Não são 200 milhões de pessoas sendo atendidas pela saúde pública.
Uma comparação mais significativa descontaria algumas eventuais políticas de saúde pública algo mais generalizada, e então se ateria só aos números das pessoas que tentam buscar atendimento nos hospitais do SUS.
Eu não tenho tido tempo para debates, por isso vou fazer apenas algumas colocações para que os colegas continuem o debate.
Este estudo inédito é inédito no sentido de ser mais um, mas o diagnóstico de que existe, também, um problema de gestão no SUS é algo bem antigo e conhecido entre os estudiosos e os próprios gestores do sistema.
200 milhões são usuários do SUS, ainda que na assistência não estejam 200 milhões.
Ocorre que o SUS não é apenas assitência (excetuando-se a farmacêutica), mas também promoção da saúde, prevenção (incluindo a imunização), vigilância em saúde (envolvendo vigilância epidemiológica, Ambiental e sanitária), assistência farmacêutica e pesquisa.
Assim, mesmo que um cidadão não faça uso da assistência, ele é beneficiário ao menos das demais ações de promoção, prevenção, vigilância e pesquisa. Mesmo que alguém diga, por exemplo, que não faz uso de imunobiológicos da rede pública, ele é beneficiado de uma imunização da população que é proporcionada pela rede pública. Além disso, medicamentos de alto custo normalmente acabam sendo fornecidos pelo SUS mesmo para aqueles que se dizem fora do sistema. Ainda soma-se a isso o sistema de urgência (tanto o pré-hospitalar, quanto o hospitalar), procedimentos de alta complexidade que muitas vezes, em muitos lugares, apenas o sus fornece e os hemocentros (que são em sua maioria públicos). Então, no final, toda a população é usuária do sistema, ainda que diga que não o seja. O recurso per capta de investimento na saúde pública envolve todas essas ações (que o privado não faz ou faz muito pouco, o que não é em si uma crítica, porque o objetivo e função são outros).
Para o que mais se apresenta e é a parte mais visível na discussão, aqui, o foco se concentra na assistência, então deveria ser considerado apenas os recursos destinados à assistência e a população sus-dependente, que varia de lugar para lugar (de em torno de 50% em São Paulo a 100% em outros municípios).
Já existem estudos sobre isso que podem ser encontrados na internet, mas pode-se fazer uma busca, pelo menos nos recursos federais destinados a estados e municípios, em fns.saude.gov.br , consultando apenas os recursos da média e alta complexidade e do faec (na assistência) e, nos municípios apenas, o piso da Atenção Básica variável, apenas nos componentes saúde da família e saúde bucal.
A questão da gestão é algo mais difícil de entender ou compreender. Já coloquei aqui, várias vezes, que a gestão do sus é descentralizada. Significa que se há um problema de gestão no estado do Rio de Janeiro que levou à perda de medicamentos ou colapso da rede hospitalar estadual do estado, isso foi uma má gestão do gestor estadual (e não do municipal e nem do federal, ainda que possa acaber tendo reflexos nesses). Se a rede municipal de Porto Alegre é muito deficiente, é por causa da gestão municipal. É claro que uma má gestão acaba refletindo em outros pontos da rede. Um município que tenha uma excelente gestão do sus pode apresentar vários gargalos porque necessita que o estado sirva de retaguarda para alguns procedimentos ou então de um outro município pólo, que também pode ser mal gerido.
Pode-se colocar que uma gestão privada seria mais eficiente e teria um serviço melhor. Pode até ser, mas não necessariamente. Muitos serviços do sus possuem já uma gestão privada, são paulo é quase todo com gestão privada, a central de medicamentos no Rio que teve medicamentos vencidos tinha gestão privada, além disso boa parte dos serviços de assistência são prestados por prestadores privados (como hospitais e clínicas conveniadas), dependendo do local e tipo de procedimento esses prestadores são quase a totalidade (e fonte de muitos problemas).
Veja bem, não estou colocando que tudo é uma maravilha e nem que não haja má gestão. Pelo contrário, estou dizendo que existem muitos problemas, mas a realidade muda de lugar para lugar e mesmo entre serviços, e, sim, a gestão é deficiente, mas não é homogênea e mais complexa do que aparenta.
Algum material para estudo:
http://www6.ensp.fiocruz.br/radis/conteudo/para-entender-o-subfinanciamento-do-sushttp://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142013000200003