A1. A ciência fria não pode trazer felicidade e alívio psicológico aos seres humanos como a religião tem trazido ao longo do tempo.
R1.1. Não temos notícias de que "felicidade" ou "alívio psicológico", ou vários conceitos similares, possam ser mensuráveis como a taxa de mortalidade ou natalidade em determinado país, ou a taxa de alfabetização, ou a de desemprego;
R1.2. Não tendo notícias de que possam ser mensuráveis assim, não podemos dizer que religião traz mais "felicidade" que ciência, e nem o contrário;
R1.3. Podemos dizer, todavia, que a ciência traz mais benefícios materiais, palpáveis, visíveis, que a religião, através de coisas bastante mensuráveis, que podem ser traduzidas em conforto, inegável, como antibióticos, analgésicos, transplantes de órgãos, carros, computadores, aviões e toda uma lista de invenções e melhorias que facilitaram muito a vida das pessoas em alguns poucos séculos de "revolução científica";
R1.4. Justamente com a "revolução científica" do conforto, a religião parece ter entrado em declínio irrecuperável em poder e prestígio, pelo o menos no mundo ocidental. Se isso é consequência direta dos adventos científicos contemporâneos, é possível, mas não podemos dizer que é cem por cento decorrente disso. A probabilidade, entretanto, é muito sugestiva de que o estabelecimento de uma era na qual as pessoas domaram a natureza e prolongaram suas vidas através de meios palpáveis, não metafísicos, é uma vitória das ciências sobre o dogmatismo religioso no que concerne a benefícios visíveis.
R1.5. É muito possível que "felicidade", conceito bastante abstrato e frequentemente eivado de solipsismo e relatividade, não possa ser definido meramente através de conforto material, pois esta seria uma redução. Mas devemos imaginar se o conforto material promovido pelas facilidades geradas pelo conhecimento racional científico contemporâneo, ainda que não seja o ápice conceitual a ser identificado cabalmente com a felicidade, possa ao menos facilitar que um grupo maior de pessoas, e não um punhado ou um recorte social de clérigos e crentes, estejam em pé de igualdade a buscarem a felicidade.
A2. A ciência pode ter causado esse "vazio" existencial do homem moderno, e pouco ou nada faz para contê-lo.
R2. Vazio como o de Kierkegaard, um religioso confrontado por uma era florescente de ciência? Não sabemos exatamente o que seria o "vazio" pessoal, tal como não sabemos exatamente como definir "felicidade", dado o subjetivismo inerente destes aspectos. A ciência ocupa-se de objetividade. A subjetividade pode, por vezes, ser avaliada objetivamente com interesses científicos, mas a subjetividade é pessoal e para coletivizá-la, ou coletivizar sua compreensão, é necessária a inteligibilidade objetiva dos seus preceitos ou assertivas. Ou seja, para coletivizar um aspecto subjetivo em sua compreensão, a subjetividade precisa ser "cientificada", objetivada.
Não temos notícia, infelizmente talvez, até hoje (vale para Sartre, Nietzsche, Schopenhauer, Heidegger e mais uma penca) de que alguém tenha conseguido com sucesso demonstrar o "vazio", útil e objetivamente, tal como está demonstrada pela física a fissão nuclear.
Logo, que "vazio" é este, o do homem moderno, que parece ser um vazio diferente em mim, outro em você e outro em sicrano, e que, sendo tantos, a religião pretende que seja apenas um ao dizer que a ciência o causou ou que não consegue detê-lo?