Ótimo texto, Renato.
Eu entendo o que seria a filosofia e o que vocês estão falando, eu só continuo achando algo completamente descartável. Chamar qualquer reflexão sobre qualquer assunto de filosofia me parece completamente sem sentido.
Vocês poderiam simplesmente chamar de reflexão. Popper refletiu muito sobre o assunto e achou que a falseabilidade era bonita e sensual. Ponto.
Olha a frase do Giga:
Olhando a frase assim ela até parece ridiculamente óbvia mas é resultado de muito pensamento sobre o "problema filosófico da indução"
Poderia simplesmente ser dito "problema da indução". Fim. Pra que chamar qualquer raciocínio de filosófico? Em que ponto ele passou de um simples problema para um problema filosófico? Qual a linha entre os dois? O quanto de reflexão é dispensada neles? Refletiu por tempo X? Só um problema. Refletiu por tempo Y? Problema filosófico. ?
Isso que eu perguntei e ninguém me respondeu, exceto o Renato, que falou que qualquer reflexão sobre qualquer coisa é um questionamento filosófico, variando somente o fato de ser um pensamento filosófico bom ou ruim.
E isso só parece reforçar o ponto da arbitrariedade, pois como não existem regras, a minha reflexão do morango pode ser ruim para o Renato, mas boa para outra pessoa que por algum motivo concorde com ela, e no final dá na mesma, pois não se faz nada com isso.
Outra coisa ridícula é essas expressões "segundo a chirinforinfula de fulano, tal coisa é x". Tipo, who cares? Supondo que seja verdade, que diferença faz se segundo o tal do Popper, o criacionismo é científico? Magicamente poderemos provar deus? A evolução vai parar de acontecer?
É a típica expressão que a única resposta possível é "OK..." *seguindo com a vida*.
Funciona e não funciona de uma maneira tão arbitrária, Gaucho. Mas vamos por partes.
Não tome o que vou dizer como verdades absolutas porque não é algo que eu já tenha explicado previamente, então pode sair alguma coisa confusa nesse meio. Estejam os outros também abertos a discordar, afinal é esse todo o propósito.
Não é uma questão de qualquer raciocínio ser filosófico, mas é uma questão de reflexões serem filosóficas quando elas tratam de coisas que a filosofia abrange. O conceito de indução é um conceito inteiramente filosófico: você derivar de algumas premissas um conhecimento terceiro por raciocínio lógico. Quando o Giga fala em "problema filosófico da indução", não quer dizer que haja um problema científico com isso; mas que haja um problema nos princípios que regem esse conceito. A exemplo, que é quando surge a falseabilidade de Popper* -- e que me perdoem os foristas caso haja algum engano, já que faz bastante tempo que li sobre isso --, a aplicação da indução em meios científicos pode gerar falsas verdades. Isso é o que foi chamado de indutivismo ingênuo, porque, a princípio, o conceito de indução expressa retirar de premissas finitas, vistas sob uma ótica de amostras limitadas, regras gerais. Isso é problemático porque você pode, por exemplo, observar cientificamente que todos os objetos aceleram em queda livre a 10m/s e fazer disso uma regra; entretanto você não conferiu a queda livre em todos os lugares do universo pra ver se essa regra é válida mesmo.
Tendo isso em mente, veja que o problema não é um problema científico, mas um problema do próprio conceito quando aplicado a ciência. O problema é um problema filosófico, não científico; embora você tenha um reflexo na ciência. Digamos que você está tratando, quando reflete sobre isso, da estrutura lógica de um conceito, de como às coisas funcionam relacionadas a razão humana.
Agora, veja que aí a questão não é a quantidade de reflexão desprendida ou o tempo, mas a natureza da reflexão, que se volta pros próprios conceitos que originam o conhecimento humano. Ou no caso de um problema ético (que também é um problema filosófico), a reflexão estará se voltando sobre os próprios conceitos humanos de definição da ética. Ou um problema de filosofia política estará se voltando pra si mesmo quando analisam os próprios conceitos políticos, do que é política e dos conceitos que derivam disso.
Seguindo daí, a gente pode até considerar qualquer reflexão como uma reflexão filosófica, mas isso seria generalizar demais, já que você pode refletir sobre algo e não necessariamente criar conceitos novos, ou princípios. Isso porque (e dessa maneira temos que admitir) tudo tem a ver com linguagem e o ato de refletir pode ou não estar voltada para um pensamento filosófico. Você pode refletir sobre seu dia (e nesse caso reflexão tem o sentido de pensar sobre o seu dia, ou lembrar-se dele e fazer conjecturas sobre ele ter cumprido suas expectativas ou não, sendo bom ou ruim) e também pode refletir sobre o que é bom ou o que é ruim (o que seria algo como meditar sobre um conceito específico). Você consegue reparar na diferença entre refletir sobre um conceito e refletir sobre algo não-filosófico?
Então não é exatamente a reflexão que é filosófica, porque em geral a filosofia trata de problemas metafísicos, ontológicos, éticos, etc; mas a reflexão direcionadas à certos temas e com certos objetivos; no caso do Popper mirando o problema no conceito de indução aplicado à ciência ou você mirando a origem da vida pelo morango.
Agora, por último, você diz que a filosofia é arbitrária e isso é em partes verdade e em partes mentira. Digamos que um conhecimento filosófico não é algo fechado em si mesmo; mas sim como parte de um todo-conhecimento que não atingiremos nunca, mesmo levando em consideração que os conceitos se tornem cada vez mais complexos pra explicar coisas cada vez mais complexas.
Quando você fala que a sua reflexão pode ser ruim para mim mas boa para outra pessoa, está correto; porque o conhecimento não é fechado em si mesmo e sua reflexão abrirá portas pra outras reflexões, que por sua vez abrirão portas pra outras, criando novos e novos conceitos, tudo isso com a intenção explicar racionalmente coisas que ficam cada vez mais difíceis de serem explicadas. É por isso que se você estuda a história da filosofia ela se mostra quase que linear, sempre criando galhos para direções diferentes --- sempre de um pensamento simples para um pensamento complexo. Isso foi o que eu tentei exemplificar no outro post e que eu defendi mais anteriormente em outras postagens. E é por isso que o Aroldocbn disse "Por tanto filosofia é a "mãe" da ciência e do saber humano.". Outro caso de isso acontecendo foi Kant extendendo o problema proposto por Hume sobre a Causalidade e derivando daí a ideia de que não se pode descobrir a "coisa em si" através do que é empírico; ou Sartre invertendo a ideia de essência e colocando ela depois da existência.
E isso também tem a ver com o seu último post que citei, que "segundo a chirinforinfula de fulano, tal coisa é x", porque você pode interpretar conceitos diferentes de maneiras diferentes e obter resultados diferentes em sua reflexões, por isso é importante definir o que conceito x significa para filósofo y. Porque dialética não é a mesma coisa para Hegel do que foi para Platão e isso pode gerar confusão. E se eu estiver falando alho e entendendo bugalho a gente vai ficar patinando eternamente numa conversa de loucos.
*O livro que o FelipeRJ está indicando trata disso, é muito bom, também recomendo.
PS: Depois eu dou uma conferida no post pra ver se tem algum erro na lógica, porque agora estou meio ocupado; mas espero ter ajudado em alguma coisa.