Autor Tópico: Quem gosta de poesia?  (Lida 44477 vezes)

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Offline Südenbauer

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #200 Online: 01 de Julho de 2011, 19:43:10 »
Muito boa! Acho que ela é bem musicável.

Offline Luiz Souto

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #201 Online: 09 de Julho de 2011, 17:13:26 »
Três poemas de Jorge Luis Borges


Poema dos Dons

Ninguém rebaixe a lágrima ou rejeite
Esta declaração da maestria
De Deus, que com magnífica ironia
Deu-me a um só tempo os livros e a noite.

Da cidade de livros tornou donos
Estes olhos sem luz, que só concedem
Em ler entre as bibliotecas dos sonhos
Insensatos parágrafos que cedem

As alvas a seu afã. em vão o dia
Prodiga-lhes seus livros infinitos,
Árduos como os árduos manuscritos
Que pereceram em Alexandria.

De fome e de sede (narra uma história grega)
Morre um rei entre fontes e jardins;
Eu fatigo sem rumo os confins
Dessa alta e funda biblioteca cega.

Enciclopédias, altas, o Oriente
E o Ocidente, centúruias, dinastias,
Símbolos, cosmos e cosmogonias
Brindam as paredes, mas inutilmente.

Em minha sombra, o oco breu com desvelo
Investigo, o bácuo indeciso,
Eu, que me figurava o Paraíso
Tendo uma biblioteca por modelo.

Algo, que por certo não se vislumbra
No termo acaso, rege, estas coisas;
Outro já recebeu em outras nebulosas
Tardes os muitos livros e a penumbra.

Ao errar pelas lentas galerias
Sinto às vezes com vago horror sagrado
Que sou o outro, o morto, habituado
Aos mesmos passos e nos mesmos dias.

Qual de nós dois escreve este poema
De uma só sombra e de um eu plural?
O nome que me assina é essencial,
Se é indiviso e uno esse anátema?

Groussac ou Borges, olho este querido
Mundo que se deforma e que se apaga
Numa empalidecida cinza vaga
Que se parece ao sonho e ao olvido.


 Spinoza
Las traslúcidas manos del judío
labran en la penumbra los cristales
y la tarde que muere es miedo y frío.
(Las tardes a las tardes son iguales.)

Las manos y el espacio de jacinto
que palidece en el confín del Ghetto
casi no existen para el hombre quieto
que está soñando un claro laberinto.

No lo turba la fama, ese reflejo
de sueños en el sueño de otro espejo,
ni el temeroso amor de las doncellas.

Libre de la metáfora y del mito
labra un arduo cristal: el infinito
mapa de Aquel que es todas Sus estrellas.



Xadrez

I

Em seu grave rincão, os jogadores
as peças vão movendo. O tabuleiro
retarda-os até a aurora em seu severo
âmbito, em que se odeiam duas cores.

Dentro irradiam mágicos rigores
as formas: torre homérica, ligeiro
cavalo, armada rainha, rei postreiro,
oblíquo bispo e peões agressores.

Quando esses jogadores tenham ido,
quando o amplo tempo os haja consumido,
por certo não terá cessado o rito.

Foi no Oriente que se armou tal guerra,
cujo anfiteatro é hoje toda a terra.
Como aquele outro, este jogo é infinito.


II

Rei tênue, torto bispo, encarniçada
rainha, torre direta e peão ladino
por sobre o negro e o branco do caminho
buscam e libram a batalha armada.

Desconhecem que a mão assinalada
do jogador governa seu destino,
não sabem que um rigor adamantino
sujeita seu arbítrio e sua jornada.

Também o jogador é prisioneiro
(diz-nos Omar) de um outro tabuleiro
de negras noites e de brancos dias.

Deus move o jogador, e este a peleja.
Que deus por trás de Deus a trama enseja
de poeira e tempo e sonho e agonias?
Se não queres que riam de teus argumentos , porque usas argumentos risíveis ?

A liberdade só para os que apóiam o governo,só para os membros de um partido (por mais numeroso que este seja) não é liberdade em absoluto.A liberdade é sempre e exclusivamente liberdade para quem pensa de maneira diferente. - Rosa Luxemburgo

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Offline hymenoptera

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #202 Online: 15 de Julho de 2011, 21:49:43 »
Viver                                                            Semana

A dúvida embaça                                      Segunda amaldiçoada                               
a desgraça ameaça                                  por vir mais uma semana
mas a ilusão embala                                 suada
                                                                 No sábado ei de vingar de ti
então, espero em esperança!                   isto se à loucura conseguir resistir
                                                                domingo,
                                                                acordar tarde
                                                                ou será que só se acorda do sábado na segunda!?
                                                                             
                                                                                                                                          Hymenoptera
                                     

Offline TMAG

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #203 Online: 19 de Julho de 2011, 10:57:46 »

T. S. Eliot: The Love Song of J. Alfred Prufrock


S'io credesse che mia risposta fosse
A persona che mai tornasse al mondo,
Questa fiamma staria senza piu scosse.
Ma perciocche giammai di questo fondo
Non torno vivo alcun, s'i'odo il vero,
Senza tema d'infamia ti rispondo.


Let us go then, you and I,
When the evening is spread out against the sky
Like a patient etherized  upon a table;
Let us go, through certain half-deserted streets,
The muttering retreats
Of restless nights in one-night cheap hotels
And sawdust  restaurants with oyster-shells:
Streets that follow like a tedious argument
Of insidious intent
To lead you to an overwhelming question . . .
Oh, do not ask, "What is it?"
Let us go and make our visit.

In the room the women come and go
Talking of Michelangelo.

The yellow fog that rubs its back upon the window-panes,
The yellow smoke that rubs its muzzle on the window-panes
Licked its tongue into the corners of the evening,
Lingered upon the pools that stand in drains,
Let fall upon its back the soot that falls from chimneys,
Slipped by the terrace, made a sudden leap,
And seeing that it was a soft October night,
Curled once about the house, and fell asleep.

And indeed there will be time
For the yellow smoke that slides along the street,
Rubbing its back upon the window-panes;
There will be time, there will be time
To prepare a face to meet the faces that you meet;
There will be time to murder and create,
And time for all the works and days of hands
That lift and drop a question on your plate;
Time for you and time for me,
And time yet for a hundred indecisions,
And for a hundred visions and revisions,
Before the taking of a toast and tea.

In the room the women come and go
Talking of Michelangelo.

And indeed there will be time
To wonder, "Do I dare?" and, "Do I dare?"
Time to turn back and descend the stair,
With a bald spot in the middle of my hair--
[They will say: "How his hair is growing thin!"]
My morning coat, my collar mounting firmly to the chin,
My necktie rich and modest, but asserted by a simple pin--
[They will say: "But how his arms and legs are thin!"]
Do I dare
Disturb the universe?
In a minute there is time
For decisions and revisions which a minute will reverse.

For I have known them all already, known them all:--
Have known the evenings, mornings, afternoons,
I have measured out my life with coffee spoons;
I know the voices dying with a dying fall
Beneath the music from a farther room.
So how should I presume?

And I have known the eyes already, known them all--
The eyes that fix you in a formulated phrase,
And when I am formulated, sprawling on a pin,
When I am pinned and wriggling on the wall,
Then how should I begin
To spit out all the butt-ends of my days and ways?
And how should I presume?

And I have known the arms already, known them all--
Arms that are braceleted and white and bare
[But in the lamplight, downed with light brown hair!]
Is it perfume from a dress
That makes me so digress?
Arms that lie along a table, or wrap about a shawl.
And should I then presume?
And how should I begin?
. . . . .
Shall I say, I have gone at dusk through narrow streets
And watched the smoke that rises from the pipes
Of lonely men in shirt-sleeves, leaning out of windows? . . .

I should have been a pair of ragged claws
Scuttling across the floors of silent seas.

. . . . .

And the afternoon, the evening, sleeps so peacefully!
Smoothed by long fingers,
Asleep . . . tired . . . or it malingers,
Stretched on the floor, here beside you and me.
Should I, after tea and cakes and ices,
Have the strength to force the moment to its crisis?
But though I have wept and fasted, wept and prayed,
Though I have seen my head [grown slightly bald] brought in upon a platter,
I am no prophet--and here's no great matter,
I have seen the moment of my greatness flicker,
And I have seen the eternal Footman hold my coat, and snicker,
And in short, I was afraid.

And would it have been worth it, after all,
After the cups, the marmalade, the tea,
Among the porcelain, among some talk of you and me,
Would it have been worth while,
To have bitten off the matter with a smile,
To have squeezed the universe into a ball
To roll it toward some overwhelming question,
To say: "I am Lazarus,  come from the dead
Come back to tell you all, I shall tell you all"--
If one, settling a pillow by her head,
Should say: "That is not what I meant at all.
That is not it, at all."

And would it have been worth it, after all,
Would it have been worth while,
After the sunsets and the dooryards and the sprinkled streets,
After the novels, after the teacups, after the skirts that trail along the
floor--
And this, and so much more?--
It is impossible to say just what I mean!
But as if a magic lantern  threw the nerves in patterns on a screen:
Would it have been worth while
If one, settling a pillow or throwing off a shawl,
And turning toward the window, should say:
"That is not it at all,
That is not what I meant, at all."

. . . . .

No! I am not Prince Hamlet,  nor was meant to be;
Am an attendant lord, one that will do
To swell a progress, start a scene or two,
Advise the prince; no doubt, an easy tool,
Deferential, glad to be of use,
Politic, cautious, and meticulous;
Full of high sentence, but a bit obtuse
At times, indeed, almost ridiculous--
Almost, at times, the Fool.

I grow old . . .I grow old . . .
I shall wear the bottoms of my trousers rolled.

Shall I part my hair behind? Do I dare to eat a peach?
I shall wear white flannel trousers, and walk upon the beach.
I have heard the mermaids singing, each to each.

I do not think that they will sing to me.

I have seen them riding seaward on the waves
Combing the white hair of the waves blown back
When the wind blows the water white and black.

We have lingered in the chambers of the sea
By sea-girls wreathed with seaweed red and brown
Till human voices wake us, and we drown.






Herberto Helder: Sobre um Poema

Um poema cresce inseguramente
na confusão da carne,
sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.

Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
- a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.

E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes,
a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.

- Em baixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
- E o poema faz-se contra o tempo e a carne.



''O objetivo dos Governos é sempre o mesmo: limitar o indivíduo, domesticá-lo, subordiná-lo, subjugá-lo.'' - Max Stirner

Offline Mister B

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #204 Online: 20 de Julho de 2011, 12:08:45 »
Uma de meu poeta favorito, Walt Whitman (como se isso não ficasse claro no meu perfil):

CANÇÃO DE MIM MESMO

EU CELEBRO a mim mesmo,
E o que eu assumo você vai assumir,
Pois cada átomo que pertence a mim pertence a
                                    [ você.

Vadio e convido minha alma,
Me deito e vadio à vontade .... observando uma
                            [ lâmina de grama do verão.

Casas e quartos se enchem de perfumes .... as
        [ estantes estão entulhadas de perfumes,
Respiro o aroma eu mesmo, e gosto e o
        [ reconheço,
Sua destilação poderia me intoxicar também,
        [ mas não deixo.

A atmosfera não é nenhum perfume .... não tem
        [ gosto de destilação .... é inodoro,
É pra minha boca apenas e pra sempre .... estou
        [ apaixonado por ela,
Vou até a margem junto à mata sem disfarces e
        [ pelado,
Louco pra que ela faça contato comigo.

A fumaça de minha própria respiração,
Ecos, ondulações, zunzuns e sussurros .... raiz
[ de amaranto, fio de seda, forquilha e videira,
Minha respiração minha inspiração .... a batida
    [ do meu coração .... passagem de sangue e
    [ ar por meus pulmões,
O aroma das folhas verdes e das folhas secas,
    [ da praia e das rochas marinhas de cores
    [ escuras, e do feno na tulha,
O som das palavras bafejadas por minha voz ....
    [ palavras disparadas nos redemoinhos do
    [ vento,
Uns beijos de leve .... alguns agarros .... o
    [ afago dos braços,
Jogo de luz e sombra nas árvores enquanto
    [ oscilam seus galhos sutis,
Delícia de estar só ou no agito das ruas, ou pelos
    [ campos e encostas de colina,
Sensação de bem-estar .... apito do meio-dia
    [ .... a canção de mim mesmo se erguendo
    [ da cama e cruzando com o sol.
"O cristianismo nos afirma que há um homem invisível, que vive no céu e vigia tudo o que fazemos, o tempo todo. O homem invisível tem uma lista de 10 coisas que ele não quer que a gente faça. Se você fizer qualquer uma dessas coisas, o homem invisível tem um lugar especial, cheio de fogo, fumaça, sofrimento, tortura e angústia onde ele vai lhe mandar viver, queimando, sofrendo, sufocando, gritando e chorando para todo o sempre. Mas ele ama você!
George Carlin

Offline Sergiomgbr

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #205 Online: 28 de Julho de 2011, 20:29:06 »
Um gesto e voce

Um gesto e eu sou voce,
se uno as palmas das mãos,
compartilho sua fé
não interessa no que
que sejam apegos vãos
que nos façam ir de ré
fiquemos nós a merce
por hora sem os senãos
agora a razão é ré
ignore-se o porquê
portanto oremos, irmãos

Deuses bizonhos,
mirabolantes,
deuses bezerros
deuses bizarros
bodes, vacas, elefantes
deuses bisonhos dançarinos
de pedra, de barro,  de pau oco

Deuses ancestrais bebedores de sangue, pagãos
não queiramos, nunca mais, ainda que disfarçados
ja temos uns mais atuais
deuses modernos bem remunerados
porem são os mesmos ais
são bem pagos, os tais.
O que somos então? Somos uns pagãos, uns bons pagãos...
que pagamos bem!
Oremos irmãos...Amém!


« Última modificação: 28 de Julho de 2011, 22:59:32 por sergiomgbr »
Até onde eu sei eu não sei.

Offline Emily

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #206 Online: 30 de Agosto de 2011, 15:43:47 »
Salve Whitman

Offline TMAG

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #207 Online: 11 de Setembro de 2011, 21:54:39 »
Excelentes poemas de Rimbaud:

ADORMECIDO NO VALE

                           
É um vão de verdura onde um riacho canta
A espalhar pelas ervas farrapos de prata
Como se delirasse, e o sol da montanha
Num espumar de raios seu clarão desata.

Jovem soldado, boca aberta, a testa nua,
Banhando a nuca em frescas águas azuis,
Dorme estendido e ali sobre a relva flutua,
Frágil, no leito verde onde chove luz.

Com os pés entre os lírios, sorri mansamente
Como sorri no sono um menino doente.
Embala-o, natureza, aquece-o, ele tem frio.

E já não sente o odor das flores, o macio
Da relva. Adormecido, a mão sobre o peito,
Tem dois furos vermelhos do lado direito.


LE DORMEUR DU VAL

C'est un trou de verdure où chante une rivière,
Accrochant follement aux herbes des haillons
D'argent; où le soleil, de la montagne fière,
Luit: c'est un petit val qui mousse de rayons.

Un soldat jeune, bouche ouverte, tête nue,
Et la nuque baignant dans le frais cresson bleu,
Dort; il est étendu dans l'herbe, sous la nue,
Pâle dans son lit vert où la lumière pleut.

Les pieds dans les glaïeuls, il dort. Souriant comme
Sourirait un enfant malade, il fait un somme:
Nature, berce-le chaudement: il a froid.

Les parfums ne font pas frissonner sa narine;
Il dort dans le soleil, la main sur sa poitrine,
Tranquille. Il a deux trous rouges au côté droit.



PRIMEIRA TARDE


Era bem leve a roupa dela
E um grande ramo muito esperto
Lançava as folhas na janela
Maldosamente, perto, perto.

Quase desnuda, na cadeira,
Cruzavas as mãos, e os pequeninos
Pés esfregava na madeira
Do chão, libertos finos, finos.

— Eu via pálido, indeciso,
Um raiozinho em seu gazeio
Borboletear em seu sorriso
— Mosca na rosa — e no seu seio.

— Beijei-lhe então os tornozelos.
Deu ela um riso inatural
Que se esfolhou em ritornelos,
Um belo riso de cristal.

Depressa, os pés na camisola
Logo escondeu: "Queres parar!"
Primeira audácia que se implora
E o riso finge castigar!

Sinto-lhe os olhos palpitantes
Sob os meus lábios. Sem demora,
Num de seus gestos petulantes,
Volta a cabeça: "Ora, esta agora!..."

"Escuta aqui que vou dizer-te..."
Mas eu lhe aplico junto ao seio
Um beijo enorme, que a diverte
Fazendo-a rir agora em cheio...

— Era bem leve a roupa dela
E um grande ramo muito esperto
Lançava as folhas na janela
Maldosamente, perto, perto.



PREMIÈRE SOIRÉE

Elle était fort déshabillée
Et de grands arbres indiscrets
Aux vitres jetaient leur feuillée
Malinement, tout près, tout près.

Assise sur ma grande chaise,
Mi-nue, elle joignait les mains.
Sur le plancher frissonnaient d'aise
Ses petits pieds si fins, si fins.

— Je regardai, couleur de cire,
Un petit rayon buissonnier
Papillonner dans son sourire
Et sur son sein, — mouche ou rosier.

— Je baisai ses fines chevilles.
Elle eut un doux rire brutal
Qui s'égrenait en claires trilles,
Un joli rire de cristal.

Les petits pieds sous la chemise
Se sauvèrent : "Veux-tu en finir!"
— La première audace permise,
Le rire feignait de punir!

— Pauvrets palpitants sous ma lèvre,
Je baisai doucement ses yeux:
— Elle jeta sa tête mièvre
En arrière: "Oh! c'est encor mieux!...

Monsieur, j'ai deux mots à te dire..."
— Je lui jetai le reste au sein
Dans un baiser, qui la fit rire
D'un bon rire qui voulait bien...

— Elle était fort déshabillée
Et de grands arbres indiscrets
Aux vitres jetaient leur feuillée
Malinement, tout près, tout près




''O objetivo dos Governos é sempre o mesmo: limitar o indivíduo, domesticá-lo, subordiná-lo, subjugá-lo.'' - Max Stirner

Offline Rocky Joe

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #208 Online: 12 de Setembro de 2011, 11:37:09 »
Salve Eliot, também. Segue meu poema predileto dele, o primeiro do Quatro Quartetos: (traduzido pela Maria Amélia Neto)

Burnt Norton

                         I

O tempo presente e o tempo passado
Estão ambos talvez presentes no tempo futuro,
E o tempo futuro contido no tempo passado.
Se todo o tempo é eternamente presente
Todo o tempo é irredimível.
O que podia ter sido é uma abstracção
Permanecendo possibilidade perpétua
Apenas num mundo de especulação.
O que podia ter sido e o que foi
Tendem para um só fim, que é sempre presente.
Ecoam passos na memória
Ao longo do corredor que não seguimos
Em direcção à porta que nunca abrimos
Para o roseiral. As minhas palavres ecoam
Assim, no teu espirito.
                                Mas para quê
Perturbar a poeira numa taça de folhas de rosa
Não sei.
                         Outros ecos
Habitam o jardim. Vamos segui-los?
Depressa, disse a ave, procura-os, procura-os,
Na volta do caminho. Através do primeiro portão,
No nosso primeiro mundo, seguiremos
O chamariz do tordo? No nosso primeiro mundo.
Ali estavam eles, dignos, invisiveis,
Movendo-se sem pressão, sobre as folhas mortas,
No calor do outono, através do ar vibrante,
E a ave chamou, em resposta à
Música não ouvida dissimulada nos arbustos,
E o olhar oculto cruzou o espaço, pois as rosas
Tinham o ar de flores que são olhadas.
Ali estavam como nossos convidados, recebidos e recebendo.
Assim nos movemos com eles, em cerimonioso cortejo,
Ao longo da alameda deserta, no círculo de buxo,
Para espreitar o lago vazio.
Lago seco, cimento seco, contornos castanhos,
E o lago encheu-se com água feita de luz do sol,
E os lótus elevaram-se, devagar, devagar,
A superfície cintilava no coração da luz,
E eles estavam atrás de nós, reflectidos no lago.
Depois uma nuvem passou, e o lago ficou vazio.
Vai, disse a ave, pois as folhas estavam cheias de crianças,
Escondendo-se excitadamente.. contendo o riso.
Vai, vai, vai, disse a ave: o género humano
Não pode suportar muita realidade.
O tempo passado e o tempo futuro
O que podia ter sido e o que foi
Tendem para um só fim, que é sempre presente.

                    II

Alhos e safiras na lama
Coagulam o eixo fixo.
O arame que vibra no sangue
Canta sob inventeradas cicatrizes
Apaziguando guerras há muito esquecidas.
A dança ao longo da artéria
A circulação da linfa
Estão representadas no rumo dos astros
Elevam-se ao verão na árvore
Nós movemo-nos acima da árvore em movimento
Na luz sobre a folha imaginada
E ouvimos no solo molhado
Lá em baixo, o cão de caça e o javali
Prosseguirem o seu ciclo como antes
Mas reconciliados no meio dos astros.



No ponto morto do mundo em rotação. Nem came nem
        espírito;
Nem de nem para; no ponto morto, aí está a dança,
Mas nem paragem nem movimento. E não se chame a isso
        fixidez,
Onde o passado e o futuro se reúnem. Nem movimento de
         nem para,
Nem ascensâo nem declínio. Se não fosse o ponto, o ponto
         morto,
Não haveria dança, e há só a dança.
Eu apenas posso dizer, estivemos ali: mas não posso dizer onde.
E não posso dizer por quanto tempo, pois seria situar isso no tempo.
A liberdade interior do desejo prático,
A libertação de acção e sofrimento, libertação da compulsão
Interior e exterior, e no entanto tendo à volta
Uma graça de sentido, uma luz branca em repouso e em movimento,
Erhebung sem movimento, concentração
Sem eliminação, ao mesmo tempo um novo mundo
E o velho tomado explícito, compreendida
No remate do seu êxtase parcial
A resolução do seu horror parcial.
Todavia o encadeamento de passado e futuro
Tecido na fraqueza do corpo em mutação
Protege a humanidade do céu e da danação
Que a carne não pode suportar.
                                     O tempo passado e o tempo futuro
Apenas concedem um pouco de consciência.
Estar consciente é não estar no tempo
Mas apenas no tempo podem o momento no roseiral,
O momento no caramanchel onde a chuva batia,
O momento na igreja desabrigada ao entardecer
Ser lembrados; envolvidos em passado e futuro.
Apenas pelo tempo o tempo é conquistado.

                    III

Este é um lugar de desafeição
O tempo antes e o tempo depois
Numa luz sombria: nem luz do dia
Investindo a forma de lúcida quietude
Transformando a sombra em efémera beleza
Com vagarosa rotação sugerindo permanência
Nem escuridão para purificar a alma
Esvaziando o sensual pela privação
Purificando a afeição do temporal.
Nem plenitude nem vazio. Apenas um tremeluzir
Sobre os rostos tensos devastados pelo tempo
Distraídos da distracção pela dístracção
Cheios de fantasias e vazios de sentido
Túmida apatia sem concentração
Homens e pedaços de papel remolnhando no vento frio
Que sopra antes e depois do tempo,
Vento que entra e sai de pulmões viciados
Tempo antes e tempo depois.
Eructação de almas doentias
No ar desbotado, os miasmas
Levados no vento que varre os sombrios montes de Londres,
Hampstead e Clerkenwell, Campden e Putney,
Hihgate, Primrose e Ludgate. Não aqui
Não aqui a escuridão, neste mundo de agitadas vozes.

Desce mais, desce apenas
Ao mundo da solidão perpétua,
Mundo não mundo, mas aquilo que não é mundo,
Escuridão interna, privação
E destituição de toda a propriedade,
Dissecação do mundo do sentido,
Evacuação do mundo da fantasia,
Inoperância do mundo do espírito;
Estee é um dos caminhos, e o outro
É o mesmo, não em movimento
Mas abstenção de movimento; enquanto o mundo se move
Em apetência, nos seus caminhos metalizados
Do tempo passado e do tempo futuro.

                      IV

O tempo e o sino enterraram o dia,
A nuvem negra arrebata o sol.
Irá voltar-se para nós o girassol, a clematite
Desprender-se, debruçar-se; irão a gavinha e a vergôntea
Unir-se e aderir?
Os frígidos
Dedos do teixo descerão
Para nos envolver? Depois da asa do alcião
Ter respondido à luz com a luz e calar-se, a luz está em repouso
No ponto morto do mundo em rotação.

                       V

As palavras movem-se, a música move-se
Apenas no tempo; mas o que apenas vive
Apenas pode morrer. As palavras, depois de ditas,
Alcançam o silêncio. Apenas pela forma, pelo molde,
Podem as palavras ou a música alcançar
O repouso, tal como uma jarra chinesa ainda
Se move perpetuamente no seu repouso.
Não o repouso do violino, enquanto a nota dura,
Não isso apenas, mas a coexistência,
Ou digamos que o fim precede o princípio,
E que o fim e o princípio estiveram sempre ali
Antes do princípio e depois do fim.
E tudo é sempre agora. As palavras deformam-se,
Estalam e quebram-se por vezes, sob o fardo,
Sob a tensão, escorregam, deslizam, perecem,
Definham com imprecisão, não se mantêm,
Não ficam em repouso. Vozes estridentes
Ralhando, troçando, ou apenas tagarelando,
Assaltam-nas sempre. O Verbo no deserto
É muito atacado por vozes de tentação,
A sombra que chora na dança funérea,
O clamoroso lamento da quimera desconsolada.

O detalhe do molde é movimento,
Como na figura dos dez degraus.
O próprio desejo é movimento
Não desejável em si;
O próprio amor é inamovível,
Apenas a causa e o fim do movimento,
Intemporal, e sem desejo
Excepto no aspecto do tempo
Capturado sob a fonna de limitação
Entre o não ser e o ser.
De repente num raio de sol
Mesmo enquanto se move a poeira
Eleva-se o riso escondido
De crianças na folhagem
Depressa, aqui, agora, sempre-
Ridículo o triste tempo inútil
Que se estende antes e depois.

Offline Luas

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #209 Online: 12 de Setembro de 2011, 17:33:38 »
Adoro poesia,
 *-*
  Mas não faço :L sou péssima nisso.
 Mas todas as poesias estão de parabéns.
Lua ;*

Offline Luiz F.

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #210 Online: 12 de Setembro de 2011, 18:33:41 »
Seja bem vinda Luas!

Se não for incomodo passe no tópico de apresentações e se apresente pra gente :ok:
"Você realmente não entende algo se não consegue explicá-lo para sua avó."
Albert Einstein

Offline Luas

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #211 Online: 12 de Setembro de 2011, 19:14:44 »
Seja bem vinda Luas!

Se não for incomodo passe no tópico de apresentações e se apresente pra gente :ok:

 A muito obrigado,
 Passo sim.
Lua ;*

Offline Sergiomgbr

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #212 Online: 17 de Setembro de 2011, 13:09:21 »
Volver a los diecisiete

(Violeta Parra)

Volver a los diecisiete
después de vivir un siglo
es como descifrar signos
sin ser sabio competente.
Volver a ser de repente
tan frágil como un segundo,
volver a sentir profundo
como un niño frente a Dios,
eso es lo que siento yo
en este instante fecundo.

Se va enredando, enredando,
como en el muro la hiedra,
y va brotando, brotando,
como el musguito en la piedra,
ay, sí sí sí.

Mi paso retrocedido,
cuando el de ustedes avanza;
el arco de las alianzas
ha penetrado en mi nido
con todo su colorido,
se ha paseado por mis venas
y hasta las duras cadenas
con que nos ata el destino
es como un diamante fino
que alumbra mi alma serena.

Lo que puede el sentimiento
no lo ha podido el saber,
ni el más claro proceder
ni el más ancho pensamiento.
Todo lo cambia el momento
cual mago condescendiente,
nos aleja dulcemente
de rencores y violencia:
solo el amor con su ciencia
nos vuelve tan inocentes.

El amor es torbellino
de pureza original;
hasta el feroz animal
susurra su dulce trino,
detiene a los peregrinos,
libera a los prisioneros;
el amor con sus esmeros
al viejo lo vuelve niño
y al malo solo el cariño
lo vuelve puro y sincero.

De par en par la ventana
se abrió como por encanto,
entró el amor con su manto
como una tibia mañana;
al son de su bella diana
hizo brotar el jazmín,
volando cual serafín,
al cielo le puso aretes
y mis años en diecisiete
los convirtió el querubín.

Até onde eu sei eu não sei.

Offline Mr."A"

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #213 Online: 17 de Setembro de 2011, 16:30:10 »
Eu ouvia isso com Milton Nascimento quando criança; dava barato, porque eu viajava na letra. Parece que ela é bem popular na América Latina.
8-)

Offline Adriano

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #214 Online: 20 de Setembro de 2011, 10:49:51 »
Sou Brasileiro e Não Desisto Nunca! (I'm brazilian and I never give up!)

"Em cada um de nós há um segredo, uma paisagem interior com planícies invioláveis, vales de silêncio e paraísos secretos. "
(Saint-Exupéry)


Eu Sou Como o Verso (Poesia Gaúcha)
- João Luis Pereira Ourique

Eu sou como o verso
que viaja ao sabor do vento,
levando um pouco de alento
para aquele que o escutar
e, neste eterno caminhar,
só, não consola a si mesmo,
pois falta-lhe voz para cantar
ou, talvez, não tenha alguém,
ninguém para quem possa voltar.

Eu sou como o verso
esta tão doce magia,
plena de galhardia
que traz dores de amores
cantadas pelos payadores
que se perdem na imaginação,
onde se encontram imersos,
numa querência de sentimentos,
os mais ricos pensamentos
que conquistam o universo.

Eu sou como o verso
que sonha com um mundo melhor,
que acredita no suor
do trabalho, ao fim do dia,
que canta tristeza e alegria
na ilusão de cada um,
na esperança que sorria
promessa de vida nova,
sem saber que a nova vida
na fome já se perdia.

Eu sou como o verso
somos iguais na essência,
na origem e na tenência,
pois trazemos, neste cantar,
um desejo de encontrar
nosso próprio sentimento
para, então, poder salvar
o sonho da liberdade,
nossa própria felicidade
que almejamos conquistar.
Princípio da descrença.        Nem o idealismo de Goswami e nem o relativismo de Vieira. Realismo monista.

Offline Emily

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #215 Online: 28 de Setembro de 2011, 18:59:16 »
Citar
Salve Eliot, também. 


Salve.
Quem diria, os Quartetos em um forum cético.
Com certeza é um dos pontos mais alto da literatura do século vinte.
E olha, apesar de Eliot negar, é descendência direta de Whitman

Offline Sergiomgbr

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #216 Online: 28 de Setembro de 2011, 19:14:53 »
Muito boa! Acho que ela é bem musicável.
Dr., me ocorreu que queira musicá-la. Se quiser, que fique registrado aqui, que eu concordo, e que apreciaria conferir o resultado!
Até onde eu sei eu não sei.

Offline Emily

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #217 Online: 29 de Setembro de 2011, 18:16:48 »
Poema Quântico - (Passagem)

(...)

II


Como poderei adiantar-me ao meu tempo?
Deverei cogitar o que olha os olhos
Da coruja de Minerva, no crepúsculo?
E se assim o fizer, como um xamã
Que irei ser
E desregrado os sentidos, cego, como tem que ser
Terei forças para rolar a pedra
Após anunciar o terceiro dia?
(Vê? Não há mistérios)

Ou serei um conjurador
A oferecer espectros à brisa da manhã?
Diz: não há florescido a amendoeira. Está unida a carne
Do presente, não pode ser deslocada, não está descoberta
A face do presente. Tudo ferve nas profundas, não se ataca
O tempo com espadas

É tempo de nascer para novas alianças! Que abram-se todas as portas dos rostos!
Serei por mim e conjugarei o verbo?
Poderei perturbar o universo neste exato instante?
Será este o meu muito trabalho pelos dias
Olhar sobre os olhos dos adormecidos
Invocar os deuses, como quem invoca os deuses
Por estes pensamentos tortuosos virá à luz aquele que me gerou
Então serei isto, por mim e pelos deuses e agora

III

Em Eleutera estive exilado e foi me dado ver
O que resplandece, pois conheci
Suas nove filhas
Elas me ensinaram mais profundamente
Enquanto, ocultos pela nevoa, nos conhecíamos
E se mentiras me contaram, como queriam
Não escondiam de revelar um suspiro ou arfado
Conhecendo, assim, a verdade pelo desejo consumado
Em nove ventre, nove filhos gerados, mais fortes, mais ágeis
Que o pai. Então será todo o esquecimento lembrado
E não os nove devorados

(...)
« Última modificação: 29 de Setembro de 2011, 18:25:04 por Emily »

Offline Rocky Joe

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #218 Online: 29 de Setembro de 2011, 19:41:39 »
Citar
Salve Eliot, também. 


Salve.
Quem diria, os Quartetos em um forum cético.
Com certeza é um dos pontos mais alto da literatura do século vinte.
E olha, apesar de Eliot negar, é descendência direta de Whitman

Pois é, por algum motivo apesar de ateu/cético gosto bastante dessas obras profundamente religiosas. Em outras coisas também, como em cinema os filmes do Tarkovsky; em música o album All Things Must Pass do George Harrisson e por aí vai. Vai entender.

Esse último poema é de autoria sua, Emily? Se sim, parabéns. Se não, valeu por postar!

No mais, trecho de East Coker, T.S. Eliot, trad. de Ivan Junqueira:


    Este era um meio de expor as coisas, mas não muito satisfatório:
Um estudo perifrástico sob forma poética exaurida,
Que mesmo assim nos deixa em luta insuportável
Com palavras e significados. A poesia não importa.
Não era (para recomeçar) o que antecipadamente se aguardava.
Que valor pode ter a calma tão longamente esperada,
Com tanto ardor desejada, a serenidade outonal
E a sabedoria da velhice? Teriam eles nos logrado
Ou lograram-se a si próprios, os mais velhos de fala comedida,
Que nos legaram apenas o recibo de uma fraude?
A serenidade não passa de um embrutecimento voluntário,
A sabedoria encerra apenas o conhecimento de segredos mortos
Inúteis na escuridão a que assomaram
Ou daquela de que seus olhos se esquivaram. Há, nos parece,
Em suma, apenas um limitado valor
No conhecimento que deriva da experiência.
O conhecimento impõe um modelo, e falsifica,
Porque o modelo é vário para cada instante,
E cada instante uma nova e penosa
Avaliação de tudo quanto fomos. Apenas não nos decepcionaremos
Com tudo o que, decepcionando, já não causa mais dano.
Na metade, não apenas na metade do caminho
Mas ao longo de todo o caminho, numa floresta escura, num carrascal,
À beira de um abismo, onde o pé jamais logra equilíbrio,
E ameaçados por monstros, luzes fantasmagóricas,
Na perigosa fímbria do encantamento. Que não me falem
Da sabedoria dos velhos, mas antes de seu delírio,
De seu medo do medo do frenesi, do medo de serem possuídos,
De pertencerem a outro, a outros, ou a Deus.
A única sabedoria a que podemos aspirar:
É a sabedoria da humildade: a humildade é infinita.

Todas as coisas submergiram no mar.

Todos os bailarinos submergiram na colina.

Offline Emily

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Re: Quem gosta de poesia?
« Resposta #219 Online: 30 de Setembro de 2011, 01:22:14 »
Sim, é meu
mas está fragmentado

Offline TMAG

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Re:Quem gosta de poesia?
« Resposta #220 Online: 06 de Outubro de 2011, 00:59:40 »
Parabéns pelo poema Emily, também gostei bastante.
''O objetivo dos Governos é sempre o mesmo: limitar o indivíduo, domesticá-lo, subordiná-lo, subjugá-lo.'' - Max Stirner

Offline ReVo

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Re:Quem gosta de poesia?
« Resposta #221 Online: 07 de Outubro de 2011, 18:18:14 »
Um que funciona como uma espécie de mantra para mim.

Self Pity
            (D. H. Lawrence)


I never saw a wild thing
sorry for itself.
A small bird will drop frozen dead from a bough
without ever having felt sorry for itself."

Possível tradução:

Auto-piedade           
Nunca vi uma coisa selvagem
ter pena de si mesmo.
Um pássaro pequeno cairá congelado morto de um galho
sem nunca ter sentido pena de si mesmo".



"Most men love money and security more, and creation and construction less, as they get older." John Maynard Keynes

"Plus ça change, plus c´est la même chose." Giuseppe Tomasi di Lampedusa

Offline Madame Bovary

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Re:Quem gosta de poesia?
« Resposta #222 Online: 13 de Outubro de 2011, 00:42:08 »
Eu não me canso de ler e reler e reler denovo e reler outra vez e uma vez mais...

Tabacaria
Álvaro de Campos

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.

Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;

Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.

(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.

(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)

Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente

Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
Essência musical dos meus versos inúteis,

Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.

Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,

Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.

Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.

Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.

Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.

(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.
.
Olho, e as coisas existem.
Penso e existo só eu.

.

Skoob

Filmow

Offline Sergiomgbr

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Re:Quem gosta de poesia?
« Resposta #223 Online: 13 de Outubro de 2011, 01:14:56 »
     Medidas do mundo

Dizem que o mundo nasceu
de uma primeva explosão
que depois houve uma expansão
de onde tudo  sucedeu

Assim dizem os estudiosos mais proeminentes
após várias evidências e numerosas medições
Mas o universo ele mesmo não tem condições
Parece se maior ainda que "razões suficientes"

Não há quem possa achar o fio da meada
duma ponta onde está o tudo até na outra no nada
pondo tudo numa só dimensão!

Decerto a verdade nua e crua
só pode ser universo sendo minha e sua
Que o mundo não é tempo nem lugar e sim ocasião!

« Última modificação: 13 de Outubro de 2011, 15:35:03 por sergiomgbr »
Até onde eu sei eu não sei.

Offline Güstaff

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Re:Quem gosta de poesia?
« Resposta #224 Online: 13 de Outubro de 2011, 14:13:28 »
Não costumo ler poesias, mas adoro escrever, apesar de não ter conhecimento de técnicas e gêneros e usar uma linguagem mais boba e simplista.

Invisível

Ela perambula por entre as pessoas na estação
Desesperadamente procurando por bondade nos olhos de cada um
Mas estão todos ocupados demais com suas necessidades e futilidades diárias
Para notarem sua presença

Se limitam a ignorar
Quando ela estende a mão com súplica no olhar
E dizem não como se fossem um gatilho automático

Suas pequeninas mãos sujas e sofridas
Seguem estendidas e vazias
Para tentar a sorte em outro lugar

Completamente invisível
Nem os homens, nem os deuses notam sua presença

 

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