O que os crentes — É! Crentes! — não fazem para tentar se misturar com os céticos, não é mesmo? Não entendem bulhufas de ceticismo e ficam tentando misturar água e óleo.
Alenônimo, numa boa, me corrija se eu estiver errada. Teísmo e ateísmo são implicações de um único assunto muito específico - a existência / inexistência de divindades. O ceticismo não! Em sua postura "pessoal" o cético pode ser teísta ou ateísta, pois uma coisa não impede a outra, desde que suas ideologias não contaminem a verificação, partindo do princípio da "imparcialidade". Penso que o ceticismo não é uma ideologia, mas um processo e que não pode estar submetido as crenças e dúvidas pessoais do cético, mas ao contrário, submetendo-as todas, inclusive teísmo e a teísmo, ao mesmo processo de questionamento e verificação e com a mesma imparcialidade. O crente, isso é, o religioso ou não conhece o ceticismo ou não se sente comprometido com ele. Teísta e crente ou religioso não são coisas diferentes?
Para o consentimento de vocês, saibam que a postura cética é a de descartar qualquer alegação que seja impossível e ignorar as que não sejam demonstradas. Ah! Navalha de Ockham também é muito importante! Para um cético, é importante ter evidências que qualquer alegação que se quer provar.
Pois é e nesse ponto as teorias "científicas" sobre o universo esbarram no mesmo problema que deus. Existem três: a primeira e menos aceita sugere um universo estacionário, a segunda um universo oscilante e a terceira um universo em expansão. O problema é que todas elas partem do princípio de que "tudo" veio do "nada". E se por nada entendemos ausência total de matéria, isso significa que toda a matéria existênte surgiu como num passe de mágica, mas como não verificamos matéria surgindo do nada por aí e sabemos que isso não é possível, a alegação não pode ser "demonstrada". Elas não são nem mais simples e nem mais "prováveis". Se explicam a "formação" do universo como hoje o conhecemos, deixa uma grande lacuna em seu surgimento. É onde pode ou não entrar o deus da lacuna, pois não temos uma resposta "demonstrável" para a pergunta. E a Navalha de Ockham também deve ser imparcial. O ceticismo científico não existe apenas para questionar religiões, mitos e peseudociências, mas inclusive e principalmente a própria ciência. Por isso mesmo é que existem três trorias científicas sobre o universo e não apenas uma.
Então voltemos à questão de Deus:
Por que que tudo o que ocorre no universo pode ser explicado sem a presença de um Deus? Mesmo quando não temos uma resposta, é possível criar teorias bem plausíveis, que não necessitam de seres infinitamente complexos.
Porque aceitamos o "nada" (a audência de matéria como criadora da matéria) mesmo sem uma comprovação dessa alegação, simplesmente porque carrega a credencial de "científica". Acontece que só nós fazemos isso, cientistas sérios não! Talvez por isso Sagan tenha questionado o assunto.
E se as teorias científicas sobre o universo são plausíveis, eu concordo que realmente são, elas exigem da mesma forma que esse "nada" seja infinitamente complexo.
Isso é o suficiente para qualquer cético não acreditar na existência de Deus. Mas tem mais:
Por que que todas as vezes que se tenta explicar Deus, as pessoas acabam entrando em contradição com a lógica e com suas próprias qualidades? Já discutimos muito aqui a “Pedra Pesada”, a “Bondade e o Inferno” entre muitas outras coisas e o que vemos é um Deus onisciente, que muda de idéia, que é bonzinho e sádico ao mesmo tempo e que pode ou não fazer qualquer coisa. Uma salada de idéias auto-contraditórias!
É preciso haver "provas" de que realmente "tudo" veio do "nada" como sugerem as teorias científicas para que então o cético possa definitivamente descartar a possibilidade de deus. E tem mais: as explicações sobre deus só caem em contradição se considerarmos uma "versão religiosamente construída de deus". Caso deus exista, nada comprova que ele seja onipotente, onisciente etc, como sugerem as religiões. E se desconsideramos diversos pontos comprovadamente falsos dentro das religiões, por que deveríamos considerar o que foi dito a respeito de deus, suas habilidades, forma etc.? As supostas verdades das religiões não provam a existência de deus, da mesma forma que os comprovados equívocos não provam sua inexistência. As religiões teístas não inventaram a idéia de deus, foram fundadas em cima dela. E uma coisa não tem relação direta com a outra. Deus não carece de qualquer religião ou das "verdades" dessas para existir, é uma idéia independente.
Isso é o suficiente para que qualquer pessoa com o mínimo de bom senso acredite que Deus não exista.
Como se não bastasse, temos sempre pessoas que insinuam que a ciência é cega e limitada, que os céticos não enxegam a verdade, que é uma questão de fé e coisas do gênero e, ao mesmo tempo tentam dar uma base científica á própria idéia de Deus, tentando mostrar que não depende de fé e está de acordo com a realidade, usando de artifícios como falácias[/i] e se auto-contradizendo novamente.
O bom senso não é um meio eficaz nesse caso. Acreditar em "deus" ou em "nada" é questão de escolha. Cada um tem sua própria lógica, mas ambas as idéias são apenas sugestões, sem nenhuma prova concreta para ser aceita pelo bom senso.
Se querem que acreditamos em coisas como vida após a morte, ser supremo inteligente ou outra ladaínha do tipo, mostrem evidências de que essas coisas sejam bem plausíveis. Fica chato ter sempre que ouvir as mesmas coisas de sempre.
Ninguém está tentando "pregar" nada, apenas querendo mostrar porque "aceita" a possibilidade da existência de deus. Não há nada de concreto que sustente o surgimento do universo ou da vida. As teorias científicas explicam o processo de formação e desse sim, possuem evidências, mas do surgimento, tudo que existem são apenas hipóteses e não menos absurdas. E mais uma vez eu volto a repetir que "vida após a morte", "supremo inteligente" ou qualquer ladainda desse tipo são alegações religiosas e não é isso o que deveria estar sendo descutido aqui.
Eu sei que o trecho é polêmico, mas confesso que acreditei que a conversa não fosse mais uma vez tomar esse rumo. Infelizmente, parece que todo mundo está mais preocupado em convencer os outros do que acredita do que de realmente debater as idéias apresentadas. Se a minha explicação não pareceu suficientemente clara, aconselho novamente a ler o livro, ou pelo menos, o capítulo sugerido. É muito interessante. Dentro do contexto qualquer um poderá entender melhor porque Sagan se expressou dessa maneira sobre o ateísmo. A crítica não foi assim tão dura como pode parecer dentro do pequeno trecho que selecionei. E o selecionei justamente para despertar a curiosidade de quem o lesse.