Vemos pessoas desiludidas falarem de fé, como se tivessem autoridade para isto. E, mais curioso ainda: não se dão conta da leviandade em que incorrem e do patético de suas afirmações, como um especialista em entomologia a discorrer de modo cético sobre física quântica, ou um perito em matemática avançada atacar publicamente o valor de uma sinfonia de composição elaborada e excepcionalmente bela. Ninguém de sã consciência anuiria com tais atitudes, imediatamente compreendidas como insensatas. Mas por que, então, doutores em áreas variadas se julgam suficientemente aparatados e abalizados a discorrer com segurança fora do campo de seu domínio, como o ramo mais delicado e avançado do que poderíamos dizer, concomitantemente: filosofia e psicologia profundas, prenhe de elucubrações da mais elevada envergadura, como o setor das conjecturas atinentes à espiritualidade humana?
Seria por falta de base física para sua realidade? Não; porque existem regiões no cérebro já mapeadas para tais funções, conforme últimas descobertas das neurociências, como a orbi-frontal direita e a parietal esquerda. Por outro lado, ainda que não existissem tais regiões do arcabouço encefálico humano, reflitamos nesta analogia: alguém cogitaria seriamente da inexistência do amor por seus filhos, por não se poder localizar um setor específico da neurofisiologia cerebral para seu afeto?
Leviandade, estultícia, muito pouca profundidade nas colocações e, principalmente, a burrice suprema da presunção! – é isto que está por detrás do discurso materialista-ateu. Argumentos bobinhos, que até caem bem na boca de um colegial, como o de que a religião é instrumento de poder e manipulação de poderosos ou que constitui mero mecanismo escapista para o enfrentamento da dureza da morte soam tão rizíveis como o do sujeito que diz que não vai trabalhar para subsistir já que o dinheiro é sujo e é utilizado por “poderosos” para fins nefastos e conspiracionistas, ou como o de outro, rebelde biruta, que não deseja se manter informado e preparado, por julgar que a civilização não passa de uma criação compensatória e racionalizadora do universo animal da competição sexual entre seres humanos. E, então, por qual motivo, para os doutores tão pernósticos do negativismo, dinheiro e cultura são sempre bons, mas espiritualidade e fé constituem sempre uma ideologia enganadora? Ah-ah! Vou dizer uma obviedade típica também de colegiais: eles também são ideólogos, só que sua ideologia é mentirosa e hipócrita, porque mascara os demônios da arrogância e da imaturidade para enfrentar questões realmente complexas e de difícil oferta de respostas, que sempre prefere clichês prontos e fechados à dor moral da reflexão profunda e da busca contínua do “mais alto”.
Um universo complexo e cheio de congruências matemáticas, como as que a astrofísica revela… Uma biosfera rica em biodiversidade, sem nenhum motivo bio-evolutivo para tanto… Um intrincado cosmo humano de cultura e significados… Tudo isto tendo surgido do nada, por efeito do nada? Francamente, quem seria tão tolo para crer nisto? Ah… mas os fanfarrões da pseudo-inteligência (dever-se-ia dizer: proto-inteligência) do ateísmo não têm vergonha de apresentar suas dúvidas, conflitos e incertezas sobre o mundo humano como pretensa prova da não existência de Deus! É de pasmar! Que pouca inteligência! “Deus não pode existir, porque meu pai morreu. Eu orei e Ele não me atendeu!” Oh!!! Que rara compreensão do mundo! Ele nunca estranhou que milhares de pais de outras pessoas morressem todos os dias, mas só a morte do dele pode significar um evento cósmico! “Existem crianças inocentes morrendo de câncer, logo, Deus não pode existir!” Incrível! Se eu sou um ignorante em matemática e não entendo uma equação complexa desmonstrada por um catedrático, assevero, com firmeza, que não só a equação como o catedrático não existem… O que está implicado nesta inferência? Isto mesmo: uma presunção delirante, que leva o indivíduo a denegar o óbvio!…
Quem não tem fé e vive com raiva do mundo, frustrado, explodindo de inveja e espumando de angústia, por não entender injustiças e se sentir um pobre coitado, qual a minha impressão? Está vivendo (seria melhor dizer existindo) concorde a escolha que fez. Quer se sentir especial, muito além do que é, e paga um preço alto demais para um chimpanzé julgar compensatório. Mas este alguém quer, mesmo sofrendo muito, ser fiel ao seu desatino? Então, sofra, pelo tempo que precisar. É uma personalidade limitada na maturidade psicológica, narcísica e inapta a processar questões amargas, que prefere abdicar de compreender, para não que não seja afetada a imagem de excelência e imponência que criou de si mesmo. Quer, por fim, um mundo de ausência de responsabilidades profundas e de muita inconseqüência.
Enquanto isto, alguns se impregnam – e abundam em torno deles – as bênçãos do Céu, não porque sejam especiais, mas porque fizeram por merecer, por esforços intransferivelmente pessoais. Um dia, porém, assim como as crianças ficam adultas, os céticos e ateus serão convictos da realidade inconteste da espiritualidade, assim como hoje ninguém discute a existência de microorganismos, que foi motivo de escárnio e ataques tremendos a Pasteur, por parte da própria comunidade científica de seu tempo. A História e a Evolução têm uma força irresistível, que solapa a teimosia dos pretensiosos como um trator o faz à grama seca de um campo perdido…