Não, não é exatamente isso, eu não desacredito na possibilidade da existência de "algo" inexplicado, nem acho que esteja tudo perfeitamente explicado; só acredito que, por tudo que se sabe da origem de pessoas e mentes, é muito pouco provável, desprezível, que exista "algo", que seja "tipo um cara", que tenha algo (ou seja algo) que funcione como uma mente, e que seja superpoderoso (o que acredito ser a definição mínima para deuses). Especialmente poderoso a ponto de criar o universo ou grandes partes dele, de ter existido "desde sempre", sem qualquer origem (diferentemente das demais mentes conhecidas, não meramente hipotéticas), "no meio da eternidade" tendo tido a vontade de criar uma fazenda de formigas, ou algo maior, e criado formigas como subproduto acidental.
Só “acredito” que por tudo que não se sabe da origem das pessoas e da mente nada me parece assim tão desprezível.
Eu acho que o que não se sabe sobre a o funcionamento da mente é similar ao que engenheiros eletrônicos do início do século passado desconheceriam dos processadores mais avançados que se tem hoje, ou talvez em um grau ainda mais elevado. Sobre origem das pessoas e mentes, me parece que também já se sabe o suficiente, modificação na descendência dos seres. Simplesmente não vejo espaço aí para hipotetizar seriamente que de alguma forma possa ter sempre existido ou vindo a se desenvolver no universo uma mente com superpoderes.
E esse é justamente o problema, para entendermos uma “idéia” precisamos dar forma a ela, geralmente, à nossa imagem e semelhança. A necessidade exige que deus, para existir, tenha necessariamente, que ter, no mínimo, as definições que “acreditamos”, só porque acreditamos nisso.
Uma definição associada a um rótulo é extremamente útil para esse tipo de discussão. Não vejo sentido algum em se falar de "deus" num sentido literal (exemplo, diferentemente de "Eric Clapton é um deus da guitarra") se estivermos falando de algo que não tem uma mente nem é superpoderoso, da mesma forma que não tem sentido se usar o termo "lobisomem" para se referir à tartarugas.
Não é que se creia que deuses tenham que ter ter uma mente e superpoderes; é essa a definição de deuses. Se fala-se de uma "coisa" que tem "superpoderes", mas é desprovida de mente, não é um bem deus, é uma "força" ou sei lá o que. Se tem mente mas não tem superpoderes, pode ser um tipo de cérebro suficientemente avançado, ou talvez inteligência artificial, mas não deus. Se de alguma forma é algo responsável pela origem do universo tal como é, mas não é consciente ou não usou "superpoderes", também não é deus.
Segundo sua própria definição, para criar o universo ou grandes partes dele, ter existido “desde sempre”, sem qualquer origem (diferente do conhecido e não meramente hipotético) o “nada absoluto” não teria que ser algo especialmente poderoso? Esse “nada absoluto” ao menos existe, no sentido literal da expressão?
Não sei, não sei se nada absoluto existiu ou se existe. Não sei se seria superpoderoso, isso dependeria do que se propusesse que esse nada pudesse fazer; a coisa mais lógica me parece que nada não fizesse coisa alguma, e logo não tivesse poder algum.
Então foi o “nada absoluto” que “no meio da eternidade” tendo tido a vontade de criar essa fazenda de formigas, criou acidentalmente as formigas de “Constantine”?
(Constantine?)
Bem, primeiramente não sei. Acho que o nada, por não ser coisa alguma, também não cria nada. Se - repetindo
se, o que eu não sei - antes de existir qualquer coisa, não existiu nada, não foi o nada que criou. Talvez o que temos como relações causais de passado determinando o futuro não valha para esse ponto inicial da história, onde talvez o futuro determinasse o passado, sendo o universo todo como um objeto, eventos sendo como sua estrutura, algo que simplesmente existe. Seria mais ou menos como se andássemos num carrinho desses de playcenter; eventualmente aprendêssemos que podemso prever o que veremos adiante com base em dados do que vemos agora, estabeleceriamos relações causais. Em teoria, o mesmo é verdade, se estivessemos voltando.
Realmente, essa é a grande diferença, o teísta desenvolve uma teoria. Quando o ateu questiona o que causou, se houve causa para o Big Bang, ou mesmo se realmente ocorreu, ou se foi um início “absoluto” da existência, o que teoriza? Ou não teoriza para não criar mais complexidade a ser explicada? E criar complexidade agora se tornou um problema?
Excluindo todas as possibilidades mencionadas, o que é se ater ao mais diretamente relacionado à questão?
Teoriza sim, mas parcimoniosamente. Existem hipóteses mais ou menos parcimoniosas. Se chama de parcimoniosa, por exemplo a hipótese do Lula ser presidente porque foi eleito pela maioria de votos de um povo que via nele a esperança de mudança e tals. Uma hipótese menos parcimoniosa seria que Fidel Castro, Chavez e diversas organizações comunistas sabotaram as eleições. Menos parcimoniosa ainda seria se envolvesse Elvis, que não morreu, como cabeça da conspiração. Mais ainda se Elvis era na verdade um ET "cinza". Mais ainda se tudo isso foi vontade de Deus.
A complexidade problemática é aquela da qual não se tem evidência nenhuma que existe pra começar. Se a janela está aberta, e os papéis da mesa voaram, é mais provável que tenha sido o vento do que duendes sapecas ou espíritos zombeteiros; duendes e espíritos são complexidades desnecessárias.
Há ainda os agravantes de hipóteses que além de desnecessariamente complexas, não podem ser testadas. Por exemplo, solipsismo.
O deísmo não surge tanto de indagação, mas como resquício de monoteísmo, apego. No monoteísmo, deus é a "causa primeira" para tudo, em vez de ser simplesmente uma explicação para o universo no estado presente. Pela lógica de se hipotetizar um deus como "explicação" para o inexplicado, hipotetizaria-se uma cadeia infinita de criações divinas, deuses criando deuses, infinitamente, até que um "último" deus cria o nosso universo. Na imensa maior parte do tempo essa "lógica" é quebrada sem mais nem menos, simplesmente porque não é tradicional ao monoteísmo sugerir tal coisa. Uma vez aceito ainda que hipoteticamente esse deus, pronto, acabou, não há mais a suposta ânsia de explicação que havia para o resto do universo aplicada para ele mesmo, por algum motivo, parece muito mais aceitável que algo sobre o qual a única coisa que se "sabe" é que é "tipo um cara" possa existir desde sempre, e "no meio da eternidade" criar o universo.
Afinal, o que surge da indagação não é um “nada absoluto”? E afinal esse nada não é uno e a causa primeira para tudo, mas não uma simples explicação para o universo presente?
Bem, acho que não; o "nada", a meu ver, não explicaria coisa alguma acerca do presente, seria apenas uma constatação quanto ao passado.
E por que será que esse “nada absoluto” tão moderno e ocidental, nascido num cenário monoteísta, nunca foi hipotetizado como uma cadeia infinita que levou a um nada capaz de gerar o universo? E por que a grande explosão é uma? E por que o universo é um? Será que todos os “uns” são influencia desse resquício monoteísta ou da indagação simples? Qualquer lógica “una” não pode ser quebrada da mesma forma?
Bem, na verdade existem várias hipóteses, além de um big-bang mais "clássico":
- de universo infinito em tempo e espaço (hoje grandemente desacreditada)
- de universo cíclico ou pulsante, ou seja, de certa forma é infinito, mas eventualmente se contrai em um "big crunch", que depois novamente se expande em big-bang, eternamente;
- existem hipóteses de múltiplos (infinitos e crescendo, se não me engano) universos incomunicáveis, acho que havendo teorias em que todos teriam surgido do seu próprio BB, quanto de um BB apenas, em que em cada fração quase infinitesimal de segundo, fuzilhões de universos diferentes, minima ou drásticamente, são criados. Existe ainda uma que ouvia outro dia de que universos teriam "universos filhos" dentro de buracos negros, acho que também infinitamente, mas algumas "linhagens" seriam mais prolíficas e outras se extinguiriam por causa de leis da física que colaborassem pouco para origem de buracos negros (não sei se isso se daria também para sempre, ou se haveria um primeiro em algum momento);
Eu pessoalmente acho que só existe um universo, não consigo conceber o que seria um "outro" universo, nem tenho motivos para crer que existam. Tenho obrigatoriamente que crer em ao menos um, pois estou nele. A mesma lógica não se aplicaria com deuses, de ser mais provável existir apenas um, porque, por tudo que sabemos, as coisas mais parecidas com deuses que existem, são espécies de animais com mentes, e não existem e nem poderiam a vir a existir como apenas um só, por geração espontânea, em vez disso vêm de um longo processo de evolução gradual que envolveu e resultou em diversos indivíduos.
Uma vez aceito, ainda que hipoteticamente, esse “nada absoluto” não estanca a ânsia de explicação para o universo e parece muito mais aceitável, mesmo que tudo que se saiba é que “não existe de fato”, aqui ou no espaço, já que comprovadamente nenhum vácuo é perfeito, totalmente desprovido de matéria ou energia?
Bem, quanto a mim, não.
Então, isso significa, que a única explicação “lógica” sem qualquer resquício de monoteísmo ou apego é que apesar de não podermos “detectar” um “nada absoluto” (transcendental e matafísico) em que muitos acreditam, tudo veio dele?
Não é a única explicação lógica; como disse antes, há outras hipóteses. Acho que as mais evidencialmente embasadas todas hoje concordam ao menos que em dado momento do passado distante, toda a matéria do universo estava condensada em um espaço muito menor, que se expandiu incrivelmente.
Hipótese por hipótese, algo análogo a um bule derramando chá, ou como uma construção de uma colméia por abelhas, ou uma aranha tecendo uma teia, como analogia para a origem do universo, são "tão boas" quanto algo superpoderoso com algo análogo ao cérebro humano. Mas esse tipo de coisa é simplesmente desconsiderada na vasta maioria do tempo, e até vista como chacota ou ridícula, quando não há diferença real, em se tratando do quanto é algo inexplicado, ou em "poder de explicação por definição". Há uma tendenciosidade, talvez da natureza humana, para hipóteses antropomórficas.
Qualquer analogia bem construída serve para explicar qualquer coisa, até dizer que deus é um nada absoluto, transcendental e metafísico, que existe desde sempre no meio da eternidade, mas não pode ser detectado aqui ou no espaço e por isso não existe, mas criou o universo. Se substituirmos a expressão “nada absoluto” por “deus” ou vice-versa, tudo vira a mesma coisa, algo inexistente e inexplicável, mas no qual, talvez por uma influência monoteísta, todos acreditem atualmente ser algo “uno” e “possível”, mas não, provável.
Apenas enfatizando o que acredito que seja condizente com a maioria das teorias atuais: o nada, se é que alguma vez "existiu", não deve ter criado coisa alguma, mesmo que tenha antecedido a existência de qualquer coisa. Acho que é isso. Não leio muito sobre o assunto, mas não me lembro de alguém sério (ou seja, sem serem criacionistas em fóruns de discussão ou sites criacionistas) dizer que "o Nada criou o mundo".
E por favor, entenda, como “possibilidade” eu acredito tanto em deus como em nada absoluto. Não estou defendendo uma causa, mas apenas tentando me ater a questão em questão, ou seja, as especulações feitas no trecho retirado de um livro de Carl Sagan sobre o ateísmo.
Tá ok.