Vídeo de política com toque de religião (Olavo)
Uma direita anti-científica, anti-vacina e anti-razão.
Comento sobre a mania conspiratória espalhada por uma certa direita paranóica que vê complô em tudo: vacinas, terra plana, política, etc.
Agnos... é o seguinte...
Essa direita não vê complô em tudo. Mais pessoas precisam começar a perceber o que realmente está acontecendo porque as coisas estão tomando um rumo estranho.
Essas teorias conspiratórias absurdas que acabam assumindo dimensões desproporcionais, têm origem não em uma espécie de surto de paranoia acometendo uma determinada faixa do espectro político-ideológico, mas em estratégias muito bem calculadas de diferentes grupos com interesses distintos, mas que acabam se aproximando quando suas bancadas políticas percebem que eles têm alguns pontos em comum e que apoiando-se mutuamente se reforçam. Outra coisa que levou a aproximação entre estas bancadas foi o fato delas se valerem de estratégias muito semelhantes para defender os interesses que representam. ( A exemplo de nossa bancada BBB aqui. )
Não é exagero dizer que são interesses em conflito com a realidade. Esse é o principal elo que os une. Que os uniu.
São grupos que adquiriram força política da manipulação da opinião pública, tendo sido capazes de levar a uma parcela significativa do eleitorado a rejeitar a própria realidade objetiva mais evidente. E é um fenômeno que parece ter origem dentro do partido republicano norte-americano e por isso é identificado como uma coisa de "direita", porque foi no partido republicano que estes grupos constituíram suas bancadas mais fortes e é dentro desse partido que eles acabam se aproximando. Muito embora também tenham alguma parcela de influência no partido democrata.
E de que grupos estamos falando? De grupos que defendem interesses como os do:
- Fundamentalismo cristão.
- Indústria armamentista.
- Indústria do tabaco.
- Indústria do petróleo.
- Do lobby sionista.
São todos interesses que desejam substituir realidade por ilusão. Os seus "negócios" dependem muito das pessoas acreditarem que a Terra não tem milhões de anos, que os americanos estão mais seguros e felizes com uma população toda armada e que a altíssima incidência de mortes por armas de fogo não tem nenhuma relação com isso, que cigarro não faz mal à saúde, que não existe efeito estufa e que os interesses de Israel são os mesmos dos EUA.
Todas crenças absurdas que não resistem a mínima racionalidade, mas que puderam ser disseminadas através de técnicas semelhantes de manipulação e propaganda patrocinadas por gigantescos poderes econômicos. Se alguém começa a estudar como é construído o discurso dos negacionistas do holocausto percebe que, na forma, é muito, muito semelhante ao discurso dos negacionistas climáticos. Também se observa o mesmo padrão na ofensiva para desqualificar os dados científicos sobre os males do cigarro ou para desqualificar o consenso científico sobre as mudanças climáticas. Há algumas décadas, nos Estados Unidos, havia médicos dando palestras e escrevendo livros e artigos alegando que o cigarro não era a causa de nenhum problema de saúde. Médicos muito bem pagos pela Phillip Morris, é claro. E a retórica e a técnica empregada nestes argumentos, na forma, é a mesma utilizada hoje por um negacionista climático como o Molion ou o Augusto Felício. Os neo-nazistas e a extrema-direita na Europa está aplicando o "know-how" desenvolvido por estes profissionais do negacionismo. Know-how já substanciado por larga experiência acumulada desde os primeiros movimentos negacionistas da Teoria da Evolução, das batalhas judiciais travadas pela indústria do tabaco, passando pelos negacionistas financiados pela indústria que lucrava com os CFCs, até chegarmos a vários movimentos atuais de negacionismo que, como afirmei anteriormente, acabaram se aliando política e economicamente e assim se tornando ainda mais influentes.
Mas como se dá esta associação? Uma leitura perspicaz dos dados apresentados no artigo abaixo pode fornecer algumas pistas...
Contar com meia dúzia de "cientistas" vendilhões e pseudo- especialistas para semear a dúvida não é novidade. A indústria fóssil está imitando a indústria tabagista. O que é lamentável é o truque "colar" outra vez!
O cigarro causa câncer. [...]
UMA NUVEM DE FUMAÇA... DE CIGARRO
Mas durante anos, a indústria do tabaco contou com o apoio de institutos privados, "cientistas" vendidos, políticos comprados e de setores da grande mídia para vender a dúvida como produto, isto é, a ideia de que a ciência não tinha evidências fortes de que o cigarro causava câncer, de que ainda havia muitas incertezas, de que não fazia sentido adotar medidas de contenção ao fumo. Nunca se tratou da construção de um corpo coerente de hipóteses testáveis, de apresentação de evidências, adotar o mínimo de rigor cientifico e de honestidade intelectual. Nunca. Sempre teve a ver com a possibilidade de conquistar a simpatia ou ao menos de neutralizar a opinião pública e de sobretudo paralisar a sociedade e o poder público, evitando que restrições ao consumo do tabaco (e claro, ao lucro) fossem adotadas. Confusão e dúvida, é claro, era o mínimo que viria na cabeça do público em geral se médicos se prestavam ao papel de garotos-propaganda...
E eis que a indústria do tabaco conseguiu, durante um longo período de tempo, o seu intento. Durante muitos anos, mesmo após estudos que deixavam clara a ligação de causa e efeito (fosse via experimentos em laboratório com cobaias fosse através de estudos estatísticos robustos com amostragem inequívoca em meio à população humana, que atestavam a correlação entre consumo de tabaco e câncer), ainda era permitido fumar em locais fechados, ainda havia uma "classe de fumantes" dentro dos aviões, grávidas fumavam, as revistas e as TVs eram inundadas por propagandas que sempre vinculavam os fumantes à virilidade e à prática de esportes e as mulheres à sensualidade (claro, uma dose de sexismo não faria mal à indústria desde que todos e todas fumassem!). Até os carros de fórmula um pareciam carteiras de cigarro sobre rodas.
O custo desse sucesso? Diante da estimativa de uma mortalidade anual [...]
QUEM ESTAVA POR TRÁS
Uma parte importante da história começa com Frederick Seitz, físico de formação, com uma invejável carreira a partir da Física do Estado Sólido, tendo chegado ao posto de dirigente máximo da Universidade Rockefeller e nada menos do que presidente da Academia Nacional de Ciência dos Estados Unidos na década de 1960. Ele mantinha vínculos aparentemente esporádicos com diferentes setores privados, mas foi em 1979, após se aposentar da Universidade Rockefeller que ele assumiu o posto de consultor... da Companhia de Tabaco R.J. Reynolds. A empresa, que hoje posa de boazinha em seu website, falando de impostos pagos, de redução de danos e prevenção dos males dos seus produtos, passou muitos anos patrocinando um negacionismo dos mais sórdidos, com o que contou com Seitz como um dos principais articuladores. Ele serviu como consultor da R. J. Reynolds oficialmente por quase uma década, período no qual fundou o "George C. Marshall Institute" (GMI), uma instituição privada que passou a organizar o combate à maioria da comunidade científica em uma série de assuntos, do tabaco à defesa do projeto "Guerra nas Estrelas" de Ronald Reagan (contra o qual se levantaram importantes personalidades científica
s como Carl Sagan e outros cientistas comprometidos com causas populares, como os organizados na Union of Concerned Scientist s); dos CFCs ao aquecimento global. Dentre os financiadores do GMI por um longo período destacou-se... a ExxonMobil...
Aqui cabe um adendo importante...
Veja que Seitz inicia sua próspera carreira de negacionista como mercenário da indústria do tabaco, mas logo o seu instituto, o GMI, passa a produzir propaganda anti-científica sob encomenda de diversos outros grupos econômicos que também tinham interesse no descrédito do consenso científico. E isso já no início dos anos 80! A gente começa a ver de onde e como vai surgindo esse movimento anti-ciência, como atende a interesses diversos e como estes interesses distintos foram se aproximando por financiarem muitas vezes os mesmos influenciadores de opinião pública. O GMI recebia dinheiro do complexo industrial militar, da Tabaco R.J. Reynolds e até da pretolífera ExxonMobil.
Outra peça importante nesse tabuleiro foi Fred Singer, austríaco, engenheiro eletricista e físico (sim, sendo eu físico de formação tenho uma vergonha infinita da impostura que lamentavelmente não parece ser tão rara assim no meio). Singer foi particularmente ativo na tentativa de desacreditar os estudos que a Agência de Proteção Ambiental dos EUA organizaram e que atestavam os sérios riscos a que eram submetidos os fumantes passivos ("second-hand smoke"). O tom de Singer sempre foi desrespeitoso e agressivo, taxando o consenso construído pela comunidade científica como "junk science". Singer parecia mais cauteloso do que Seitz no que dizia respeito aos seus vínculos, mas estes começaram a ser revelados a partir de um artigo para o "Instituto Cato", mais uma instituição de fachada, esta controlada pelos irmãos Koch, David e Charles, que estão entre as 10 maiores fortunas do mundo. Como se fosse alguma surpresa, além de outras consultorias, Singer terminou admitindo seu vinculo de consultor com... a ExxonMobil, ora veja (cinicamente, porém, dizia que "suas fontes de financiamento não influenciavam" as suas "pesquisas", como se de fato ele fizesse alguma!)
Parece um velhinho simpático, certo? Mas é um canalha. Fred Singer destila toda a sua verborragia contra a comunidade científica há décadas, seja para defender a indústria do tabaco, contestar o conhecimento estabelecido sobre o papel dos CFCs na destruição da camada de ozônio, seja sobre mudança climática. Poderia ser apenas uma personalidade doentia, cuja voz é amplificada até por sua titulação (PhD em Física), mas há mais em jogo: Singer é um velho aliado da indústria petroquímica, tendo servido a ela como consultor.
Mais uma observação importante...
Fred Singer é outro paladino anti-ciência. Também aluga seus serviços pra quem quiser pagar: pode ser a indústria do tabaco, dos CFCs, do petróleo, criacionistas... Todos que partilham em comum o mesmo interesse em difundir o descrédito da comunidade científica e, se possivel, da própria Ciência. É muita ingenuidade pensar que o geofísico Afonso Vasconcelos simplesmente acordou um dia abestalhado e resolveu jogar no lixo sua carreira defendendo a Terra plana, e isso só por uns míseros trocadinhos de monetização no YouTube. Não, toda essa onda anti-ciência
interessa a muitos grupos que para impor sua agenda aos políticos precisam ganhar a opinião pública defendendo posições conflitantes com o consenso científico e evidências científicas independentemente verificáveis. É preciso, é conveniente, é muito importante difundir desconfiança sobre o consenso da comunidade científica. Não tem nada de movimento espontâneo nisso aí surgindo do nada como uma paranoia coletiva atingindo ao mesmo tempo todos os influencers de direita. Não é só o Bernardo Kuster, o canal do Nando Moura também tá virando terraplanista.
Olavo de Carvalho tá compartilhando vídeos de Terra plana e rasgando elogios a Afonso Vasconcelos, que retribui as gentilezas. "Coincidentemente" Olavo é negacionista climático, é negacionista da evolução, é antivax, defende cigarro como uma maravilha pra saúde, é anti-ambientalista, faz apologia das armas e passou a flertar com o terraplanismo também. O pacote completo, e não é por acaso!
No caso do tabaco, outros nomes, incluindo de leigos com papel mais assemelhado ao de bufões a cientistas de conduta ética questionável, financeiramente ambiciosos e/ou idelologicamente conservadores ou reacionários, foram recrutados na mesma lógica, através de pseudo-institutos de pesquisa, sempre vinculados a grandes corporações. O que ficou claro porém é que tão relevante quanto o crime cometido em postergar as medidas de restrição ao fumo foi o estabelecimento de um modus operandi de negação da ciência! Esta, produzida coletivamente, a partir de acúmulos na comunidade, vários deles incrementais, constrói um consenso, isto é, uma posição amplamente aceita, baseada em um corpo de evidências sólido, reveladas por meio de diferentes linhas de investigação, por meio de diversos cientistas e grupos de pesquisa (inclusive grupos que podem concorrer entre si, por prestígio, financiamento etc.). Geralmente esses consensos envolvem o trabalho de uma comunidade ou subcomunidade inteira, não raro centenas ou milhares (quando não muitos milhares) de cientistas. Mas não mais que um punhado de vozes "dissidentes", com um discurso pré-fabricado para atender a interesses econômicos, políticos e/ou ideológicos aparece, lançando mão do jargão científico, atraindo a atenção da mídia e produzindo na opinião pública a sensação de que há um debate científico em torno do tema quando não há.
Sobre este assunto eu ainda teria muito a falar porque tem tanta coisa na cara de todo mundo e ninguém tá vendo. Mas é muita coisa para abordar em um "post" só.