Tudo bem. É racional querer que todas as terras aproveitáveis do país sejam usadas. Só não entendo o porquê de você pregar a desapropriação de terras legais e produtivas existentes, ao invés de pregar a distribuição de terras ainda pouco usadas (e até mesmo criticando os assentamentos feitos em terras ainda não-usadas).
O que eu critiquei é a criação e posterior abandono destes assentamentos que carecem de infra-estrutura adequada. Sem apoio nenhum, em regiões abandonadas, não é de se estranhar que os assentamentos transformem-se em regiões de grande pobreza. Já a minha defesa de limite à propriedade se baseia mais em uma reparação do modo pelo qual as terras se distribuíram no país e que foi responsável por vários problemas que viemos a ter. Também se baseia no que eu acho ser uma distribuição mais racional do espaço físico do país que daria à cada agricultor individual condições melhores de competir e negociar sua produção.
Na prática, não acredito que uma coisa dessas vá acontecer atualmente. O PSOL terá uma quantidade relativamente muito baixa de votos na eleição para a presidência e a bancada ruralista no congresso vai continuar bastante forte. No momento não é viável, apesar de achar desejável.
Quanto menor a escala de produção, maiores tenderão a ser os custos unitários. É mais custoso unitariamente o uso de um trator em 50 hectares do que em 100.
O raciocínio seria válido se o limite à propriedade fôsse muito pequeno. Um único trator não pode ser usado em propriedades de tamanho arbitrário. As máquinas tem um limite. Depois de um certo tamanho, precisa-se comprar um segundo trator, ainda que a gente esteja na mesma propriedade. O limite à propriedade da terra defendido pelo PSOL, se não me engano é de 1000 hectares. Creio que de qualquer forma, toda propriedade que plante em mais de 1000 hectares tem mais de 1 trator.
Mas mesmo que a tecnologia avance e tratores sejam substituídos por máquinas que possam cuidar de áreas muito maiores, não acho que este seja um argumento tão bom. Poderia-se usar o mesmo raciocínio para argumentar que seria melhor haver o menor número possível de empresas que produzam uma determinada mercadoria, já que assim estaríamos evitando o desperdício causado pela replicação de mecanismos de administração que seriam individuais para cada empresa. O problema do raciocínio é não levar em conta que oligopólios e monopólios acabam tendo um efeito ainda mais danoso na questão de gastos e desperdício.
Os assuntos estão completamente interligados. Você dá a entender ao longo do tópico que a desapropriação e distribuição de terras resolveriam a maior parte dos "problemas sociais" do Brasil... como se ainda estivéssemos no século XIX...
A maior parte não. Apenas aqueles que são causados pela crescernte concentração fundiária.
Se o setor primário estivesse demandando mais trabalhadores do que o atual, ele contrataria esses trabalhadores. Se não emprega mais é porque não está precisando.
Como explicar então que ainda hoje existam fazendas improdutivas? Terras não funcionam da mesma forma que empresas. Se não ocorrer desapropriação, um sujeito com uma grande propriedade que produz pouco ou que não consegue empregá-la de maneira adequada, vai ficar com ela, desperdiçando recursos naturais indefinidamente. O campo poderia ser bem mais produtivo e empregar bem mais gente se a legislação atual referente às terras realmente fôsse cumprida.
No parágrafo anterior, estou falando da legislação atual, não da aplicação de limite à propriedade da terra. Como bem comentou o sr. Plínio do PSOL, o que justifica este limite não é o aumento da produtividade, ou até mesmo da empregabilidade. É uma questão de reparação de injustiça histórica e também de dar melhores condições para que cada agricultor individual tenha melhores possibilidades de vender e negociar sua produção. A concorrência com latifúndios produtivos torna as coisas bem mais difíceis para produtores menores.
Isso também feriria cláusulas pétreas (se não me engano).
A única exigência da constituição é que a propriedade cumpra sua "função social", não importa seu tamanho.
Depende de como fôsse feito. O que comentei é que não é impossível instituir a aplicação de um limite à propriedade da terra sem ferir a constituição, meramente colocando uma emenda que defina o limite. As desapropriações seriam feitas com mecanismos já existentes. Uma propriedade pode ser desapropriada para fins sociais, desde que seus proprietários sejam indenizados. Se não me engano, é o que permite remover pessoas de suas casas para que se construam barragens em um lugar, por exemplo.
"É decisiva para a formação do conceito de agricultura familiar a divulgação do estudo
realizado no âmbito de um convênio de cooperação técnica entre a Organização das Nações
Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (INCRA). O estudo define agricultura familiar “[...] a partir de três características centrais:
a) a gestão da unidade produtiva e os investimentos nela realizados são feitos por indivíduos que
mantém entre si laços de sangue ou casamento; b) a maior parte do trabalho é igualmente
fornecida pelos membros da família; c) a propriedade dos meios de produção (embora nem
sempre da terra) pertence à família e é em seu interior que se realiza sua transmissão em caso de
falecimento ou aposentadoria dos responsáveis pela unidade produtiva” (INCRA/FAO, 1996: 4)."
Ao lado das classificações acadêmicas, surge a delimitação formal do conceito de
agricultor familiar, prevista na Lei 11.326, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo
presidente da República em 24 de julho de 2006. Esta lei considera “[...] agricultor familiar e
empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo,
simultaneamente, aos seguintes requisitos: I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4
(quatro) módulos fiscais; II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas
atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III - tenha renda familiar
predominantemente originada de atividades econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou
empreendimento; IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família” (Brasil,
2006). Tendo em conta o atendimento de tais requisitos, inclui ainda “[...] silvicultores que cultivem
florestas nativas ou exóticas e que promovam o manejo sustentável daqueles ambientes; [...]
15 aqüicultores que explorem reservatórios hídricos com superfície total de até 2 ha (dois hectares)
ou ocupem até 500m³ (quinhentos metros cúbicos) de água, quando a exploração se efetivar em
tanques-rede; [...] extrativistas pescadores que exerçam essa atividade artesanalmente no meio
rural, excluídos os garimpeiros e faiscadores” (Brasil, 2006).
http://redeagroecologia.cnptia.embrapa.br/biblioteca/agricultura-familiar/CONCEITO%20DE%20AGRICULTURA%20FAM.pdf
"O módulo fiscal de cada município, expresso em hectares, será fixado pelo INCRA, através de Instrução Especial, levando-se em conta os seguintes fatores: a – o tipo de exploração predominante no município; I – hortifrutigranjeira; II – cultura permanente; III – cultura temporária; IV – pecuária; V – florestal; b) a renda obtida no tipo de exploração predominante; c) outras explorações existentes no município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada; d) o conceito de "propriedade familiar", constante do art. 4º, item II, da lei 4504, de 30 de novembro de 1964. § 1º. Na determinação do módulo fiscal da cada município. O INCRA aplicará metodologia, aprovada pelo Ministro da Agricultura, que considere os fatores estabelecidos neste artigo, utilizando-se dos dados constantes do Sistema Nacional de Cadastro Rural. § 2º. O módulo fiscal fixado na forma deste artigo, será revisto sempre que ocorrerem mudanças na estrutura produtiva, utilizando-se os dados atualizados do Sistema Nacional de Cadastro Rural".
A distinção é relevante em face da diferença de extensão de um para outro. Para citar apenas um exemplo, no município de Hidrolândia, na região da Grande Goiânia, um módulo rural mede 3 hectares, enquanto que o módulo fiscal mede 12 hectares. A implicação é enorme, porque, a se adotar o número de módulos rurais, imóvel pequeno naquele município seria o que tivesse até 12 hectares, enquanto que pelo conceito adotado pela lei 8629/93 que se refere ao módulo fiscal, passa para 48 hectares! Seria de se perguntar quantas pessoas, neste país, em região valorizada e próxima de grande centro, teriam um imóvel rural com área de 48 hectares. Certamente, a resposta seria a de que, de todos os proprietários rurais, bem poucos não seriam considerados pequenos.[/u]
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1676
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A informação está correta, Diego. Quando se fala em "pequenas propriedades" ou "agricultura familiar", não se está falando de pequenos sitiozinhos que possuem algumas galinhas, uma pequena horta e ferramentas precárias. Estamos falando de propriedades que possuem condições adequadas para se produzir o alimento que quiserem. Realmente a maior parte dos agricultores brasileiros se encaixa na definição de "agricultura familiar utilizada". São muitos poucos os que tem áreas maiores de 48 hectares.
Agora imagine então quão poucos são então aqueles que possuem mais de mil hectares. Este é aliás, um valor extremamente elevado, muitíssimo maior que o limite à propriedade da terra existente em qualquer país que já o adotou e o dobro do limite proposto por Jango no passado. Por esse ponto de vista, a proposta do PSOL é até um grande rebaixamento de pauta.
Vale lembrar também que apesar de raríssimos, os proprietários que possuem mais de 1000 hectares são donos de uma quantidade de território nada desprezível, que muitas vezes se estende para muito além dos 1000 hectares iniciais.