Preferência da FAB sempre foi por caças de origem norte-americanaLevantamento histórico mostra que a primeira opção sempre foi por caças de procedência dos EUAA Força Aérea Brasileira (FAB) busca atualmente renovar sua frota de aeronaves de combate de alta performance. Este processo, largamente conhecido com F-X2, nada mais é do que a versão mais atual de outras escolhas que o Ministério da Aeronáutica (atual Comando da Aeronáutica) fez ao longo de sua história.
A FAB é hoje uma instituição madura que se aproxima dos seus 70 anos e já passou por outros dois “F-X”, se assim podemos chamar os processos de escolha de caças que ocorreram no passado. Tanto no primeiro como no segundo houve preferência por caças de origem norte-americana. Porém, os motivos que levaram a estas preferências possuem características um pouco distintas e cada processo de escolha deve ser avaliado dentro do seu contexto histórico.
Quando a FAB foi criada ela agregou uma série de equipamentos de origens distintas que pertenciam tanto ao Exército (Aviação Militar) como à Marinha (Aviação Naval). Muitos historiadores citam que estas aeronaves eram obsoletas e tinham pouca validade para o conflito que batia às portas do Brasil (a II Guerra Mundial).
Na verdade eram equipamentos típicos de Forças Armadas modestas daquela época, como era o próprio Brasil. É injusto comparar também este “acervo” herdado com os modernos equipamentos fornecidos pelos EUA durante a guerra. Estes novos equipamentos foram fornecidos ao Brasil diante de uma situação especial e a FAB beneficiou-se disso.
Quando a guerra acabou, o suprimento de equipamentos modernos a preços simbólicos (programa “Lend Lease”) também foi perdendo força. Por outro lado, a aviação de combate continuou evoluindo de forma espantosa no exterior.
O primeiro “F-X” da FABAssim, por volta de 1952, a FAB entendeu que era chegada a hora de atualizar sua frota, substituindo seus caças a hélice por caças a jato. Naturalmente, como havia ocorrido nos anos anteriores, os Estados Unidos foram procurados de imediato.
O interesse inicial era pelo caça F-86 Sabre, produzido pela North American, que fazia sucesso nos céus coreanos frente aos MiG-15. Pilotos brasileiros já haviam voado este avião quando visitaram alguns esquadrões da USAF nos Estados Unidos. Também foram voados os F-84 Thunderjet e os F-80 Shooting Star, considerados inferiores ao F-86 pelos pilotos da FAB.
Houve uma primeira solicitação junto às autoridades norte-americanas para o fornecimento de um lote de caças F-86. No entanto, o Departamento de Guerra Americano não pretendia fornecer esta moderna aeronave para nenhum país latino-americano. Nova investida foi feita diretamente ao Departamento de Estado dos EUA para a liberação do Sabre. A resposta negativa foi acompanhada do oferecimento de caças F-80 usados, o que foi recusado pela FAB.
A Brasil continuou insistindo e os EUA forneciam as mais variadas desculpas, como o preço de venda inflacionado pela grande procura do Sabre no mercado internacional. Grande parte da obstrução da venda vinha do Congresso norte-americano, que se negava a transferir material militar tecnologicamente avançado para nações ao sul do Rio Grande.
A FAB não podia mais esperar. Os P-40 e P-47D estavam próximos da obsolência e era urgente substituí-los. Com a negativa dos EUA, o Brasil deixou de lado sua preferência inicial e passou a procurar um caça de outra procedência. Em uma negociação que
foi considerada o primeiro “offset” da FAB, o Brasil acertou com a Grã-Bretanha a troca de algodão por caças Gloster Meteor.
O Meteor não era exatamente a aeronave mais desejada pela FAB mas, diante da situação, foi aquela que melhor preenchia as necessidades da força (também a um custo de aquisição inferior ao dos modelos norte-americanos). Em outubro de 1953 voou no Brasil o primeiro dos 61 Meteor que a FAB operou.
O segundo “F-X” da FABAnos mais tarte, a frota de Meteor passou a apresentar fissuras e rachaduras em partes estruturais sensíveis como as longarinas das asas. Em função destes problemas, os Meteor passaram a voar com severas restrições a partir de 1966, somente 12 anos após sua aquisição.
A FAB começou a estudar um substituto para seus caças de primeira linha. Mais uma vez, o Brasil voltou-se aos EUA, com quem tinha tratados de cooperação militar. O desejo da Força Aérea era adquirir jatos Phantom II, mas a realidade exigia um pouco mais de modéstia. Foi então encaminhado um pedido de compra para caças Northrop F-5A, que atendiam plenamente aos requisitos operacionais da FAB.
Os norte-americanos, num primeiro momento, negaram-se a fornecer o F-5 e responderam com um lote adicional de F-80 usados. Diante da negativa, a FAB foi até o Canadá atrás de uma solução bastante interessante. A compra de um determinado lote de caças CF-5 de fabricação local. Esta compra foi, inclusive, veiculada pela imprensa nacional em 1967, dando como certa a vinda destes caças no ano seguinte. Mas a venda de tais aeronaves foi vetada pelos norte-americanos, cujo acordo de fabricação com os canadenses vinculava qualquer repasse a uma consulta prévia do Governo dos EUA. Como solução “tampão”, treinadores T-33 usados dos estoques da USAF foram recebidos pela FAB.
Estava claro, mais uma vez, que a FAB não teria os caças que queria. Como ocorreu no caso da substituição dos P-47D e P-40, buscou-se uma solução na Europa. A FAB passou a se concentrar nas seguintes possibilidades: Saab 35 Draken (Suécia), BAC Lightning (Grã Bretanha), Lockheed/Aeritalia F-104G (Itália) e Dassault Mirage III (França). Ao mesmo tempo, o que em meados dos anos 60 era uma simples substituição dos Meteor amadureceu como uma uma decisão mais complexa, vinculada à organização de um Sistema de Defesa Aérea, o que exigia caças também mais complexos.
A formalização da aquisição dos Mirage III ocorreu em 1970, num pacote que também incluía toda essa nova filosofia de Defesa Aérea, com computadores e radares de última geração para controle do espaço aéreo brasileiro (tráfego civil e militar). Na época foi noticiado que o preço unitário do Mirage III era de cerca de 1,2 milhão de dólares.
Deve-se destacar que outros países latino-americanos procuraram os EUA com o mesmo propósito de comprar caças supersônicos e não obtiveram respostas positivas. Por este motivo, entre 1968 e 1972, Peru, Colômbia e Argentina compraram caças da Dassault. Ficava claro que os EUA estavam apenas perdendo clientes e não evitando aquilo que eles mais temiam, uma corrida armamentista na região.
A posição dos EUA foi revista e, em 1972, a Venezuela seria a primeira nação da América do Sul a adquirir caças CF-5A produzidos no Canadá (os mesmos que a FAB tanto queria na metade da década anterior).
Após a confirmação da aquisição dos Mirage III para interceptação e defesa aérea, que nos planos da força poderia ser acrescida de novos lotes da mesma aeronave, a FAB passou também a cogitar uma solução mais barata para o recompletamento da frota, com um caça tático de emprego múltiplo. O F-5A ainda era uma possibilidade ventilada pelo Ministério da Aeronáutica, facilitada pela mudança de posição dos EUA.
Acontece que em agosto de 1972 voou pela primeira vez o F-5E Tiger II, um caça derivado do ‘Freedom Fighter’, porém muito mais capaz. Era exatamente a aeronave que a FAB desejava na categoria de caça tático. A compra foi facilitada por uma decisão política ocorrida em 1973, quando Richard Nixon (presidente dos EUA) aprovou uma nova política de venda de armas menos restritiva aos países sul-americanos.
O resto da história é bastante conhecido: a FAB acabou adquirindo 36 F-5E ao custo médio unitário de 2,3 milhões de dólares (valores de meados dos anos 70), além de outros seis F-5B.
A concorrência atualHoje, mais uma vez, a FAB está diante de uma decisão que vai definir o futuro avião de caça. O atual programa F-X/F-X2 pode ser chamado de o “terceiro F-X” da história da FAB. Porém, a situação política é completamente diferente. As outras duas escolhas foram feitas durante um período da história chamado “Guerra Fria”. O contexto mudou, abrindo possibilidades jamais sonhadas há 20 anos. Tanto é verdade que dois caças de origem russa participaram da primeira fase do programa.
Pode-se dizer até que os EUA ofereceram o que há de mais moderno em seu inventário, dentro daquilo que pode ser colocado à venda (o F-22 não é oferecido a nenhum outro país e o F-35 foi esnobado pelo próprio ministro Jobim), e conforme o que foi solicitado pela FAB.
Além da versão mais moderna do F-16, que concorreu na primeira etapa do processo, os americanos também ofereceram o F/A-18E Super Hornet, que continua na briga. Deve-se destacar que esta é a mesma aeronave que a Austrália, aliada de longa data dos EUA e que operou os caças F-86 (este foi até fabricado localmente) e Phantom II tão almejados pela FAB, adquiriu recentemente e está recebendo no momento, como substituto de seus F-111 (considerando-se também os atrasos no F-35, programa que tem a Austrália como país parceiro).
A questão política que impedia o fornecimento de material militar moderno para o Brasil foi deixada de lado nesta nova ordem mundial. O problema é que, desta vez, praticamente tudo o que há de melhor no campo da aviação de caça no mundo (excluindo o Boeing F-15E e o citado F-22) foi oferecido ao Brasil. No entanto, é interessante notar que os norte-americanos não contam com a preferência de antigamente da FAB. Pelo menos, não oficialmente.
FOTOS: USN/USAF/MUSAL
http://www.aereo.jor.br/2010/04/12/preferencia-da-fab-sempre-foi-por-cacas-de-origem-norte-americana-2/