Sem diálogo com governo, indígenas buscam apoio internacionalNa Amazônia, lideranças se reúnem com ministro alemão do Desenvolvimento, criticam gestão de Bolsonaro em relação aos indígenas e apelam por pressão estrangeira – vista como peça-chave para denunciar violações.
Nara Baré, chefe da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab)
Sentada à frente de Gerd Müller, ministro alemão do Desenvolvimento, Nara Baré diz que seu povo está sob ataque. Primeira mulher à frente da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), ela fala sobre o aumento das invasões de terras indígenas, do garimpo ilegal, das fazendas com gado e plantações em áreas griladas.
Müller quer saber se não é possível recorrer à Justiça para frear a ilegalidade nesses casos. "Possível é, mas a questão é se a Justiça vai realmente cumprir o seu papel", responde Baré, intermediada por uma intérprete.
O diálogo ocorre longe dos centros de decisão. Cercados por Floresta Amazônica, na reserva Rio Negro, o ministro alemão e uma comitiva fazem perguntas sobre o cotidiano e as dificuldades dos povos que vivem na floresta. Durante a visita de uma semana ao Brasil, Müller sobrevoou a região nesta quinta-feira (11/07) e passou horas na comunidade Tumbira, que fica dentro da reserva.
"Temos um presidente que declarou que governa para os ruralistas", disse Baré ao ministro alemão, lembrando um discurso feito por Jair Bolsonaro a deputados na última semana. "Não é um governo para todos os brasileiros. Ele desrespeita nosso povo, nossa história, nossas terras", prosseguiu.
No Brasil, terras indígenas ocupam cerca de 13% do território e são habitadas por aproximadamente 255 povos diferentes. Há ainda aqueles que optaram por viver em isolamento, estimados em cerca de 100 grupos na Amazônia, segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai).
Sem conseguirem dialogar com o governo brasileiro, lideranças indígenas buscam chamar atenção fora do país. "A gente sabe, e a gente vem investindo nisso, que a pressão lá fora dá resultados", disse Baré à DW Brasil.
Uma das provas, segundo ela, foi a polêmica em relação à demarcação de terras indígenas. Logo que assumiu, Bolsonaro passou a responsabilidade para o Ministério da Agricultura. Após repercussão internacional e mobilização no Congresso, o decreto não virou lei.
Dinheiro internacional
O encontro de Müller e Baré acontece numa das comunidades beneficiadas pelo Fundo Amazônia. Desde 2008, a iniciativa apoia projetos que combatem o desmatamento e estimulam o desenvolvimento sustentável, com recursos doados por Noruega e Alemanha. Até agora, foram repassados 3,4 bilhões de reais.
Desde que o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pediu mudanças na estrutura de decisão do fundo e acusou o programa de má gestão, a continuidade da cooperação ficou incerta. Após reuniões tensas, tanto Salles quanto os embaixadores de Alemanha e Noruega admitiram a possibilidade de que o Fundo Amazônia venha a ser extinto. Müller também veio ao Brasil para falar sobre o assunto, e o tom após a visita é que a parceria se manterá.
É o que espera Izolena Garrido, presidente da comunidade Tumbira, professora e artesã. O dinheiro investido nos moradores por meio de oficinas profissionalizantes, construção de infraestrutura e pagamento de uma bolsa mensal de 50 reais, com a mediação da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), ajudou a desenvolver atividades que geram renda, como o turismo.
"Se esse apoio acaba, vou ter que voltar para a vida que tinha há dez anos, quando eu desmatava por causa da madeira", diz o morador Roberto Brito sobre o impacto do Fundo Amazônia.
[...]
https://www.dw.com/pt-br/sem-di%C3%A1logo-com-governo-ind%C3%ADgenas-buscam-apoio-internacional/a-49566854