A "eficiência" do sistema SUS:
Mais de 60% dos hospitais públicos estão sempre superlotados
Edição do dia 27/03/2014
Em 80% dos hospitais fiscalizados pelo Tribunal, faltam médicos e enfermeiros e quase a metade desses hospitais tem leitos fechados, exatamente pela falta de profissionais.
Pela primeira vez, uma auditoria feita nos hospitais públicos mostra o tamanho dos problemas enfrentados por milhares de brasileiros. Mais de 60% dos hospitais estão sempre superlotados. Faltam leitos e equipamentos, médicos. Os números retratam o caos da saúde.
O Ministério da Saúde reconheceu que há problemas e que tem investido em construir mais hospitais e levar mais médicos para as cidades. O relatório traz um retrato bem conhecido pelos pacientes da rede pública.
Os hospitais sempre cheios são uma reclamação recorrente entre os pacientes da rede pública de saúde. “Nunca tem vaga, ou não tem médico pra atender”, reclama uma mulher.
Uma fiscalização feita pelo Tribunal de Contas da União confirmou o problema. Os técnicos visitaram 116 hospitais e prontos-socorros do país. 64% estão sempre superlotados.
Os outros 36% também passam por essa situação, mas com menos frequência.
E quando os hospitais não estão cheios demais, os pacientes se deparam com outras dificuldades, como a falta de equipamentos. Dona Irene precisava fazer um exame para confirmar a suspeita de pneumonia. Procurou o posto de saúde, mas teve que fazer uma peregrinação por Brasília.
“Você procura o lugar mais próximo que seria a UPA, no meu caso era um raio-x, e vem para o hospital público, que não é para atender coisas assim”, diz Irene Pinto, aposentada.
O levantamento do TCU verificou que:
- 77% dos hospitais mantém leitos desativados porque não há equipamentos mínimos, como monitores e ventiladores pulmonares;
- em 45%, os equipamentos ficam sem uso porque faltam contratos de manutenção;
- 48% sofrem com deficiência de instrumentos e móveis básicos para prestação dos serviços.
Em 80% dos hospitais fiscalizados pelo Tribunal, faltam médicos e enfermeiros e quase a metade desses hospitais tem leitos fechados, exatamente pela falta de profissionais.
O Tribunal de Contas encaminhou o relatório ao Ministério da Saúde e vai continuar acompanhando a rede pública nos próximos anos.
“O que a gente quer é propiciar uma melhoria do nível de qualidade da discussão no Brasil, até então era achismo, subjetividade, todo mundo sabe que falta tudo. Agora a gente tem índices, parâmetros, indicadores. Esse era um déficit crônico no Brasil”, afirma Benjamin Zymler, ministro do TCU.
Já o Ministério da Saúde reconhece que há problemas principalmente na gestão dos hospitais. Diz que está investindo na formação de médicos e na melhora da oferta.
“O ministério está acompanhando com cuidado cada ponto desse, cada dificuldade sem particularizar as situações, mas a grosso modo enfrentando o problema estrutural, distribuindo melhor os hospitais, investindo em regiões desassistidas”, afirma Helvécio Magalhães, secretário de atenção à saúde.
O Ministério da Saúde disse ainda que 3,6 mil hospitais considerados de pequeno porte têm menos da metade dos leitos ocupados. E que vai fazer uma visita a esses hospitais para entender o motivo.
Saúde envolve dor, significa sofrimento, representa desespero e risco de morte.
É a isso que a população mais pobre está sendo submetida, enquanto governantes se tratam no Sírio Libanês e na rede particular, a si e a seus familiares.
Quero ver o filho de uma autoridade entrar na fila do SUS, como disse o jornalista Chico Pinheiro, ao fim da reportagem.
Ele ainda completou: as autoridades que permitem esse quadro dantesco deviam ser obrigadas a se tratar no SUS, na rede pública de saúde que eles oferecem aos outros, diga-se à população abandonada.
Como já disse, SUS não é hospital e hospitais é um dos maiores problemas do SUS. Esse problema dos hospitais tem a ver com o processo de criação do SUS (com o que foi herdado do INAMPS tanto em estrutura quanto em processo de construção de hospitais), deficiências de RH (faltam médicos e em especial em determinadas especialidades - e isso não se resolve apenas querendo, simplesmente porque não existe no mercado - e falta equipe técnica de enfermagem). Existe um outro problema que são os hospitais de pequeno porte. A população, a imprensa e os políticos vêem a Saúde e SUS como hospital, assim é um ganho político grande para o chefe local conseguir inaugurar um hospital em sua cidade. Isso aconteceu muito até bem pouco tempo atrás, através de emendas parlamentares, por exemplo. É uma série de hospitais que são hospitais apenas no nome: não possuem estrutura, escala de plantão completa, poucos leitos (menos de 50) e pouca demanda para o serviço. Construir um hospital é fácil, difícil é mantê-lo. É importante dizer que os recursos são finitos e devem ser racionalizados (tanto financeiro quanto de pessoal) e não pulverizados (o mais racional seria concentrar os investimentos em uma cidade pólo de uma região que tenha capacidade de absorver a demanda, porém qual político vai fechar seu hospital para investir no município vizinho?). Outro problema é a Atenção Básica desestruturada (e sem pessoal capacitado para atender na AB, que acaba replicando a lógica de um hospital em uma unidade básica) que não consegue atender a demanda, o que leva a buscar o hospital (grande parte do atendimento hospitalar é ambulatorial que não deveria estar sendo executada ali, o que drena os recursos de quem deveria estar realmente no hospital). Existe também a falta de um sistema de regulação eficiente (muitas vezes existem dois sistemas de regulação trabalhando ao mesmo tempo), uma definição de perfil dos hospitais e os leitos de retaguarda. E para consertar tudo isso não é fácil e nem rápido (sob o risco de piorar a situação, como já aconteceu antes). Não existe solução mágica e, sim, alguns lugares estão melhores que outros. Alguns melhoraram, outros pioraram, mas, no geral, está melhor que no início da implantação do SUS (mas poderia estar bem melhor).