São tomé, estás deixando de fora uma das coisas mais essenciais para se compreender a evolução: a seleção natural. A seleção não aleatória de mudanças aleatórias. Coisas como "Daqui alguns milhõs de anos esta bactéria foi tomando forma de uma outra coisa esquisita, com órgão mais complexos até chegar a ser um peixe" podem facilmente se tornar variações de uma teleologia. Reconheço que é fácil pensarmos em uma mudança crescente para o mais complexo com uma escala que denota propósito. Mas não é nem um pouco difícil avançarmos nesta questão. Os livros recomendados, até aqui, dão conta do recado fácil, fácil (ou nem tanto, se não estamos dispostos a reavaliar sinceramente nossas convicções). A crescente complexidade é contingente. Não proposital. Um ser unicelular de modo algum tem uma evolução garantida até se tornar, em poucas centenas de milhões de anos, em um ornitorrinco. É necessário que se entenda a Evolução como uma Deriva Natural, termo utilizado por Maturana e Varela, e muito mais adequado para se referir àquela. O que existe é uma deriva. E o que garantir uma melhor chance estatística para o ser em questão, prevalece.
E perceba que é muito mais sutil que isso. Como a deriva é contingente, várias estruturas podem se desenvolver sem propósito algum, se não atrapalhar outras coisas. E podem, elas mesmas, vir a se tornarem algo determinante no futuro: seja para o fim da espécie, seja para seu maior sucesso de subsistência. Evolução é fascinante, ao constatarmos como é elegante e sutil, ao mesmo tempo em que não é contrariada por uma única evidência. Certamente existem ausências, mas, não contra-evidências. Isto é simplesmente lindo. De todos os milhares, provavelmente milhões, de exemplares fósseis que possuímos, não existe um único que coloque a teoria em xeque. Jamais foi encontrado um único fóssil de mamífero no estrato pré-cambriano. E quando chegamos na biologia molecular, chegamos no estado da arte. A filogenia é mapeada diretamente pelo grau de parentesco genético, e os gráficos apresentados mais acima denotam a beleza que é a teia evolutiva. Não são gráficos conjecturais: são dados obtidos diretamente do grau de parentesco genético! Tudo isso é fascinante e sem paralelos. É uma enorme pena que os conceitos mais fundamentais da evolução sejam tão desconhecidos por tanta gente. E é uma pena maior ainda saber que, em muitos destes casos, é porque existe uma doutrina dogmática propalada por vias cultural-familiares que desmotiva a busca sincera por respostas, contentando-se com o doxa passivo, com a muleta confortável.