O avanço cultural e tecnológico humano é realmente impressionante em relação ao das demais espécies, mas isso não justifica a tentativa de descaracterizar conceitos como o de natureza e de evolução para puxar a brasa para a sardinha humana.
Justifica sim. É o grande diferencial humano. É originário da natureza biológica da espécie humana. Não existe nada de artificial para a cultura humana, apenas usamos essa palavra para diferenciar o que é produto natural realizados pelo bicho homem, contra o que é natural, que não foi produzido pela nossa espécie. Não existe nada de artificial na realidade.
A cultura humana é por definição um artifício e portanto artificial, embora ao mesmo tempo não deixe de fazer parte da natureza. De qualquer forma não entendo por que você está preocupado em mostrar que a cultura humana não é artificial, já que a questão não é essa.
Vejo uma grande correlação entre esse entendimento e o meu ponto. Isso presica estar claro. O fato da cultura humana ser um artifício por "definição" não quer dizer nada, já que definição é um conceito epistemológico de nossa cultura. Nós enquanto animais sociais classificamos/denominamos a nossa cultura como um artifício, usando essa sua definição de cultura.
Salvo engano meu, o ponto da controvérsia é outro: especificamente, se há ou não algo de origem ou natureza biológica que torne o ser humano unicamente capacitado em algum sentido.
Exatamente esse o ponto. Por isso eu ressalto a importancia de dizer que a cultura é originária de determinada população(sentido biológico)/espécie. Essa capacitação é originária do cérebro humano, que contém a característica de sociabilidade avançada da espécie.
Minha resposta é que pode-se dizer que sim, mas apenas por critérios específicos que valorizam a cultura e a tecnologia, e com a ressalva de que essa superioridade humana é completamente acidental; poderia ter acontecido com outros primatas, por exemplo.
Poderia ter acontecido com outros, mas aconteceu conosco. O fato é esse. Daí que cultura e tecnologia se são critérios específicos, são específicos da biologia humana. Resultados dos atributos do nosso cérebro. Não dá para dissociar essas características da nossa biologia, por isso que insisto nessa correlação.
Somos resultado da natureza real, da evolução. Acidente não é uma boa denominação para a nossa existência, pois isso já está implícito no entendimento da seleção natural, do qual sobrevive as espécies que se adaptaram as pressões evolutivas, então é ser redundante ao aspécto biológico da espécie.
Salvo engano meu, nesse ponto bato de frente com Dennett, que é por assim dizer um sincretismo da hipótese Gaia com o darwinismo, temperado com uma pitada de antropocentrismo chauvinista.
Como o texto mostra, existe também essa discordância com Dennett, da qual compartilho.
A questão imediata a que você respondeu no trecho acima, mas não à minha satisfação, é que cultura e natureza não são a mesma coisa e não tem por que ser tratados como sinônimos.
Não é isso. Eu digo que a cultura humana e a natureza são a mesma coisa. Porém a natureza não é a mesma coisa que a cultura humana. Enquanto espécie biológica, temos uma cultura particular e distinda das demais culturas, das outras espécies.
Da mesma forma, "evolução" no sentido darwinista NÃO tem uma intenção, não tem nem mesmo uma direção definida.
A avaliação adaptacionista da biologia darwinista é interpretada de maneira diferente por Dennett, com a aplicação da perspectiva intencional a biologia. Ou seja, tem uma intenção e uma direção, não é aleatória.
O ser humano não é mais ápice da evolução do que vírus e fungos o são.
Essa é uma visão tradicional da biologia, da qual, ao meu ver, é mais um resquício da teoria fixista, onde todas as espécies foram criadas simultaneamente por deus.
Essa visão de que fungos e vírus e outros animais, "querem é sobreviver", é uma perspectiva intencional aplicada a biologia. É um reflexo da cultura humana aplicado aos demais animais. O que não falha muito, já que somos animais também. Mas somente nós podemos nos dar ao luxo de aplicar essa perspectiva e dizer como as espécies pensam. Temos a linguagem bem desenvolvida para isso, uma de nossas principais características.
Obvio que os animais não se preocupam com problemas sociais e ambientais, nem existe essa realidade para eles. Esses são conceitos artificiais na natureza, presentes apenas no contexto da cultura humana.
Nope, Adriano. Os CONCEITOS talvez sejam artificiais, mas alguns animais TEM suas culturas mesmo assim. Mas principalmente, eles TEM necessidades ecológicas e ambientais. Essa realidade EXISTE para eles, mesmo que a maioria não seja capaz de formular pensamentos abstratos a respeito ou mesmo se conscientizar dessa realidade. Só porque não se dão conta não quer dizer que não tem necessidades, e em alguns casos inclusive culturas.
Essa perpectiva intencional é o máximo. É interessante ver como isso domina o discurso biológico. Você está falando em nome das outras espécies animais, devido ao seu conhecimento em biologia.
Mas errei mesmo sobre a questão de sociedade, já que as populações de indivíduos de uma espécie, atuam muito em sociedade, principalmente competindo entre si. Disso que surgem as nessecidades "sociais", que são a sobrevivência da espécie/população. Tanto que a evolução ocorre entre os genes, que enquanto espécies sobrevivem através da reprodução sexual dos organismos.
Mas a percepção de ecologia é estritamente humana, através da ampliação da percepção do seu habitat, do seu ambiente, que chega a ocupar praticamente todo o globo.
Nós somente somos um problema para o planeta através de nossa perspectiva antropocêntrica.
Essa é uma inversão bastante indevida da definição de antropocentrismo.
O ser humano consome recursos e muda o meio ambiente de uma forma muitas vezes danosa para o ecossistema, ponto em risco e de fato inclusive extinguindo espécies inteiras.
Dizer que só somos um problema para o planeta por uma perspectiva antropocêntrica é um disparate, possivelmente alimentado pelo desejo (antropocêntrico) de dizer que só o ser humano pode ser solução para o planeta.
Mas é a verdade Dantas. Não podemos por a culpa em deus algum, a responsabilidade pelo que acontece é nossa. E talvez não consigamos resolver esse problema e seremos extintos. Enquanto o mito do progresso foi uma verdade para a sociedade, a destruição ambiental foi ignorada. Agora o paradigma é outra, a preocupação ecológica está dominando a nossa cultura, com a busca de novas tecnologias verdes, a busca de formas ecológicas de obtenção de energia.
Estamos usando a perspectiva intencional para o planeta, o transformando na mãe natureza. Será a terra gaia? Estaremos prejudicando a mãe natureza? Não. Estamos preocupados com a natureza, enquanto espécie, para a nossa sobrevivência futura.
Como assim "estamos transformando o planeta na mãe natureza"? Isso me parece mais delírio do que qualquer outra coisa, francamente. É tentar emprestar ao impacto da cultura humana na sociedade um aspecto de "Destino Manifesto", idéia um tanto exótica para quem se apresenta como ateu.
Mas por isso mesmo que não considero a humanidade como um acidente da natureza. É influtífero pensar em outra alternativa de evolução biológica que não contemplasse a humanidade, pois daí não teria uma humanidade para pensar nessa hipótese. A nossa única referencia biológica concreta para a especulação da vida, num maior grau de ética e moral, é a humanidade. E nisso o existencialismo aborda bem, estamos condenados a sermos livres, a viver com a angustia da liberdade, porém saber que isso nos conduz a uma realidade.
Nem a natureza nem a humanida, mas sim a humanidade como representação da natureza.