O André Singer define o PT no poder como portador de um "reformismo fraco", ou seja, operou mais uma modernização conservadora, tão tradicional em nossa História.
O reformismo fraco caracteriza-se por ampliar direitos e garantias dos trabalhadores e dos "de baixo" sem mexer com os padrões básicos de funcionamento da sociedade. Aliás, muito pelo contrário, afinal, as concessões ocorrem em ordem de garantir a manutenção do modelo econômico e social.
Por isso soa-me tão estranho quando alguém pergunta sobre uma ameaça vinda do PT e, principalmente, vincula essa ameaça a medos atávicos da Guerra Fria (medo dos comunas). O neo-desenvolvimentismo do governo Dilma Rousseff, por exemplo, está longe, muito longe de qualquer coisa que se pareça com ameaça comunista.
Falaram, também, da corrupção. Citaram mensalão e compra de votos. Infelizmente, essas práticas são antigas e vinculam-se às caraterísticas do nosso sistema eleitoral e partidário. Robert Dahl chama a atenção para a necessidade do sistema eleitoral auxiliar a formação de maiorias parlamentares estáveis (vide "Sobre a Democracia"). No Brasil, nosso sistema eleitoral, com voto proporcional para o legislativo e sem cláusulas de barreira e/ou desempenho, vai na contramão dessa necessidade. O caos programático e a necessidade de um milhão de negociações (que viram negociatas) torna-se campo fértil para disfunções de todo o tipo - desde privilégios sem sentido à corrupção pura e simples.
Nesse sentido, tanto faz o PT, o PSDB, o Partido dos Aposentados do Brasil ou qualquer outro, pois o sistema vai tragá-los.
A ameaça é o sistema eleitoral e o caos partidário. Sem corrigir isso, não importa que "P" chegue ao poder, pois fará a mesma coisa - de modo menos visível ou de modo mais visível, mas fará a mesma coisa.
Não podemos esperar que as pessoas sejam diferentes ou melhores - as pessoas são falhas e se aproveitarão das falhas do sistema. Precisamos aprimorar o sistema - as regras e os instrumentos de controle. Assim, antes de pensar que a ameaça é Zé, a Maria, o João ou o clube da esquina, tente entender em que campo eles agem e identifique no campo de atuação os espaços para as disfunções e, principalmente, os espaços em que se pode cultivar os avanços. No nosso caso, uma reforma do sistema eleitoral seria um passo. Mudar a nomeação do Ministro Chefe da CGU, a nomeação dos ministros do TCU (e suas contrapartidas estaduais), criar uma comissão de ética externa do parlamento (federal e estaduais) seriam outros passos a ser feitos juntos ou mais adiante. Abolir as Câmaras de Vereadores de municípios muito pequenos e criar meios de participação direta da população nas decisões da administração municipal seria outra medida importante - aliás, as pequenas e médias prefeituras precisam de muita atenção, pois lá os controles sociais são ainda menores.
Assim, os que acham que o PT por si só é o mal encarnado, e não conseguem levar a discussão para além do moralismo tacanho é que são o verdadeiro risco ao país.