Huxley,
Que livros de Gramsci você já leu? Qual parte da extensa obra de Gramsci você estudou a fundo?
É curioso que 11 de cada 10 especialistas em "gramscimo" nunca leram uma linha sequer de Gramsci.
É como Paulo Freire: de repente o Brasil tem 200 milhões de técnicos em Paulo Freire, todos críticos,
e nenhum deles jamais estudou a obra de Paulo Freire. Nâo, em meio a uma guerra ideológica tóxica permeada propaganda inescrupulosa, estes experts em Freirismo se baseiam nos tuítes de Flávio Bolsonaro para se acharem doutores na pedagogia paulofreiriana. Mas paradoxalmente Paulo Freire não parece suscitar a mesma aversão em educadores, em pessoas que estudam e entendem de Pedagogia. Aqui e fora do Brasil.
Ah, mas é claro que todos estes professores e acadêmicos são uns comunistas. Até nos Estados Unidos, onde o trabalho de Paulo Freire teve grande influência... Então é óbvio que Freire é o intelectual brasileiro mais citado em monografias (e na área de Ciências Sociais um dos mais citados do mundo) por conta do viés ideológico!
Ah, sim!, e os críticos de Paulo Freire, esse pessoal que inventa kit gay e mamadeira de piroca, que forja material falso aos borbotões (como aquele vídeo risível com a "confissão" do gen. russo, que você postou aqui), estes não têm viés não, né? Isso é fonte confiável.
E por mencionar essa tal suposta entrevista do general soviético, o que eu disse diante daquela montagem ridícula é que nem era preciso checar a autenticidade, porque obviamente nenhum vilão tem discurso de vilão. Muito menos discurso público. Portanto seria bastante insólito que Antônio Gramsci tivesse concebido um plano maquiavélico para solapar os fundamentos morais e sociais da ordem burguesa, e tivesse publicado este plano - que deveria ser insidioso - em livros!
Gramsci é tachado de maquiavélico, mas é oportuno saber que a obra em que Maquiavel teoriza muito explicitamente sobre estratégias de poder, foi concebida para ser um presente pessoal a Lorenzo de Médici - um dos homens mais poderosos da época - na esperança de obter favores. Diferentemente de Antônio Gramsci, que é descrito como um Maquiavel comunista, mas que teria feito questão de tornar populares suas ideias conspiracionistas.
Aqueles que desejam conquistar a graça de um príncipe costumam obsequiá-lo o
mais das vezes com o que possuem de mais valioso ou que possa deleitá-lo de
modo especial; por isso os príncipes são frequentemente presenteados com
cavalos, armas, tecidos de ouro, pedras preciosas e ornamentos desse gênero,
todos dignos de sua grandeza. Desejando por meu turno oferecer-me à Vossa
Magnificência com um testemunho da servidão que lhe devoto, não encontrei
entre os bens que me são mais caros, ou tanto estime, senão o entendimento das
ações dos grandes homens, aprendido por mim numa longa experiência das
vicissitudes modernas e no estudo contínuo das antigas: as quais, tendo eu com
grande diligência examinado e cogitado demoradamente, agora as condenso neste
breve volume, que envio a Vossa Magnificência.
Eu gostaria de saber o contexto em que Gramsci teria escrito que as pessoas deveriam obedecer ao partido sem sequer saber que obedecem, porque sem o contexto não se sabe realmente o que o autor quis dizer.
Que exemplos de declarações públicas semelhantes nós temos em Marx, Stalin, Hitler, etc? Seria peculiar se Hitler tivesse escrito em "Minha Luta" que ele planejava que os alemães obedecessem ao partido nazista sem sequer saber que obedeciam... Seria peculiar se ele tivesse escrito algo assim com a intenção de que os leitores (justamente os alemães que deveriam se tornar os obedientes inconscientes) compreendessem exatamente assim.
Aí novamente te questiono: o que você leu de Gramsci para discorrer com tanta autoridade e
recorrência sobre a obra do filósofo?
O marxismo cultural existe mesmo, ou é tão imaginário quanto mamadeiras fálicas?
Quem é, especificamente, o agente do marxismo cultural pretensamente idealizado por Gramsci? Sim, no mundo de hoje, quem ou o quê teria o poder e os meios para estar moldando a cultura e os costumes das sociedades?
Quando você fala em um plano de hegemonia cultural, você consegue também conceber um processo para estabelecer a hegemonia?
A menos que você também delire que as grandes corporações de mídia pertencem a comunistas, que o sistema financeiro esteja nas mãos dos comunistas, a indústria, as fortunas dinásticas como dos Rockefellers, etc, essa onipresente ameaça comunista no mundo pós-União Soviética é uma das teorias da conspiração mais anacrônicas que já inventaram.
Na imaginação de pessoas como você o comunismo não é nem uma ideologia - porque não se prende à ideologia, poderia até mesmo adotar o capitalismo antagônico - mas seria "uma forma de obter e manter indefinidamente o poder". Caraca!, mas em que planeta? Em que planeta isso acontece?
Aqui, esse "sistema para obter e manter o poder INDEFINIDAMENTE" não se sustentou nem por 70 anos. É tão eficiente neste propósito que mesmo tendo o segundo maior poder bélico do mundo, e o maior arsenal nuclear, perdeu metade da Europa em 2 anos. E sem o inimigo precisar disparar um tiro sequer. Um terço da humanidade já viveu sob o socialismo que detinha o controle sobre parte substancial dos recursos do planeta (recursos culturais, naturais e humanos), e em menos de uma década tudo isso desapareceu. Um colapso tão surpreendente, - quando consideramos a dimensão e o poder do bloco socialista - que não foi previsto por nenhum cientista político.
Ora, se com o apoio de todo este poder, o projeto de implantação do socialismo na A.L. não prosperou, como se imagina que poderia obter sucesso agora? Mas é claro que toda essa viagem na maionese se presta a dar combustível político a grupos toscos de propostas rasas, que precisam se vender para o eleitor como exterminadores de algum terrível inimigo imaginário. Porque fora disso, se você parar pra pensar, não há projeto.
Já disse e reafirmo o óbvio: o sonho socialista acabou. Quase todos os países que tentaram manter a base de um sistema econômico inspirado na teoria socialista faliram e o partido comunista foi tirado do poder. Com exceção do fóssil geopolítico que é a Coreia do Norte.
E aqueles poucos em que um partido comunista ainda se mantém no poder, estão fazendo uma transição progressiva e irreversível para uma economia capitalista de mercado. Uma economia capitalista de mercado que vai gerar - e está gerando - uma grande diferença de classes e inevitavelmente a acumulação de capital por um determinado estrato social que acaba por deter
enorme poder econômico. Na prática o fim do modelo socialista que terá como consequência o próprio enfraquecimento do poder do partido comunista.
Porque a questão não é que a liberdade econômica leve necessariamente à democracia. A questão é que não há nenhum exemplo histórico onde um grupo social tenha alcançado poder econômico sem consequentemente adquirir poder político.
Os exemplos que você citou anteriormente - a maioria teocracias islâmicas - são todos países onde os grupos que detém o poder econômico são também os que asseguram o poder político. E de uma maneira até mais direta que na maioria das democracias ocidentais.
E não é esse o caso de estados nominalmente socialistas, mas onde se instala um capitalismo vigoroso, moderno e industrial, que produz uma classe de empresários extremamente bem sucedidos e biliardários, onde haverá duas consequências inevitáveis:
1 - Os interesses destas empresas, destes negócios e de quem lucra com eles, progressivamente se incompatibilizam com a estrutura de um modelo socialista. Quando, por exemplo, não se reconhece o conceito de propriedade intelectual, mas estas empresas precisam garantir, elas próprias, seus investimentos em tecnologia e inovação. Além de outras formas de patrimônios na forma de propriedade intelectual. Ou quando querem se capitalizar com ações na bolsa... e etc, etc ...
2 - É inevitável que estas empresas passem a ter cada vez mais o poder econômico necessário para fazer prevalecer seus interesses.
Lembre-se que você mesmo acredita que a perestroika foi o resultado do lobby feito por um grupo que acumulou tanto capital na URSS, a ponto de estar em condições de pressionar e induzir o próprio partido comunista a fazer profundas mudanças estruturais. Logo, é incoerente argumentar que o partido comunista chinês vai estar imune a este tipo de assédio em uma economia onde estão surgindo algumas das maiores empresas do mundo!