Dr. Manhattan,
Percebo que a base do seu argumento parece ser a seguinte: "o livre-arbítrio não existe porque a matéria não é capaz de pensar por si só, não é capaz de sentir, não é capaz de avaliar as conseqüências de seus próprios atos, enfim, porque sinto que as decisões surgem espontaneamente, por um processo "mágico" (como um algoritmo quase perfeito, que se criou sozinho, do nada), iniciado e comandado pela mesma matéria que não pensa e não sente."
Acontece que o fato de
tomarmos decisões de forma racional implica necessariamente que a decisão foi tomada
realmente de forma racional. Os estudos demonstram que a nossa mente é extremamente competente na geração de racionalizações, ou seja, de justificativas a posteriori para os nossos atos, embora não consiga explicar como essas racionalizações ocorrem. Isso é fácil de observar, por exemplo, no caso de pessoas com danos cerebrais, como um derrame ou uma doença degenerativa como o Mal de Parkinson ou o Mal de Alzheimer. Essas pessoas
não mudam crenças ou pontos de vista por causa disso. Se antes votavam no Lula, depois da doença continuam votando no Lula; se antes eram católicas, continuam católicas após a doença, e assim sucessivamente. Essas pessoas estão sendo absolutamente sinceras e podemos pelo menos supor, como hipótese - já que as habilidades cerebrais são afetadas por doenças, causando perda de memória, debilitações físicas, alucinações, delírios, etc..., mas as crenças, convicções e capacidade de decidir ou escolher entre o certo e errado não são sequer arranhadas e que uma pessoa que era boa não se torna má, ou vice-versa - que a fonte da inteligência não se encontre no cérebro, pois jamais é afetada quando ele se deteriora (um exemplo engraçado é o caso do Stephen Hawking). Podemos pelo menos supor que o cérebro seria apenas um instrumento da manifestação da inteligência, mas não a fonte da inteligência, porque nesse caso, também os animais deveriam ser inteligentes, ainda que rudimentarmente. Podemos ainda supor que quando o cérebro está danificado, a inteligência manifesta-se com mais dificuldade, não significando, contudo, que ela se perca. Vou lhe dizer que existem evidências fortes de que a fonte da inteligência, da razão e dos sentimentos, ou seja, do livre-arbítrio, não esteja no cérebro, mas por enquanto considere apenas hipotética essa possibilidade até que mais dados venham a confirmá-la ou refutá-la. Ou seja, o fato de você sentir que não tem livre-arbítrio não é justificativa para a não existência do mesmo.
Se fosse assim, a Terra não giraria em torno do Sol.
Atenciosamente.
P.S.: Desculpe a brincadeira. Só quis mostrar que hipóteses racionais podem ser formuladas para justificar qualquer ponto de vista. Somente os fatos podem desmenti-las ou ratificá-las. Vocês ainda não têm os fatos a seu favor e, portanto, todas as conjecturas ainda são hipoteticamente válidas.
Um abraço.