APODman,
Em primeiro lugar, eu não gostaria de me estender em comentários sobre as opiniões de Emmanuel e Edgard Armond. Emmanuel é considerado um espírito de certa elevação, mas os seus textos não são considerados isentos de erros. Já o livro Os Exilados da Capela eu nem considero uma literatura espírita válida, dada a tamanha quantidade de misticismo associado. Se você desacreditar Emmanuel, somente ele cairá em descrédito. Se você desacreditar Edgard Armond, também somente ele será desacreditado. Corta-se um galho ou mais e a árvore continua de pé. Como estamos interessados aqui em desacreditar a doutrina espírita, o alvo deve ser sempre Allan Kardec e sua obra, porque todas as outras lhe são de certa forma subordinadas. Desacredite Allan Kardec e a sua obra (principalmente a obra) e o edifício espírita desmorona. Portanto, vamos procurar nos ater a Allan Kardec para não estender demais a discussão. Vou fazer alguns comentários sobre o tema:
1. Em primeiro lugar é preciso levar em conta que a visão que Allan Kardec tinha da raça (cor) negra no século XIX é diferente da visão que temos hoje. Os negros que Kardec conheceu ou eram escravos ou eram passíveis de serem escravizados. Quase nenhum (ou nenhum) sequer já tinha emitido algum pensamento filosófico ou científico até a sua época. Mas o problema, ao contrário do que Kardec pensava, não estava associado à cor, e sim à raças ou povos. O que Kardec quis deixar bastante claro era a relação que os traços fisionômicos considerados selvagens poderiam ter com a inferioridade corporal, o que não tem nada a ver com a inferioridade pessoal (ou espiritual). Como Kardec só conhecia os negros que eram escravos, ele associou a sua idéia de inferioridade racial à cor negra. Mas, como sabemos hoje em dia, existem diversos elementos da raça negra que não têm traços considerados selvagens e que têm muita beleza e inteligência. Sinais dos tempos...
2. Ainda uma outra diferença da época de Kardec para a nossa é que na sua época não havia problemas em se emitir opiniões, baseadas em observações, sobre as diferenças entre as diversas raças. Será que seria imoral fazermos uma pesquisa a título comparativo sobre os desenvolvimentos que tiveram e fizeram as diversas raças ao longo da história e, principalmente no último século? Supondo ainda que fizéssemos tais pesquisas, será que seria imoral publicar os resultados apontando as diferenças nos mais variados campos do conhecimento humano? O resultado seria uma verdade, pois seria advindo de um estudo. Seria imoral falarmos a verdade, ainda que esta verdade apontasse diferenças gritantes entre as raças? Ainda que a sua opinião fosse equivocada, seria ainda imoral emiti-la acreditando-se ser a mais próxima que se concebe da verdade? Alguém pode ser considerado imoral por dizer ou intencionar dizer a verdade? A diferença de hoje para a época de Kardec é que hoje somos um pouco mais hipócritas. Ninguém mais fala aquilo que na realidade pensa a respeito porque hoje é considerado politicamente incorreto. Mas na intimidade do lar e da família sempre ouvimos piadas perjorativas relativamente a certas raças ou povos. Isso é racismo. E quase todos cometem.
O problema do nosso tempo é que é considerado um tabu falar-se sobre essas diferenças por causa das leis raciais que vigoram em nosso tempo. A meu ver é um exagero causado por melindres dos grupos que poderiam vir a ser considerados inferiores, ou ainda sentimento exagerado de pena e conseqüentemente de melindres dos grupos que poderiam ser considerados superiores num estudo aprofundado. Também há um certo receio sobre o tipo de uso que uma informação dessas poderia causar.
3. Quanto à questão dos traços fisionômicos isso também é uma questão praticamente unânime, embora ninguém fale a respeito por pudores. Se eu colocasse aqui no fórum uma foto de uma modelo e dissesse que seus traços eram selvagens, o que você pensaria? Que eu estou ironizando ou não? E se eu publicasse aqui uma foto de um aborígene australiano e igualmente dissesse que era um traço selvagem, o que pensaria? Que eu estou ironizando ou não? Em qual das duas opções eu teria mais chances de ser taxado de racista? Pense somente, não precisa responder, pois caso contrário, dependendo da resposta, ou dirão que você é racista ou hipócrita. O critério de beleza é uma questão de gosto pessoal. Kardec tinha o dele. Eu tenho o meu. Você tem o seu, etc... Mas fazendo-se uma pesquisa de opinião, será que poderíamos identificar um padrão de gostos? Ainda mais uma vez: seria imoral divulgar esses resultados se indicassem alguma tendência para determinado grupo?
Também a fealdade não é exclusividade só de elementos da raça negra. Há também certos povos que mesmo sendo brancos (loiros diria), são também muito feios de um modo geral. Entretanto, considerar brancos feios não é considerado racismo. Considerar certos negros é. Vai entender...
4. As opiniões que cada um tem das diferenças raciais não podem (ou pelo menos não deveriam) ser consideradas como racismo. Todos têm a sua opinião, embora todos hoje também não expressem. O que pode se constituir racismo é o uso que se faz dessas informações ou opiniões. Se as usarmos para humilhar e fechar oportunidades justas de concorrência para certas classes, eu concordo que seja racismo. Mas as mesmas informações podem ser utilizadas de forma construtiva, de forma a atacar as dificuldades identificadas que determinada raça ou classe possui. Não foi de um estudo desses que saiu a cota para negros nas universidades públicas? O medo que hoje se tem de opiniões desse tipo deve-se ao estado de inferioridade moral da nossa própria sociedade, que inconscientemente teme que determinadas diferenças sejam divulgadas e que delas sejam feitas um mau uso (como aliás já foi feito no passado). Esse temor desaparecerá com o tempo, quando as sociedades evoluírem mais um pouco.
5. E por fim um último aspecto sobre inferioridade ou superioridade: não podemos dizer que uma raça ou um povo é inferior, mas que está inferior, pois esta condição não é eterna, mas temporal. Com certeza podemos dizer que a raça negra estava em maiores condições de inferioridade na época de Kardec do que poderia estar hoje, apesar de todos os problemas que atualmente temos.
Concluindo, tanto as opiniões que Allan Kardec emitiu quanto às de Emmanuel e Edgard Armond citadas, não podem ser consideradas racismo. No máximo podem ser consideradas equivocadas. O uso que fazemos dessas informações é que caracterizarão ou não o racismo. Racismo seria se Kardec tivesse escrito, por exemplo: "Como chegamos à conclusão que determinada raça possui traços de inferioridade, então é inútil que se dêem-lhes oportunidades de concorrência num concurso público, ou que se os contrate para cargos de liderança, etc...". Ao contrário, ele escreveu que todos eram iguais perante Deus e que todos igualmente atingiriam a perfeição. Aqueles que se considerassem superiores deveriam usar dessa pretensa superioridade para ajudar os que estão na suposta inferioridade a se erguerem rumo a perfeição. Kardec nunca sugestionou fechar oportunidades de concorrência para ninguém por causa de supostos critérios de inferioridade. Só que a concorrência existe e os seus resultados sugerem conclusões que às vezes nos desagradam a visão. Trabalhemos então para eliminar essas diferenças ou pelo menos diminui-las a niveis insignificantes. O primeiro passo para resolver dificuldades é reconhecê-las para si mesmo. Reconhecendo nossos pontos fracos podemos melhor trabalhar para eliminá-los. Se o orgulho não falar mais alto, o objetivo será atingido algum dia e então alcançaremos a tão almejada igualdade.
Esse é um tema bastante difícil de se tratar e eu não estou isento de me equivocar no uso das palavras ou nas idéias. Se acontecer de alguma coisa que escrevi ser interpretada de maneira diversa, ou ainda se eu tiver emitido uma opinião equivocada e já contrariada por fatos, eu me corrijo mais tarde de acordo com as respostas. Aguardo as possíveis refutações ou desenvolvimentos do tema.
Um abraço.