É que, pelo pouco que sei da bíblia, Deus só fez pactos, alianças, tratados, acordos, unções, etc. com os seus escolhidos e crentes. Se deus disse que o tal príncipe era ungido, tenho a impressão de que ele teve alguma relação com Deus, a não ser que Deus o ungiu sem ele saber. Por isso é que me intriga essa questão da unção, fica muito vago isso, como deus ungiu alguém que com ele não teve nada? Mas como eu disse anteriormente, a bíblia está cheia de incongruências…
Por que ter sido "ungido" transformaria o Príncipe de Tiro no Diabo?
Eu não disse isso. Como eu já disse anteriormente, se Deus disse que ele foi ungido, é porque ele teve alguma relação com Deus, a princípio.
Bem, como eu disse, é linguagem poética...
Leia o começo do capítulo: "E veio a mim a palavra do SENHOR, dizendo".
Em algum tópico antigo eu escrevi sobre "inspiração divina"... Basicamente, a tal da "inspiração divina" funciona(va) assim: o cara está lá, na dele, quando lhe surge uma dúvida. A primeira coisa que ele faz é pedir ao divino que lhe traga a resposta. Depois do pedido dele, todos os pensamentos que lhe vêm são tidos por ele como respostas vindas da divindade.
Assim, o autor do livro em questão, em algum momento questionou a divindade sobre o tal príncipe. Ficou lá, orando e com seus rituais... Depois, colocou-se a pensar, e pensou em tudo aquilo que ali está escrito. Só, que o autor atribui os pensamentos que lhe vieram ao deus dele. Por isso, ele começa o capítulo dizendo: "E veio a mim a palavra do SENHOR, dizendo". Note que ele não diz nem que viu Deus, nem que ouviu vozes, nem outra alucinação...
Assim, tudo o que está escrito em tal capítulo é, antes de mais nada, o pensamento de um homem, que acredita ter vindo diretamente da divindade, sobre outro homem.
Depois, quase tudo ali é linguagem figurada: "entraram pelo caminho de Caim" não tem nada a ver com cruzar o caminho de Caim, e sim com ter sido subjugado pela mesma situação. Você tem que ter em mente que todas essas metáforas, toda essa linguagem figurada, que pode não fazer muito sentido na nossa época, fazia TODO O SENTIDO na época de quem as escreveu...
Dizer que o princípe de Tiro foi ungido não significa que um deus desceu e passou óleo na testa dele. Para aquele povo, "não cai uma folha de uma árvore sem que seja do conhecimento e da vontade de Deus". Destarte, dizer que o princípe de Tiro foi ungido significa que ele teve um trono, e, se "não cai uma folha de uma árvore sem que seja do conhecimento e da vontade de Deus", foi Deus quem permitiu que o príncipe tivesse o que teve. E, se Deus permitiu, Deus o ungiu: "Cara, Deus te deu um reino de presente e você fez merda com ele".
Sobre a questão do Éden, apareceu-me outra dúvida, no texto de Ezequiel, demonstra que o príncipe de Tiro esteve no Éden, mas o Éden não ficou proibido aos homens depois da expulsão de Adão e Eva?
Tô levando em conta uma questão mais bíblica do que histórica. Digo isso porque no contexto bíblico, caso o Éden estivesse proibido aos homens, isso seria uma contradição. É claro que historicamente o príncipe de Tiro pode ter passado por lá e esse foi o motico do escritor ter dito aquilo.
É linguagem figurada: "Você teve o paraíso e agora está no inferno".
Mais sobre isso abaixo na resposta à sua outra pergunta:
Agora mudando um pouco de assunto, Nightmare, pelo que eu vi, você é um dos poucos ateus/agnósticos/céticos, etc., que conheço virtualmente, e tem um grande conhecimento bíblico. Você teria alguma sugestão de livros, sites, etc. para entender melhor a bíblia?
Bem, a Bíblia é um livro muito bom se for considerado como literatura.
O grande problema da Bíblia é que, de um lado existem os fanáticos que a consideram um objeto sagrado, e, do outro, os que querem profanar o objeto sagrado. E a Bíblia é só monte de textos que nada tem a ver com essa história.
Não conheço um bom livro sobre entender melhor a Bíblia (pode existir, mas desconheço) exatamente pela dificuldade de se achar o meio termo: os que lêem a Bíblia pelo que ela é: cultura e literatura.
Então, recomendo que você leia a Bíblia não para atacá-la ou defendê-la, mas, apenas, pelo que ela é: literatura.
Para entender isso, considere a seguinte premissa: a Bíblia é uma coleção de textos de pessoas pertencentes a uma cultura que, inicialmente, está mudando do politeísmo para o monoteísmo (Antigo Testamento), e, depois, está aprendendo a ser monoteísta (Novo Testamento).
Então, leia a Bíblia tendo em mente que tudo o que está ali escrito não é o que necessariamente aconteceu, mas é o que os autores acham/estão dizendo que aconteceu.
Quando você ler que Deus dançou LaBamba num livro, e, no outro, ler que Deus não sabe dançar, isto não é necessariamente uma contradição, porque os textos não têm culpa da estupidez de quem os reuniu num mesmo livro e os assumiu como sendo de um mesmo autor, uma divindade.
Jesus é um personagem de um livro, e, mesmo que ele tenha existido, sua história, pelas leis da realidade que conhecemos, foi nitidamente ficcionada, ao menos em parte, seja voluntária ou involuntariamente. É literatura, e, na literatura, o personagem pode fazer o que o autor quiser.