:35 »
                         uma vez
                   
                                uma fala

                                       uma foz

                          uma vez         uma bala

                   uma fala          uma voz

             uma foz         uma vala

     uma bala           uma vez

             uma voz

                    uma vala

                           uma vez


Augusto de Campos
A Irlanda é uma porca gorda que come toda a sua cria - James Joyce em O Retrato do Artista Quando Jovem

Offline Quereu

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #102 Online: 10 de Fevereiro de 2007, 22:54:22 »
FIM

Eu existo para assistir ao fim do mundo.
Não há outro espetáculo que me invoque.
Será uma festa prodrigiosa, a única festa.
Ó meus amigos e comunicantes,
Tudo o que acontece desde o princípio é a sua preparação.

Eu preciso presto assistir ao fim do mundo
Para saber o que Deus quer comigo e com todos
E para saciar minha sede de teatro.
Preciso assistir ao julgamento final,
Ouvir os coros imensos,
As lamentações e as queixa de todos,
Desde Adão até o último homem.

Eu existo para assistir ao fim do mundo,
Eu existo para a visão beatífica.

Murilo Mendes
A Irlanda é uma porca gorda que come toda a sua cria - James Joyce em O Retrato do Artista Quando Jovem

Offline Quereu

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #103 Online: 10 de Fevereiro de 2007, 22:59:44 »
MOTIVO

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem triste
sou poeta.


Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso dias e noites
no vento.

Se desmorono ou edifico
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico ou
passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.

Cecília Meireles
A Irlanda é uma porca gorda que come toda a sua cria - James Joyce em O Retrato do Artista Quando Jovem

Offline Clara Campos

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #104 Online: 12 de Fevereiro de 2007, 20:06:20 »
Imagens que passais pela retina
Dos meus olhos, porque não vos fixais?
Que passais como a água cristalina
Por uma fonte para nunca mais!…

Ou para o lago escuro onde termina
Vosso curso, silente de juncais,
E o vago medo angustioso domina,
- Porque ides sem mim, não me levais?

Sem vós o que são os meus olhos abertos?
- O espelho inútil, meus olhos pagãos!
Aridez de sucessivos desertos…

Fica sequer, sombra das minhas mãos,
Flexão casual de meus dedos incertos,
- Estranha sombra em movimentos vãos.

Camilo Pessanha



Paisagens de Inverno II

Passou o outono já, já torna o frio…
- Outono de seu riso magoado.
Álgido inverno! Oblíquo o sol, gelado…
- O sol, e as águas límpidas do rio.

Águas claras do rio! Águas do rio,
Fugindo sob o meu olhar cansado,
Para onde me levais meu vão cuidado?
Aonde vais, meu coração vazio?

Ficai, cabelos dela, flutuando,
E, debaixo das águas fugidias,
Os seus olhos abertos e cismando…

Onde ides a correr, melancolias?
- E, refratadas, longamente ondeando,
As suas mãos translúcidas e frias…

Camilo Pessanha

lindo


Offline Eros

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #105 Online: 07 de Março de 2007, 23:41:49 »
Está é especial para o dia internacional da mulher.

O Homem e a Mulher

O homem é a mais elevada das criaturas; a mulher, o mais sublime dos ideais.   
Deus fez para o homem um trono; para a mulher fez um altar.   
O trono exalta e o altar santifica.     
O homem é cérebro; a mulher, coração.   
O cérebro produz a luz; o coração produz amor.   
A luz fecunda; o amor ressuscita.     
O homem é o gênio, a mulher o anjo.   
O gênio é imensurável; o anjo é indefinível.     
A aspiração do homem é a suprema gloria; a aspiração da mulher é a virtude extrema.   
A gloria promove a grandeza e a virtude, a divindade.     
O homem tem a supremacia; a mulher, a preferência.   
A supremacia significa forca; a preferência representa o direito.     
O homem é forte pela razão; a mulher invencível pelas lagrimas.   
A razão convence e as lagrimas comovem.     
O homem é capaz de todos os heroísmos; a mulher, de todos os martírios.   
O heroísmo enobrece e o martírio purifica.     
O homem pensa e a mulher sonha.   
Pensar é ter uma palavra no cérebro; sonhar é ter na fronte uma aureola.     
O homem é a águia que voa; a mulher, o rouxinol que canta.   
Voar é dominar o espaço e cantar é conquistar a alma.     
Enfim o homem esta colocado onde termina a terra;  a mulher, onde começa o céu.       

Victor Hugo

Victor Hugo (26 de fevereiro de 1802 em Besançon - 22 de maio de 1885, Paris) foi um escritor e poeta francês, autor de Les Misérables e de Notre-Dame de Paris, entre diversas outras obras.



Offline Worf

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #106 Online: 15 de Março de 2007, 02:00:56 »

lindo


:)



Oceano Nox

Junto do mar, que erguia gravemente
A trágica voz rouca, enquanto o vento
Passava como o vôo do pensamento
Que busca e hesita, inquieto e intermitente,

Junto do mar sentei-me tristemente,
Olhando o céu pesado e nevoento,
E interroguei, cismando, esse lamento
Que saía das coisas, vagamente…

Que inquieto desejo vos tortura,
Seres elementares, força obscura?
Em volta de que idéia gravitais?

Mas na imensa extensão, onde se esconde
O Inconsciente imortal, só me responde
Um bramido, um queixume, e nada mais…

Antero de Quental
« Última modificação: 15 de Março de 2007, 02:04:03 por Worf »

Offline Worf

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #107 Online: 15 de Março de 2007, 02:05:31 »
Divina Comédia

Erguendo os braços para o céu distante
E apostrofando os deuses invisíveis,
Os homens clamam: - "Deuses impassíveis,
A quem serve o destino triunfante,

Por que é que nos criastes?! Incessante
Corre o tempo e só gera, inextinguíveis,
Dor, pecado, ilusão, lutas horríveis,
Num turbilhão cruel e delirante...

Pois não era melhor na paz clemente
Do nada e do que ainda não existe,
Ter ficado a dormir eternamente?

Por que é que para a dor nos evocastes?"
Mas os deuses, com voz inda mais triste,
Dizem: - "Homens! por que é que nos criastes?"

Antero de Quental

Eriol

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #108 Online: 15 de Março de 2007, 10:42:54 »
El sueño del Fraile

Un lecho, un fraile perdido
en sueños y sueños y sueños.
La puerta abre, se desliza
un bulto bailando, obsceno.

Bailan piernas de aceite
bajo luna y candil ardiendo
Sobre las sábanas bailan manos
cubiertas de miel y veneno.

El fraile levanta, inquieto
sujeta la cruz en el pecho.
El bulto, impasible, avanza,
la luz resbalando en sus senos.

Desde dos montes emana de flores
húmedas irresistible aliento
El viento se alza y ruge
en sueños y sueños y sueños.


Por mim, feito hoje na classe de Espanhol enquanto deveria estar estudando literatura do SXIX… Que vos parece meu poeminha? Qualquer relação estilística e temática com García Lorca não é coincidência.  :P
« Última modificação: 15 de Março de 2007, 11:37:08 por Rodrigo »

Offline O ENCOSTO

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #109 Online: 15 de Março de 2007, 11:00:20 »
Eu sou poeta;

Vento na montanha,
a terra molhada,
pela chuva esperada,
enquanto o sol da madrugada,
entra pelas entranhas.

Poros da terra,
ralos de areia,
corpos que nascem,
no pé da serra.




http://oencosto.rv.cnt.br
Onde houver fé, levarei a dúvida.

Offline Oceanos

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #110 Online: 17 de Março de 2007, 20:21:43 »
Não sei se alguém já postou:

 

Quase
(Fernando Veríssimo)
 
Ainda pior que a convicção do não,
É a incerteza do talvez,
É a desilusão de um quase!

É o quase que me incomoda,
Que me entristece,
Que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi.

Quem quase ganhou ainda joga,
Quem quase passou ainda estuda,
Quem quase amou não amou.

Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos,
Nas chances que se perdem por medo,
Nas idéias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no outono.

Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna.
A resposta eu sei de cor.

Está estampada na distância e na frieza dos sorrisos,
Na frouxidão dos abraços,
Na indiferença dos "bom dia", quase que sussurrados.

Sobra covardia e falta coragem até para ser feliz.

A paixão queima,
O amor enlouquece,
O desejo trai.

Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor.
Mas não são.
 
Se a virtude estivesse mesmo no meio-termo,
O mar não teria ondas,
Os dias seriam nublados e o arco-íris em tons de cinza.

O nada não ilumina,
Não inspira,
Não aflige nem acalma,
Apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si.

Preferir a derrota prévia à dúvida da vitória é desperdiçar a oportunidade de merecer.
Para os erros há perdão,
Para os fracassos, chance,
Para os amores impossíveis, tempo.

De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar alma.
Um romance cujo fim é instantâneo ou indolor não é romance.

Não deixe que a saudade sufoque,
que a rotina acomode,
que o medo impeça de tentar.

Desconfie do destino e acredite em você.
Gaste mais horas realizando que sonhando…

Fazendo que planejando…
Vivendo que esperando…

Porque, embora quem quase morre esteja vivo,
Quem quase vive já morreu.

Quem me indicou foi o Agnostic.


E a que tem o trecho da minha assinatura:

SENTIMENTAL
(Drummond)

Ponho-me a escrever teu nome
com letras de macarrão.
No prato, a sopa esfria, cheia de escamas
e debruçadas na mesa todos completam
esse romântico trabalho.

Desgraçadamente falta uma letra,
uma letra somente
para acabar teu nome!

- Está sonhando? Olhe que a sopa esfria!

Eu estava sonhando…
E há em todas as consciências um cartaz amarelo:
"Neste país é proibido sonhar."
« Última modificação: 17 de Março de 2007, 20:29:15 por Oceanos »

Offline Rodion

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #111 Online: 17 de Março de 2007, 22:54:19 »
El sueño del Fraile

Un lecho, un fraile perdido
en sueños y sueños y sueños.
La puerta abre, se desliza
un bulto bailando, obsceno.

Bailan piernas de aceite
bajo luna y candil ardiendo
Sobre las sábanas bailan manos
cubiertas de miel y veneno.

El fraile levanta, inquieto
sujeta la cruz en el pecho.
El bulto, impasible, avanza,
la luz resbalando en sus senos.

Desde dos montes emana de flores
húmedas irresistible aliento
El viento se alza y ruge
en sueños y sueños y sueños.


Por mim, feito hoje na classe de Espanhol enquanto deveria estar estudando literatura do SXIX… Que vos parece meu poeminha? Qualquer relação estilística e temática com García Lorca não é coincidência.  :P

quer fazer uma versão em português? hehe
"Notai, vós homens de ação orgulhosos, não sois senão os instrumentos inconscientes dos homens de pensamento, que na quietude humilde traçaram freqüentemente vossos planos de ação mais definidos." heinrich heine

Offline Worf

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #112 Online: 28 de Março de 2007, 00:49:58 »
Crepuscular

Há no ambiente um murmúrio de queixume,
De desejos de amor, d'ais comprimidos...
Uma ternura esparsa de balidos,
Sente-se esmorecer como um perfume.

As madressilvas murcham nos silvados
E o aroma que exalam pelo espaço,
Tem delíquios de gozo e de cansaço,
Nervosos, femininos, delicados.

Sentem-se espasmos, agonias d'ave,
Inapreensíveis, mínimas, serenas...
- Tenho entre as mãos as tuas mãos pequenas,
O meu olhar no teu olhar suave.

As tuas mãos tão brancas d'anemia...
Os teus olhos tão meigos de tristeza...
- É este enlanguescer da natureza,
Este vago sofrer do fim do dia.

Camilo Pessanha

Danieli

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #113 Online: 28 de Março de 2007, 01:03:15 »
Como nuvens pelo céu
 
 
Como nuvens pelo céu 
Passam por mim.
Nenhum dos sonhos é meu 
Embora eu os sonhe assim.

São coisas no alto que são
Enquanto a vista as conhece,
Depois são sombras que vão
Pelo campo que arrefece.

Símbolos? Sonhos? Quem torna
Meu coração ao que foi?
Que dor de mim me transforma?
Que coisa inútil me dói?
 
Fernando Pessoa
17-06-1932

Danieli

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #114 Online: 28 de Março de 2007, 01:10:33 »
Deve chamar-se tristeza
 
Deve chamar-se tristeza
Isto que não sei que seja
Que me inquieta sem surpresa
Saudade que não deseja.

Sim, tristeza  -  mas aquela
Que nasce de conhecer
Que ao longe está uma estrela
E ao perto está não a Ter.

Seja o que for, é o que tenho.
Tudo mais é tudo só.
E eu deixo ir o pó que apanho
De entre as mãos ricas de pó.

Fernando Pessoa 

Offline Pregador

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #115 Online: 28 de Março de 2007, 16:12:37 »
Citar
TONEL DO ÓDIO.

O Ódio é o tonel das pálidas Denaides frias;
Por mais que da Vingança o braço rubro e forte
Derrame-lhe às entranhas ermas e sombrias
Baldes cheios de sangue e lágrimas da morte,

O Diabo lhe abre furos nunca imaginados,
Que verteriam séculos de esforço e suor,
Mesmo que à vida ela trouxesse os condenados
Para o corpo infligir-lhes castigo maior.

O Ódio é um ébrio perdido ao fundo da taverna,
Que sente sua sede emergir do licor
E ali multiplicar-se qual hidra de Lerna.

Mas quem bebe feliz verá seu vencedor,
E ao Ódio resta apenas a amarga certeza
De saber que jamais dormirá sob a mesa.


Charles de Baudelaire, em “As Flores do Mal”.

Pra mim, a poesia Simbolista é a melhor.
"O crime é contagioso. Se o governo quebra a lei, o povo passa a menosprezar a lei". (Lois D. Brandeis).

Skorpios

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #116 Online: 28 de Março de 2007, 16:55:55 »
Capricho


Ai! quando
Brando
Vai o vento
Lento


À lua
Nua
Perpassar sutil;


E a estrela
Vela,
E sobr'a linfa
A ninfa
Suspira
Mira
O divinal perfil;


Num leito
Feito
De cheirosas
Rosas,
Risonhos
Sonhos
Sonharemos nós;


Revoltos,
Soltos
Os cabelos
Belos,
Vivace
A face,
Tremulante a voz


Cantos
E prantos
Que suspira
A lira,
A alfombra,
À sombra,
Encontrarei pra ti;


Celuta,
Escuta
De meu seio
O enleio...
Vem, linda,
Ainda
Há solidões aqui.
 

Castro Alves

Offline Pregador

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #117 Online: 28 de Março de 2007, 17:17:29 »
Tem outra de Cruz e Souza, também simbolista.

Citar
A música da Morte

A música da Morte, a nebulosa, 
estranha, imensa música sombria, 
passa a tremer pela minh'alma e fria 
gela, fica a tremer, maravilhosa …
Onda nervosa e atroz, onda nervosa, 
letes sinistro e torvo da agonia, 
recresce a lancinante sinfonia 
sobe, numa volúpia dolorosa …
Sobe, recresce, tumultuando e amarga, 
tremenda, absurda, imponderada e larga, 
de pavores e trevas alucina …
E alucinando e em trevas delirando, 
como um ópio letal, vertiginando, 
os meus nervos, letárgica, fascina …

Cruz e Souza

« Última modificação: 29 de Março de 2007, 09:06:52 por Amon »
"O crime é contagioso. Se o governo quebra a lei, o povo passa a menosprezar a lei". (Lois D. Brandeis).

Offline Worf

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #118 Online: 28 de Março de 2007, 19:46:26 »
Isso não é Castro Alves, Amon. É Cruz e Sousa.

Offline Worf

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #119 Online: 28 de Março de 2007, 19:49:16 »
Cruz e Sousa é um dos meus preferidos, também.




Acrobata da Dor
                           
Gargalha, ri, num riso de tormenta,   
como um palhaço, que desengonçado,   
nervoso, ri, num riso absurdo, inflado   
de uma ironia e de uma dor violenta.   

Da gargalhada atroz, sanguinolenta,   
agita os guizos, e convulsionado   
salta, gavroche, salta clown, varado   
pelo estertor dessa agonia lenta ...   

Pedem-se bis e um bis não se despreza!     
Vamos! retesa os músculos, retesa   
nessas macabras piruetas d'aço...   

E embora caias sobre o chão, fremente,   
afogado em teu sangue estuoso e quente,   
ri! Coração, tristíssimo palhaço.

Cruz e Sousa

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #120 Online: 29 de Março de 2007, 09:06:15 »
Isso não é Castro Alves, Amon. É Cruz e Sousa.

Verdade, escrevi errado.
"O crime é contagioso. Se o governo quebra a lei, o povo passa a menosprezar a lei". (Lois D. Brandeis).

Danieli

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #121 Online: 02 de Abril de 2007, 03:36:47 »
Amor
(Álvares de Azevedo)

Amemos! Quero de amor
Viver no teu coração!
Sofrer e amar essa dor
Que desmaia de paixão!
Na tua alma, em teus encantos
E na tua palidez
E nos teus ardentes prantos
Suspirar de languidez!
Quero em teus lábios beber
Os teus amores do céu,
Quero em teus braços morrer
No enlevo dos braços teu!
Quero viver de esperança,
Quero tremer e sentir!
No teu colo...
Quero sonhar e dormir!
Vem, anjo, meu amor,
Minha alma, meu coração!
Que noite, que noite bela!
Como é doce a viração!
E entre os suspiros do vento
Da noite ao mole frescor,
Quero viver um momento,
Morrer contigo de amor!

Offline Worf

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #122 Online: 02 de Abril de 2007, 04:04:39 »
:)


Idéias íntimas

II

(…)

Borra adiante folgaz caricatura
Com tinta de escrever e pó vermelho
A gorda face, o volumoso abdômen,
E a grossa penca do nariz purpúreo
Do alegre vendilhão entre botelhas,
Metido num tonel… Na minha cômoda
Meio encetado o copo, inda verbera
As águas d’oiro do Cognac ardente:
Negreja ao pé narcótica botelha
Que da essência de flores de laranja
Guarda o licor que nectariza os nervos.
Ali mistura-se o charuto havano
Ao mesquinho cigarro e ao meu cachimbo…
A mesa escura cambaleia ao peso
Do titâneo Digesto, e ao lado dele
Childe-Harold entreaberto… ou Lamartine
Mostra que o romantismo se descuida
E que a poesia sobrenada sempre
Ao pesadelo clássico do estudo.

XI
Junto do leito meus poetas dormem
— O Dante, a Bíblia, Shakespeare e Byron
Na mesa confundidos. Junto deles
Meu velho candeeiro se espreguiça
E parece pedir a formatura.
Ó meu amigo, ó velador noturno,
Tu não me abandonaste nas vigílias,
Quer eu perdesse a noite sobre os livros,
Quer, sentado no leito, pensativo
Relesse as minhas cartas de namoro…
Quero-te muito bem, ó meu comparsa
Nas doudas cenas de meu drama obscuro!
E num dia de spleen, vindo a pachorra,
Hei de evocar-te dum poema heróico
Na rima de Camões e de Ariosto,
Como padrão às lâmpadas futuras!

Álvares de Azevedo - Lira dos Vinte Anos.
« Última modificação: 02 de Abril de 2007, 04:07:32 por Worf »

Offline Worf

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #123 Online: 02 de Abril de 2007, 17:38:32 »
Un Soldado de Lee (1862)

Lo ha alcanzado una bala en la ribera
de una clara corriente cuyo nombre
ignora. Cae de boca. (Es verdadera
la historia y más de un hombre fue aquel hombre.)

El aire de oro mueve las ociosas
hojas de los pinares. La paciente
hormiga escala el rostro indiferente.
Sube el sol. Ya han cambiado muchas cosas

y cambiarán sin término hasta cierto
día del porvenir en que te canto
a ti que, sin la dádiva del llanto,

caíste como cae un hombre muerto.
No hay un mármol que guarde tu memoria;
seis pies de tierra son tu oscura gloria.


Um Soldado de Lee (1862)

Uma bala alcançou-o na ribeira
De um claro rio de nome esquecido.
Cai emborcado. (A história é verdadeira
E mais de um homem nele tem vivido.)

O ar de ouro move ociosas as ramadas
Do copado pinheiro. Uma paciente
Formiga escala o rosto indiferente.
Sobe o sol. Muitas coisas já mudadas

E sem fim no futuro mudarão
Até um certo dia em que te canto
A ti que, sem a dádiva do pranto,

Caíste como um homem morto ao chão.
Não há mármore a guardar tua memória;
Sete palmos de terra, tua obscura glória.

Jorge Luis Borges - El Otro, El Mismo (1964).

Danieli

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #124 Online: 05 de Abril de 2007, 03:43:20 »
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ÚLTIMA FLOR DO LÁCIO

Olavo Bilac


Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...

Amote assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: "meu filho!"
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

 

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