Livre-arbítrio...?
Teria o ser humano capacidade de mudar aquilo que ele é?(natureza) Seria o homem capaz de mudar suas preferências subjetivas espontaneamente? É possível alguém, de repente, mudar os traços genéticos e culturais que determinam seu comportamento? É o ser humano capaz de mudar, sem influência ambientais o seu caráter? Se o ser humano, por natureza, não pode mudar aquilo que ele é (hereditariedade); não é capaz de mudar suas preferências; não é capaz de alterar suas características biológicas e culturais, nem mudar de preferências próprias e intrínsecas a sua natureza, onde podemos “encaixar” o livre-arbítrio?
O Livre-arbítrio diz respeito à crença em que o homem tem o poder de escolher suas ações. Por exemplo, alguém pode escolher beber água, ou não quando estiver com sede; ele tem total liberdade de escolher entre essas duas ações. Mas o problema no conceito está na palavra LIVRE. Se analisarmos as circunstâncias em torno da situação, vemos que não se trata etimologicamente de LIBERDADE, muito menos liberdade da vontade. Primeiro porque nossa vontade não é livre, pois se dissermos que o homem tem a opção de escolher entre uma coisa e outra, nos permite fazer a seguinte pergunta: foi o “eu” individualmente quem criou as opções? (o meio)
A [vontade] que é o resultado de uma série de fatores, como genéticas e culturais levanta outras questões. Esses fatores estão completamente fora de nosso domínio imediato. Portanto, nos cabe perguntar até que ponto existe uma VONTADE LIVRE. Se não podemos decidir qual tipo de comida nos será preferível (antes de nos tornarmos adultos) – pois cabe ao meio e a genética “fazê-lo”–, como posso dizer que essa vontade é livre?
Um índio não decide valorizar mais a um arco e flecha do que um rifle; um brasileiro não decide valorizar mais a Língua Portuguesa do que o Mandarim; uma criança não decide preferir um refrigerante a um copo de cerveja. O meio em que ela vive; as circunstâncias, o tempo, as propagandas, os pais, a escola, os costumes culturais, o tipo de música, as tendências e muitos outros fatores serão a causa dessa VONTADE.
Arbítrio é vontade. Mas não há livre-arbítrio, isto é, vontade-livre. Pois uma vontade livre não se submeteria às circunstâncias que lhe rodeiam.
Dizer que temos livre-arbítrio seria o mesmo que dizer que alguém que quer dormir, assim o faria se pudesse. Pergunte a uma pessoa que sofre de insônia se ela tem domínio de seu sono. Dormir é tudo que ela quer, mas não consegue. O mal de insônia não lhe permite... Esse exemplo poderia ser aplicado ao psicopata, ele o é porque quer?
Ter vontade livre é o mesmo que ter a capacidade de mudar os rumos de seus desejos. “Eu gosto muito de laranjas, mas a partir desse momento vou passar a não gostar mais, ou seja, a minha vontade está submissa a mim. Eu tenho poder de mudar, pois sendo minha, eu posso livremente decidir”.
Se tivéssemos livre-arbítrio; ou seja, se nossa vontade fosse LIVRE, nós não seríamos afetados pelo nosso ambiente. O tipo de comida que comemos; o tipo de música que gostamos; a religião que seguimos; os costumes que temos; os valores sociais que praticamos etc. nada disso seria capaz de influenciar nosso comportamento, pois sendo uma vontade livre, não teria porque esses fatores determinarem nossa maneira de ser.
Um cristão poderia decidir ser mulçumano sem a interferência do meio. Um estalar de dedos, e você é um mulçumano. Um esquizofrênico poderia – com um estalar de dedos – decidir não mais ser o que é. Um padre, do nada, poderia decidir ser um ateu, pois sua vontade é livre, não precisa de fatores externos para mudar seu caráter.
Se há livre-arbítrio, por quê os cristãos não conseguem acreditar nos deuses indígenas? Por que não conseguem crer nos deuses nórdicos? Apenas pra sentir qual seria a sensação, depois poderia decidir voltar a crer nos seus deuses de origem. Afinal a vontade É LIVRE.
QUEM CRIOU AS OPÇÕES?
O grande problema em torno do conceito da palavra livre-arbítrio é de cunho etimológico e filosófico. A palavra livre é sinônimo das palavras: autorizado, permitido, lícito, desobrigado, dispensado, eximido, isento, liberado, desatado, desligado, desprendido, solto, imune etc.
A palavra arbítrio seria: vontade, anelo, anseio, ânsia, aspiração, desejo, arbítrio, volição, bel-prazer etc.
Portanto livre é aquele que não depende de absolutamente nada. Sendo assim nem os pássaros que tanto elogiamos por sua “liberdade” não são livres, pois eles dependem de “N” fatores para voar.
Um preso não seria livre por ganhar sua “liberdade” ao sair da prisão.. Ele não tem idéia do lhe espera lá fora.
Um consumidor não é livre por “escolher” um refrigerante no supermercado. Ele não tem idéia do bombardeio ideológico pelo o qual ele passou até o ato da compra.
Sendo assim, o relativismo é a única solução na aplicação da palavra livre-arbítrio. Partindo de um determinado ponto de vista é que o conceito dessa filosofia poderia fazer algum sentido. Pois dizer que existe livre-arbítrio no sentido literal da palavra não faz sentido.
Quando Adão e Eva foram condenados pela desobediência, por não ter escolhido não comer a maçã, eles poderiam ter questionado a Deus sobre as opções que já havia, muito anteriormente sido planejadas. Se eles eram LIVRES, por que não participaram no projeto do Éden e de toda trama? Assim as ditas opções que lhes foram impostas, não seriam tão injustas.
Muitas pessoas adoram dizer que as desgraças que ocorrem no mundo é por culpa do pecado. Recorrem à idéia de que o ser humano tem livre-arbítrio, e por isso o homem será cobrado. Mas infelizmente poucos entendem sequer, o que significa livre-arbítrio.
Seria o ser humano também culpado pelas catástrofes naturais que acontecem? Terremotos, furacões, maremotos, doenças, pragas etc. Milhares de pessoas morrem todos os anos por causa dos efeitos da natureza – pessoas boas e más. Apesar da ação humana sobre a natureza, não podemos deixar de lembrar que esses fenômenos sempre existiram – desde os primórdios de nossa história. Portanto, não convém apontar o homem como o único causador desses fatos, ou seja, há aqueles que são fomentados pela a ação do homem e há aqueles que são próprios da transformação do planeta.
O fato é que esses acontecimentos põem em xeque a crença do livre-arbítrio. Os acontecimentos de cunho históricos e políticos também são determinantes no comportamento das pessoas. A cultura ocidental é diferente da cultura africana, por conseguinte os mesmos terão crenças, atitudes e opiniões diferentes.
Na Idade Média os padres católicos achavam que queimar pessoas era uma boa maneira de punir um indivíduo por um crime, especialmente àqueles que contradiziam as regras da Igreja (heresia). Hoje os tempos são outros, a ciência, o humanismo, as opiniões mudaram; por conseguinte as atitudes também mudaram, ou seja, os fatos em transformação influenciam o comportamento do cidadão, e não uma vontade LIVRE, pois a vontade do homem não é imune aos acontecimentos que lhe rodeiam.