Se viver sob os generais brasileiros era estar em uma ditamole , viver na URSS pós 1956 era estar em uma dita-aquosa...
E se formos considerar TODAS as liberdades e direitos civis dos indivíduos comuns (não envolvidos com política)? A URSS ainda assim seria igual ou melhor do que a ditadura militar brasileira?
Praticamente igual.
Dei uma olhada rápida na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm
Pretendo olhar com mais atenção outra oportunidade, mas assim de relance eu tenho a impressão que a URSS violava bem mais artigos do que a ditadura militar brasileira.
Mais importante do que quantos artigos eram violados ( e todas ditaduras os violam , por definição) é saber como são violados e , para nossa discussão , qual o risco para os opositores.
Como a discussão está se dando , a comparação entre as ditaduras é feita a partir das questões:
-Qual o risco para a integridade física da oposição ao regime ?
-Qual o risco de perseguição para o cidadão normal , não envolvido em política ? ( sua pergunta especificamente)
Para ambas as questões viver sob o regime soviético no mesmo período do regime militar brasileiro (1964-1985) era mais favorável , do ponto de vista político. É óbvio que se a comparação se dá com o periodo totalitário da URSS ( 1928-1953) a resposta é inversa.
Não atentar para o fato de que os regimes políticos ( exceto os de muita curta duração) se modificam com o passar do tempo e da mudança da conjuntura interna e externa leva a aberrações de comparar o período militar brasileiro com o regime estalinista e descobrir que o primeiro era melhor de viver...
Mesmo o regime militar brasileiro nos seus 21 anos atravessou fases , era menos arriscado ser oposição sob Castelo Branco e Figueiredo do que sob Médici e Geisel. E quanto ao regime soviético a liberdade relativa era maior sob Kruschev que sob Brejnev.
A título de exemplo vale ver como foi a repressão a maior ameça ao regime soviético , a Primavera de Praga em 1968. O país foi invadido e ocupado até 1991 , o governo de Dubcek deposto , todas as organizações independentes fechadas , seus dirigentes punidos e milhares de exilados (aproximadamente 300.000). O cômputo de fatalidades dá 108 tchecoeslovacos mortos em embates contra as tropas de ocupação e acidentes de trânsito contra 98 óbitos soviéticos (
Wikipédia).Mas não houve "desaparecidos" políticos ou presos "suicidados" cujas famílias recebiam ordem de não abrir o caixão durante o velório... Professores universitários afastados da cátedra tinha que sobreviver como faxineiros , o própio Dubcek foi libertado e viveu como guarda-florestal até o fim do regime , a pressão para isolamento social dos opositores era enorme mas a ameaça á integridade física não.
Haverá uma discussão circular por aqui enquanto não for aceito algumas coisas consensuais que no meu entender são:
a) Qualquer ditadura, seja ela de direita ou de esquerda, traz problemas para a população, desde as pequenas inconveniências até as grandes desgraças;
b) As ditaduras sul-americanas foram péssimas, mas se destacaram pela grande ferocidade a chilena, a argentina e algumas centro-americanas. O apoio do EUA foi ostensivo, juntamente com a ação de algumas grandes corporações, que não viam com "bons olhos" a plataforma anti-empresarial e estatizante dos movimentos esquerdistas.
c) As ditaduras comunistas foram, em média, muito mais ferozes, principalmente considerando o período stalinista na Europa e, a qualquer tempo fora daquele continente, em particular no Camboja, no Vietnã, na Coréia do Norte e em Cuba. O apoio da então URSS foi maciço, com o fornecimento de armas, dinheiro, treinamento e doutrinação.
d) O Brasil vivia um estado de direito pleno quando foi irrompido o golpe militar em primeiro de abril de 1964 (sim, o golpe mesmo teve início no Dia da Mentira), ainda que este estado possivelmente teria sido ameaçado caso a esquerda continuasse se reforçando. Sob o ponto de vista estritamente legal, quem efetivamente quebrou o estado de direito foram os militares.
e) Boa parte da esquerda brasileira (eu arrisco dizer a imensa maioria) procurava obter o poder pela via revolucionária pois desprezavam a democracia representativa, vista como um "modelo burguês". Então afirmar que eles eram "amantes da democracia" é uma insensatez. E durante a ditadura eles buscaram a redemocratização pela via burguesa porque não lhes restou outra alternativa.
f) O período de governo militar foi um retrocesso em praticamente tudo que representa as liberdades individuais, além de ter sido um período de intensa doutrinação e ideologização sob os auspícios da direita mais extrema com amplo apoio dos setores mais conservadores da ICAR. Neste período é que no currículo escolar foram incluídas excrescências como Educação Moral e Cívica, Organização Social Política Brasileira, Estudo dos Problemas Brasileiros e Ensino Religioso.
g) A ditadura militar de 1964-1985 permitiu o florescimento de uma cultura e de uma estrutura de corrupção em escala inacreditável, tanto na esquerda como na direita. Se o impacto na direita se fez sentir rapidamente com os 'Malufes' da vida, na esquerda ela permitiu uma gestação longa de indivíduos sedentos de poder e que, assim que puderam, colocaram todas as suas "garras" de fora como vimos (e estamos vendo) no atual cenário político.
Concordo ipsis literis com suas observações.
Só enfatizaria que o adjetivo maciço também se aplicaria ao apoio dos EUA aos regimes ditatoriais latino-americanos (principalmente chileno , uruguaio , argentino , nicaraguense e dominicano) , pois envolveu formação técnca de quadros locais e envio de profissionais americanos para estes países para a repressão à oposição.