Autor Tópico: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência  (Lida 133235 vezes)

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Offline Buckaroo Banzai

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #75 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 00:56:40 »
Bem, ninguém poderia projetar a característica de "experimentar qualia". Não sabemos como fazer isso. Nem se alguém fosse algo próximo de um demônio de Laplace, dotado de todo conhecimento de física e neurologia que se tem, e ter poder até para criar um cérebro como o nosso num passe de mágica. Esse demônio poderia apenas recriar o nosso cérebro, que sabe-se ter consciência, e só isso. Não saberia como criar um PC consciente ou um corvo consciente (supondo que não sejam). Com todo conhecimento que se têm de física e neurologia e sua capacidade "onipotente" de cálculo, o demônio de Laplace está no mesmo pé que a gente nesse assunto.
Francamente, há um bocado de incoerências e exageros desejosos aqui, mas ater-me-ei ao "pé de igualdade entre o demônio de Laplace e nós". Não há a menor possibilidade dessa comparação visto que o demônio de Laplace não poderia ter consciência, justamente porque não poderia se iludir (se enganar). A consciência é contruída de ilusão, isto é, de distorções e enganos em relação à realidade. Por isso ela é fundamentalmente linguística. E esta é uma das razões pelas quais o demônio de Laplace é um modelo de impossibilidade de existência de deuses porque o que é perfeitamente cognitivo não pode ter desejos, ilusões, consciência. Tal "mente" não pode existir.

O demônio de Laplace e sua "viabilidade" nunca entraram em questão, ele serve só para ilustrar/enfatizar que, sabendo tudo que sabemos, e tendo uma capacidade de previsão muito maior do que temos, não teríamos como saber fazer algo que tivesse consciência, a não ser nos baseando no nosso próprio cérebro e mudando detalhes que se julgue serem menores. É diferente de uma questão como a estrutura necessária para se construir a maior torre do mundo, fusão a frio, ou criar um wormhole. Todas essas questões são puramente físicas, ou, lidando com partes muito mais táteis da física, diferentemente de qualia, que não é como nada que conhecemos.

Offline Cientista

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #76 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 01:24:58 »
Se foram mencionados, aqui, os 'bullshits filosóficos', posso dizer que essa besteira de qualia é um dos maiores bullshits filosóficos já criados. A argumentação para defendê-los é tipicamente crente. Quem acredita não consegue conceber como alguém "racional" não "vê" que eles (qualia, deuses, espíritos e demais artefatos mentais mágicos) "existem" e que são um "sério problema a ser resolvido" (normalmente, para o crente, "a ciência" não é *nem será capaz* de resolvê-los) pois o universo, a realidade, a vida não fazem sentido se eles não existirem. E quem é racional-científico não consegue entender como alguém pode se deixar levar por essas tolices fantasiosas.


Vamos a alguns prolegômenos que acho necessários para ajudar na "digestão" do que quero apresentar, que é a demonstração de que, em síntese, é exatamente a linguagem, em qualquer nível ou estruturação, a geradora de toda e qualquer sensação de subjetividade. Não sei se conseguirei apresentar um remate de uma só vez (vou tentar) mas, no correr do debate, poderemos chegar lá. Logo em seguida, apresentarei justificações físicas, bem objetivas e práticas para fundamentar o que exponho a seguir.

Eu já falei, algures aqui neste forum, que o problema todo da ilusão é que ela não pode ser percebida diretamente pelo iludido. Essa é toda a questão que fundamenta o cerne de debates como esse. É o fulcro do problema. Mas pode, sem dúvida, ser percebida indiretamente. Tentemos isso.

O "problema *difícil*" (por favor, traduzamos o hard do hard problem assim) da consciência não existe pois que é, simplesmente, *a* ilusão. Veja, não é, simplesmente, "uma" ilusão. É a própria, em "pessoa". A ilusão é a essência da consciência; é a própria "substância" de que a consciência, o "eu", é feito. É por isso que não é possível percebê-la diretamente pois tal seria equivalente a um tipo de suicídio quase arquetipicamente equiparável ao da mitológica Medusa olhando-se no espelho.

Toda ilusão é criada linguisticamente. A linguagem é a única maneira pela qual um sistema cognitivo pode distorcer a realidade porque a linguagem estrutura-se por representações simbólicas da realidade e, também (e aqui está o problema), por representações simbólicas das representações simbólicas*.

*Acho que a proposta do Gilberto passa por aí.

Subjetividade implica em individualidade *filosófica*. Esta individualidade é diferente daquela competitiva darwiniana, do tipo que você postou naquele tópico, Adriano, Seja individualista... Individualidade filosófica, no sentido estrito da subjetividade, implica em solipsismo, num discurso 'autólogo', que seria, mais ou menos: O "vermelho" do vermelho é meu e ninguém tasca! Ninguém jamais saberá como eu o vejo! É meu! É meu! Fique você com o seu vermelho! Isto é, se você existir mesmo. Tenho grande propensão a achar que você é meu também...

Aliás, diga-se de passagem, que o que sempre acho intrigante mesmo é porque é, justamente, o vermelho a cor normalmente evocada para a finalidade desse tipo de argumentação.

Vou atacar o problema e tentar mostrar que não faz sentido algum acreditar nesta suposta "realidade" da subjetividade pelo viés da problemática subjetiva das cores.


A pergunta não é por que nós vemos assim; a pergunta é o que você esperaria ver se não fosse assim. No processo evolutivo, o sistema óptico-cerebral (ou neuro-óptico..., não estou certo de qual seria o termo mais adequado) "teve que encontrar" alternativas para além das percepções de luminância (gradações de cinza) para enriquecer, de alguma forma, a eficiência competitiva. Então, o sistema visual evoluiu para a percepção de outro tipo de *gradações* (porque é o que a percepção de cores é; nada qualitativo mas gradativo) -- cores (ou, mais apropriadamente, matizes) variando gradualmente. Só isso, o reconhecimento de que todo um aparato físico visual totalmente específico para a percepção de cromaticidades teve que evoluir na fisiologia neurológica e visual, sem o qual nenhuma "subjetividade colorida" poderia ter lugar já é suficiente para demonstrar a natureza física dessa subjetividade.

Também, não há qualquer motivo para concluirmos que, já que foi um processo evolutivo cujo resultado estrutural (portanto, herdado por todos os descendentes normais) que delineou o aparato visual de cromaticidades, uns enxerguem algo diferente dos outros. E os distúrbios de percepção cromática, que até devem reforçar essa concepção que acabo de apresentar, também devem determinar perceções idênticas em cada um dos portadores de cada tipo de distúrbio. Assim, qualquer variedade de dicrômatas e acrômatas, daltônicos, tritanópicos, etc. devem ter, em cada grupo específico, as mesmas percepções visuais, ainda que consideradas subjetivamente.

Mas vamos um pouco além. Basta uma simples 'olhada' atenta no diagrama CIE para entender isso (e alguns livros o apresentam em preto e branco). A distinção "qualitativa" (não é subjetiva, esta, pois são duas propriedades físicas totalmente diferentes da luz que são distinguidas) nesta visão mais complexa desenvolvida evolutivamente não é entre cores variadas, entre vermelho, verde, azul ou qualquer outro matiz, mas, apenas, entre luminância e matizes. Os matizes interpenetram-se quando variam, *exatamente*, assim como tons de cinza (luminâncias variadas). Apenas, nunca demos nomes específicos para certas gradações distinguíveis de tons de cinza, a menos de claro ou escuro que pode gerar a tal "subjetividade" também. Poderíamos, assim, falar na "cinzicidão" (com um nome específico, claro) de um certo cinza em relação a outros e nos perguntarmos se todos vêem aquele cinza específico "da mesma forma" e se há subjetividade nisso. Não existe subjetividade em nada além da ilusão. Aliás, o cinza, normalmente, é considerado uma cor também, *qualitativamente* diferente de branco ou preto, que não são considerados, tecnicamente, cores. Na escala dos matizes (tons de cinza "coloridos") teríamos algo análogo aos limites preto e branco -- as transições vermelho/infravermelho e violeta/ultravioleta.


Poderá o iludido dedicado e insistente alegar que a ilusão não pode ser provada. De fato, talvez seja a única coisa (paradoxalmente) "provável" que não pode ser provada. Mas pode ser feito algo muito melhor que isso: a ilusão pode ser mostrada assim como tem sido inumeravelmente mostrada a inexistência de deuses e demais artefatos mágicos e, inutilmente, para quem insiste na decisão de acreditar. Todavia, como a consciência não existe, não existem decisões e escolhas; tudo é como tem que ser.


Por enquanto, e na pressa com o pouco tempo que tem me restado, é isso. Mas estou disposto a ir bem mais além nesse debate interessantíssimo. Respostas e questionamentos poderão me ajudar a alavancar e articular melhor as argumentações.

Offline Cientista

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #77 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 02:10:19 »
Bem, ninguém poderia projetar a característica de "experimentar qualia". Não sabemos como fazer isso. Nem se alguém fosse algo próximo de um demônio de Laplace, dotado de todo conhecimento de física e neurologia que se tem, e ter poder até para criar um cérebro como o nosso num passe de mágica. Esse demônio poderia apenas recriar o nosso cérebro, que sabe-se ter consciência, e só isso. Não saberia como criar um PC consciente ou um corvo consciente (supondo que não sejam). Com todo conhecimento que se têm de física e neurologia e sua capacidade "onipotente" de cálculo, o demônio de Laplace está no mesmo pé que a gente nesse assunto.
Francamente, há um bocado de incoerências e exageros desejosos aqui, mas ater-me-ei ao "pé de igualdade entre o demônio de Laplace e nós". Não há a menor possibilidade dessa comparação visto que o demônio de Laplace não poderia ter consciência, justamente porque não poderia se iludir (se enganar). A consciência é contruída de ilusão, isto é, de distorções e enganos em relação à realidade. Por isso ela é fundamentalmente linguística. E esta é uma das razões pelas quais o demônio de Laplace é um modelo de impossibilidade de existência de deuses porque o que é perfeitamente cognitivo não pode ter desejos, ilusões, consciência. Tal "mente" não pode existir.

O demônio de Laplace e sua "viabilidade" nunca entraram em questão, ele serve só para ilustrar/enfatizar que, sabendo tudo que sabemos, e tendo uma capacidade de previsão muito maior do que temos, não teríamos como saber fazer algo que tivesse consciência, a não ser nos baseando no nosso próprio cérebro e mudando detalhes que se julgue serem menores. É diferente de uma questão como a estrutura necessária para se construir a maior torre do mundo, fusão a frio, ou criar um wormhole. Todas essas questões são puramente físicas, ou, lidando com partes muito mais táteis da física, diferentemente de qualia, que não é como nada que conhecemos.
Pois eu vejo estas afirmações como mais uma torta de petição de princípio com raspas de ad ignorantiam (e eu não sou adepto dessas listas de falácias -- tenho usado-as porque percebo que são importantes para vocês).

E afirmo que há sim paradigmas construtivos de máquinas não necessariamente encefálicas (e há, entre nós, um forista, o Gilberto, que me apresentou uma proposta de modelo de consciência baseado em padrões de reconhecimento que pode, em princípio, ser emulado via software em sistemas computacionais padrão, harvard ou von Neumann, com algumas adaptações).

Claro que qualias não são algo que possamos conhecer ou que se pareça com algo que conheçamos pois são como deuses: não existem fora da imaginação.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #78 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 03:52:09 »
É um assunto tremendamente complicado e confuso.

A única maneira que concebo que a linguagem/inteligência pudesse criar a "ilusão de qualia" seria num hipotético zumbi filosófico, que se comportasse tal como se experienciasse qualia, sem que no entanto isso fosse real. Mas mesmo que isso seja verdade, ainda há o problema levantado pelo "chinese room experiment", o fato de poder haver algo que se comportasse dessa maneira não significa que seja o caso conosco. Então não precisamos negar o que parece tão óbvio, cuja hipótese de ser uma ilusão parece até um oxímoro. Dizer que qualia é uma ilusão corresponde a dizer que a experiência subjetiva que temos é uma ilusão que experienciamos subjetivamente.




Quanto ao "vermelho". A pergunta não é nem por que o vemos assim, nem porque se esperia que não fosse assim. É mais porque "é", em vez de ser como no fenômeno de visão cega. Ou por que não é como ouvir um "dó", como talvez seja com alguém com sinestesia.

O fato da evolução ter conduzido a diversas capacidades de processar informações ambientais também por si só não explica absolutamente nada. Zumbis filosóficos poderiam funcionar da mesma maneira (como se supõe que câmeras funcionem, por exemplo). E os qualia poderiam ser todos diferentes, trocados dentro da mesma categoria -- algo como a sinestesia, mas apenas "internamente" usando o mesmo "leque" de qualia daquele sentido, em vez de combinar qualia de mais sentidos (ainda que talvez fosse possível a troca entre leques completos de qualia, vai saber). A lacuna explanatória está ainda muito longe de poder ser preenchida.

O mais próximo disso seria adotar um conceito de qualia físico/epifenomenal. A luz dentro de dada faixa teria algo de "inerentemente" daquela cor na percepção animal por restrições ("constraints") físicas/neurológicas diversas, de forma que o estímulo provocado por uma dada freqüência só pudesse resultar em um dado qualia, tal como qualquer outra coisa fisicamente determinada, apenas não havendo nenhuma identificação conhecida disso.

Aí eu acho um tanto problemático o efeito de ilusões óticas, que já vi sendo colocadas como exemplo do porque não existe qualia.


O "verde" e o "azul" são a mesma cor.


O quadrado marrom no topo é da mesma cor do quadrado laranja na lateral sombreada.


O quadrado branco na sombra é da mesma cor do quadrado preto na luz.
 
Acho que esse tipo de coisa tende a apontar fora da direção de um qualia epifenomenal muito forte. Se uma dada freqüência de luz tivesse um quale/sua posição bem específica no espectro visual dos qualia bem fisicamente restrita, não é imediatamente óbvio que esse tipo de coisa fosse acontecer, que os qualia fossem ser trocados porque as cores estão próximas a outras. O mais natural seria esperar uma identificação correta, não esse efeito emergente. Ainda há espaço para "bugs" internos, e, até que se possa ter uma espécie de "VNC" da experiência de outra pessoa, não dá para ter bem certeza de como é o mundo por seus olhos.




Considero espantalhos tolos as equiparações com deuses e seres mágicos. Qualia, por mais incompreendido e talvez até incompreensível que seja, não tem implicitamente nada de mágico. Pode ser "só" algo muito estranho, como emaranhamento quântico, uma vez já chamado de "spooky action at a distance". Não que seja mesmo o caso. Como digo, não temos como saber. Ao menos não é nada bem estabelecido e consolidado para que se possa dizer com qualquer certeza. Pode muito bem ser tudo uma ilusão, vai saber. Seria interessante saber como demonstrar isso, que somos todos zumbis filosóficos na bizarra situação de termos a experiência subjetiva da ilusão da experiência subjetiva da realidade ao redor... quando na realidade não as teríamos... não sei se ambas ou só as últimas... se é que faz diferença... mas por hora, não se sabe, e se há uma posição realmente comparável a fé em deuses é a de declarar confiantemente uma certeza em qualquer lado, sem ter qualquer evidência.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #79 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 04:18:16 »
Bem, ninguém poderia projetar a característica de "experimentar qualia". Não sabemos como fazer isso. Nem se alguém fosse algo próximo de um demônio de Laplace, dotado de todo conhecimento de física e neurologia que se tem, e ter poder até para criar um cérebro como o nosso num passe de mágica. Esse demônio poderia apenas recriar o nosso cérebro, que sabe-se ter consciência, e só isso. Não saberia como criar um PC consciente ou um corvo consciente (supondo que não sejam). Com todo conhecimento que se têm de física e neurologia e sua capacidade "onipotente" de cálculo, o demônio de Laplace está no mesmo pé que a gente nesse assunto.
Francamente, há um bocado de incoerências e exageros desejosos aqui, mas ater-me-ei ao "pé de igualdade entre o demônio de Laplace e nós". Não há a menor possibilidade dessa comparação visto que o demônio de Laplace não poderia ter consciência, justamente porque não poderia se iludir (se enganar). A consciência é contruída de ilusão, isto é, de distorções e enganos em relação à realidade. Por isso ela é fundamentalmente linguística. E esta é uma das razões pelas quais o demônio de Laplace é um modelo de impossibilidade de existência de deuses porque o que é perfeitamente cognitivo não pode ter desejos, ilusões, consciência. Tal "mente" não pode existir.

O demônio de Laplace e sua "viabilidade" nunca entraram em questão, ele serve só para ilustrar/enfatizar que, sabendo tudo que sabemos, e tendo uma capacidade de previsão muito maior do que temos, não teríamos como saber fazer algo que tivesse consciência, a não ser nos baseando no nosso próprio cérebro e mudando detalhes que se julgue serem menores. É diferente de uma questão como a estrutura necessária para se construir a maior torre do mundo, fusão a frio, ou criar um wormhole. Todas essas questões são puramente físicas, ou, lidando com partes muito mais táteis da física, diferentemente de qualia, que não é como nada que conhecemos.
Pois eu vejo estas afirmações como mais uma torta de petição de princípio com raspas de ad ignorantiam (e eu não sou adepto dessas listas de falácias -- tenho usado-as porque percebo que são importantes para vocês).

E afirmo que há sim paradigmas construtivos de máquinas não necessariamente encefálicas (e há, entre nós, um forista, o Gilberto, que me apresentou uma proposta de modelo de consciência baseado em padrões de reconhecimento que pode, em princípio, ser emulado via software em sistemas computacionais padrão, harvard ou von Neumann, com algumas adaptações).

Claro que qualias não são algo que possamos conhecer ou que se pareça com algo que conheçamos pois são como deuses: não existem fora da imaginação.

Não fiz qualquer apelo a ignorância, mas uma admissão de ignorância; afirmei termos profunda ignorância sobre o problema.

A despeito de toda sua convicção, sem provas, não é nada bem consolidado, para qualquer lado. Até agora, ninguém fez uma traquitana, botou para funcionar, e provou, "olha só, isso aqui tem qualia, como a gente", ou "isso aqui prova que não existe qualia, nem nós temos, somos zumbis filosóficos", ou ainda, "temos qualia, mas só a metade do que pensávamos ter".

Talvez eu esteja subestimando o conhecimento que se tem sobre o que quer que seja pertinente, algo assim esteja mesmo prestes a ser feito. Mas não é exatamente uma peculiaridade minha supor que estejamos longe desse dia, ou ter sérias dúvidas sobre se esse dia irá chegar. Apenas comparar com qualquer coisa boba não demonstra nada além de arrogância, está longe de ser uma hipótese de um super-cara ou uma bobagem qualquer que se pudesse facilmente constatar não existir. Como você mesmo disse, uma "verdadeira" percepção/conhecimento disso seria meio como um suicídio. Meio que atingir o nirvana, sei lá. Perceber que a experiência é uma ilusão, então o "eu interior" desaparece, e a pessoa continua vivendo como zumbi filosófico sem que ninguém perceba qualquer diferença. Você mesmo provavelmente não supõe ter passado por isso e deixado essa esfera de ilusões de qualia, está aí só bradando conhecimento que não tem.

Offline Adriano

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #80 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 07:54:50 »
Memes não são "qualia coletivo", a menos que se redefina tanto "qualia" quanto "memes". No mínimo "qualia".

"Meme" é só um sinônimo para "cultura", apenas enfatizando seu aspecto não-monolítico, de como pode ser decomposta em partes que se segregam independentemente.

E a menos que o Ramachandran esteja correto em seu palpite, não há uma grande correlação entre qualia e cultura; os animais, humanos ou não, experienciam qualia através de seus sentidos, indepdendentemente de terem qualquer forma de cultura. Se Ramachandran estiver correto, bem, mesmo assim, imagino que ele não postule uma integração muito forte entre ambas as coisas, como que uma pessoa fosse daltônica até aprender os termos para todas as cores. Mas pode ser que pense isso mesmo, de qualquer forma, ainda que eu pense que é um bom exemplo de colocar a carroça na frente dos bois.
Percebe, que se tem algo mais polêmico ainda que qualia, este é o entendimento de cultura. Por cultura podemos inserir o próprio conhecimento científico, o conhecimento acadêmico e que tem grandes proporções de estruturação social. Até mesmo na mais bem aceita teoria epistemológica que temos, a concepção de um conhecimento objetivo que guia a humanidade, se desenvolve de forma semelhante a esta, onde os melhores modelos e de maior aplicação são os que vencem na academia. É o modelo interacionista e também evolucionista.


Estou curioso para ler e o mais interessante é que o conceito de **trol** é muito utilizado.
???????????????????????????!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Acho que você continua bem sensível às minhas provocações.
Não só as suas mas a de todos que participam e interagem neste ambiente. Porém as críticas de Jaron Lanier estão muito bem fundamentadas e com muita informação útil. Foi mais um conteúdo de alta importância que encontrei através da motivação intersubjetiva, digamos coletivista, da produtiva discussão que temos.

« Última modificação: 07 de Fevereiro de 2011, 08:10:21 por Adriano »
Princípio da descrença.        Nem o idealismo de Goswami e nem o relativismo de Vieira. Realismo monista.

Offline Adriano

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #81 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 08:06:49 »
O "problema *difícil*" (por favor, traduzamos o hard do hard problem assim) da consciência não existe pois que é, simplesmente, *a* ilusão. Veja, não é, simplesmente, "uma" ilusão. É a própria, em "pessoa". A ilusão é a essência da consciência; é a própria "substância" de que a consciência, o "eu", é feito. É por isso que não é possível percebê-la diretamente pois tal seria equivalente a um tipo de suicídio quase arquetipicamente equiparável ao da mitológica Medusa olhando-se no espelho.

Toda ilusão é criada linguisticamente. A linguagem é a única maneira pela qual um sistema cognitivo pode distorcer a realidade porque a linguagem estrutura-se por representações simbólicas da realidade e, também (e aqui está o problema), por representações simbólicas das representações simbólicas*.

*Acho que a proposta do Gilberto passa por aí.
Este é um ponto muito importante na filosofia de Dennett. Sobre a ordem de intencionalidade.
Citar
Em um sistema de segunda-ordem, é possível a ele atribuir-se crenças e desejos acerca de outras crenças e desejos, i.e., o sistema possui estados intencionais acerca dos estados intencionais de outro sistema. Temos, aqui, algo da forma x deseja que y creia que x está com  medo. Sendo o sistema de segunda-ordem, o idioma intencional é por duas vezes utilizado ( deseja, creia ). Enquanto complexidade, entre a primeira e a segunda-ordem há uma crucial diferença, marcada pelo possibilidade que tem o sistema de pensar acerca dos estados mentais de um terceiro. Podemos, agora, facilmente visualizar o que seria um sistema de terceira-ordem. x deseja que y creia que y deseja que ambos durmam seria um exemplo do grau de complexidade de tal sistema. Quanto mais vezes for usado o idioma intencional, portanto, mais complexo é o sistema. Em um sistema de quarta-ordem, surgirão quatro termos intencionais, em um de quinta, cinco, e assim por diante. Link

A complexidade da nossa discussão e da preponderância do qualia de "confusão" por parte de alguns, é justamente pela ordem de intencionalidade que tal assunto remete. Mesmo assim estamos nos referindo, como um tópico sério, e portanto a discussão da comunidade acadêmica. Ou seja para embasar o nosso entendimento sobre a consciência, buscamos em autores relevantes informações pertinentes que corroborem ou não nossos pontos.


Eu acho engraçado o Buckaroo utilizar o famoso e conhecido exemplo da consciência de um termostato, pois é mais uma refutação de Dennett para o memeplexo de qualia e toda a religião zumbi* que o acompanha:

Citar
Até aqui, temos uma consideração claramente instrumentalista, anti-realista, dos estados intencionais: eles não existem de fato, são apenas considerados tendo em vista determinado fim. Contudo, Dennett considera a necessidade de estados internos, o que adiciona um novo elemento à sua posição. Isto não significa que sua noção de estados internos seja idêntica a de um realista, ao contrário, ela reafirma uma forma de anti-realismo. Considere-se um termostato. Tal artefato pode ser designado a adequar a temperatura de um determinado recinto. Para tanto, ele possui uma determinada estrutura interna que o torna capaz de distinguir o quente do frio. Caso enriqueça-se o artefato, dotando-o de um aparelho visual e auditivo, sua estrutura interna será alterada, acompanhada por sua representação do mundo. O termostato poderá, agora, identificar a temperatura do recinto até mesmo pelas vestimentas ou conversas de quem nele se faz presente. Pode-se dizer, portanto, que, devido a uma alteração na estrutura interna do artefato, ele possui agora novas crenças, representações sobre o mundo. Para Dennett, estados internos não são algo de místico e misterioso, são, na verdade, estados estruturais de um sistema, determinando sua representação do mundo e seu comportamento. Mais complexo sejam estas estruturas internas, mais complexo o sistema. Reside aí a distinção entre artefatos, animais e homens: são sistemas com diferentes graus de complexidade interna, como afirma Dennett:

" There is no magic moment in the transition from a simple thermostat to a system that really has an internal representation of the world around it. The thermostat has a minimally demanding representation of the world, fancier robots have more demanding representations of the world. Finally you reach us " 9 ( Dennett, 1987:32). Link

*Searle demonstra bem esse sentimento na academia:

Citação de: A consciência vista de fora
De acordo com Searle, por sua vez, o livro "The Conscious Mind é um sintoma de um certo desespero nos estudos cognitivos atuais"(Searle, 1998, p.162).
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Offline Adriano

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #82 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 15:47:06 »
E a menos que o Ramachandran esteja correto em seu palpite, não há uma grande correlação entre qualia e cultura; os animais, humanos ou não, experienciam qualia através de seus sentidos, indepdendentemente de terem qualquer forma de cultura. Se Ramachandran estiver correto, bem, mesmo assim, imagino que ele não postule uma integração muito forte entre ambas as coisas, como que uma pessoa fosse daltônica até aprender os termos para todas as cores. Mas pode ser que pense isso mesmo, de qualquer forma, ainda que eu pense que é um bom exemplo de colocar a carroça na frente dos bois.
Pesquisando um pouco mais sobre Ramachandran, vejo que você se distanciou na sua interpretação deste autor, apenas conseguindo replicar a sua subjetividade memética de qualias Chalmerianos. Este deus (o meme qualia) da filosofia da mente.

Vejamos a verdadeira posição do descobridor dos neurônios-espelhos, algo que comprova a memeticidade da ficção acadêmica em questão:

Citar
Percebe-se então duas dimensões para que a aprendizagem por imitação ocorra: uma dimensão objetiva, fisiológica: o sistema de neurônios-espelho no cérebro humano e uma dimensão subjetiva: a dimensão cultural, disseminada e construída também a partir dos memes. Ramachandran (2006) aponta para a importância da cultura como característica essencial do ser humano :

Thanks to mirror neurons the human brain became specialized for culture, it became the organ of cultural diversity par excellence. […]To be culturally diverse is to be human and that's a good enough reason to celebrate […]One could, I suppose, simulate mirror neuron-like activity in the brain in the vat — even simulate "culture" in a culture medium. There is nothing that logically forbids this but it would be virtually
impossible in practice because of the contingent nature of culture; the fact that it depends crucially on the rapid spread of unique innovations, or "memes.


http://www.anpap.org.br/anais/2008/artigos/131.pdf


O próprio Chalmers comentando em seu livro sobre a sua crença:

Citação de: The Conscius Mind
It might still be objected: “But the belief would still have been formed even if the experience had been absent!”. To this, the answer is “so what?”. In this case, I have evidence for my belief, namely my immediate acquaintance with experience. In a different case, that evidence is absent. To note that in a different case the belief might have been formed in the
absence of the evidence is not to say that the evidence does not justify the belief in this case. I know I am conscious, and the knowledge is based solely on my immediate experience. To say that the experience makes no difference to my psychological functioning is not to say that the experience makes no difference to me.
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Offline Dr. Manhattan

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #83 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 18:18:19 »
.. Pode bem ser que computadores, calculadoras, e até relógios de corda ou termostatos sejam conscientes de alguma forma, em algum grau.

não, não podem.

E?

não existe possibilidade de computadores terem consciência, só quem não sabe como funciona um processador ou um programa de computador pode pensar assim.

Não sei nem onde começar refutar isso..

Deixa eu reformular seu argumento: "não existe possibilidade de redes neurais terem consciência, só quem não sabe como funciona um neurônio pode pensar assim. "

Seria esse seu argumento? Ou você acredita em almas? :)

Agora sério: antes de discutirmos se computadores podem ou não ser conscientes é preciso entendermos que diabos é o fenômeno
da consciência.

Vou lhe dar um exemplo: digamos que aeronaves mais pesadas que o ar ainda não tivessem sido inventadas.
Alguem poderia argumentar, usando seu conhecimento de fisiologia e aerodinâmica, que é impossível o homem voar como os pássaros.
E é mesmo: para que um humano, mesmo pequeno, pudesse voar batendo asas usando sua força muscular, as asas teriam que
ser tão grandes que isso tornaria humanamente impossível esse tipo de voo.

A questão é: o desafio não é o de voar como os pássaros, mas de alçar voo com uma máquina mais pesada que o ar.
Não estou com isso querendo dizer que reproduzir o fenômeno da consciência seja realmente possível em um futuro próximo usando
um computador. Mas que usar a tecnologia de computadores, tal como existe hoje, com as arquiteturas e o grau de integração
que existem hoje, para descartar a possibilidade de criação de uma inteligência indistinguível da de um humano é, no mínimo um raciocínio míope.

Agora vamos voltar ao problema da consciência.

Manhatan, você está enganado.

Eu não falei nada sobre no futuro isso ser possível ou não, simplesmente afirmei que hoje eles não tem consciência, isso é evidente, e sim tem como saber.


Na verdade, quem pensa que eles tem consciência o faz por simples crença. Não há nenhuma, repito, nenhuma evidência que demonstra que eles tenham consciência e mais ainda, não há sentido lógico na afirmação.

Ok, você refutou o argumento que não foi defendido por ninguém. Whatever.

You and I are all as much continuous with the physical universe as a wave is continuous with the ocean.

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #84 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 22:32:01 »
Há alguns anos eu teria reagido mais ou menos da mesma maneira a esse tipo de afirmação. O problema, suponho, é não entender bem o que é qualia, e como os processos dos quais quale parece emergir não são algo a partir do qual se pudesse inferir que isso fosse ocorrer a partir da observação externa/descrição, e conhecimento da mecânica envolvida (conhecimento atual). Não sabendo, não há como podermos afirmar seguramente que não é o caso em qualquer outra instância além do cérebro, quando isso ocorre no cérebro. Obviamente, também não podemos afirmar ser -- apenas podemos ser agnósticos, até que se tenha meios de verificar isso, ou até que ocorra uma reviravolta no desenvolvimento conceitual da coisa, uma tremenda sacada, e todos digam, "ah, então qualia é isso! Putz, que bobagem, quem imaginaria que era algo assim tão simples, agora é tão claro".

E realmente essa coisa toda de propriedade "nova" da física é algo que soa bastante estranho. Além de uma afirmação um tanto ousada, pode parecer implicar quase que numa espécie de "animismo" universal, o que não é a idéia; "consciência" nesses casos não seria o "eu interior", que seria uma talvez algo como um arranjo mais complexo de qualia, mas "apenas" algo que decorre de certos/quaisquer processos físicos sob a "perspectiva" de um dado sistema ou de suas partes pertinentes.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #85 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 22:33:32 »
Por que em todo texto que eu leio sobre isso alguém explica a questão de forma bem mais sucinta do que eu? Que saco. Acho que todos que escrevem sobre o assunto ficaram "esculpindo" exaustivamente uma descrição até ficarem bem afiados.

Offline Moro

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #86 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 22:51:10 »
(Aviso: ainda não terminei de ver o vídeo. A BBC bem que poderia ter feito a gentileza de quebrá-lo em partes)

Por falar em quebrar em partes:



É um apanhado interessante de coisas, mas um tanto desconexas. O problema é que "consciência" pode pelo menos uns dois ou três significados um pouco distintos. Pode ser como o cérebro processa as informações do mundo ao redor, guarda informações, faz decisões, e nisso há a ramificação do problema do livre-arbítrio...

Não sei porque, mas pessoalmente não sei que problema do livre-arbítrio é esse. Não vejo problema algum em sermos
guiados por cadeias de causas e efeitos. O que muitos não parecem perceber é que o fato de essas cadeias existirem
não implica de forma alguma que as respostas do cérebro humano sejam previsíveis. Elas podem muito bem ser caóticas
(no sentido de sensibilidade a condições iniciais) e extremamente complexas. Porque é tão fácil aceitar que o clima da Terra seja
regido por relações de causa e efeito, mas não a mente humana?


concordo 100%. não há problema algum com o livre-arbítrio a não ser um monte de pessoas querendo encontrar racionais toscos para dizer que não o temos.

OK, mas o que você acha do último experimento do vídeo em que a escolha (apertar o botão) acontece segundos depois de se "iluminar" a área do cérebro onde se processa a decisão? Quem está decidindo? Quem é que está enganando quem nessa estória?

Não sei se estou sendo simplista demais e não vendo coisas que você está vendo.  Isto só quer dizer que ele começou o processo de decisão alguns segundos antes de ter efetivamente apertado o botão.

De fato, não é tão simples assim. Abaixo parte do início do texto da Susan Blackmore que postei no tópico Même, Eu mesmo, Eu (../forum/topic=23040.0.html#msg529107). A ótica de Susan é a ótica da memética. O Buckaroo, Adriano e Dr. Manhattan discutem as perspectivas de Dennet e Chalmers dentre outros.

Suspenda seu braço à sua frente. A qualquer momento que você decidir, de sua livre e expontânea vontade, flexione seu pulso. Repita isto algumas vezes, estando certo de que você o faz tão conscientemente quanto puder. Você provavelmente irá experimentar algum tipo de processo de decisão no qual você deixa de não estar fazendo alguma coisa e então decide-se a agir. Agora, pergunte a si mesmo: o que deu início ao processo que conduz à ação? Foi você?

O neurocientista Benjamin Libet, da Universidade da Califórnia em São Francisco, recrutou voluntários para fazerem exatamente o que foi proposto acima. Um relógio permitiu aos voluntários perceberem em que momento exatamente eles decidiram agir, e ao colocar eletrodos em seus pulsos, Libet pôde avaliar o tempo exato do início da ação. Mais eletrodos em seus couros cabeludos puderam reportar um padrão particular de ondas cerebrais chamado de "potencial de reação", que ocorre prontamente antes de qualquer ação complexa e está associado com o planejamento cerebral dos próximos movimentos.

A descoberta controversa de Libet foi que a decisão de agir veio depois do potencial de reação. Parece que é como se não houvesse um "ser" consciente comandando as sinapses e dando início às ações.

Esta e outras pesquisas fizeram-me acreditar que a idéia do "ser" é uma ilusão.


Provavelmente não estão medindo todos os parâmetros corretamente. O cérebro é uma questão bem complexa.
Seguindo o processo científico, eles deveriam fazer alguma hipótese a partir desta constatação e checar se ela pode determinar/prever alguma reação que se desconhece.

Fico com a falta de mensuração correta.
“If an ideology is peaceful, we will see its extremists and literalists as the most peaceful people on earth, that's called common sense.”

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"To claim that someone is not motivated by what they say is motivating them, means you know what motivates them better than they do."

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #87 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 22:53:03 »
...
Ok, você refutou o argumento que não foi defendido por ninguém. Whatever.



você está enganado again..

O Buck aventou a possibilidade de uma calculadora ou computador ter consciência.
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Offline Moro

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #88 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 22:54:19 »
Há alguns anos eu teria reagido mais ou menos da mesma maneira a esse tipo de afirmação. O problema, suponho, é não entender bem o que é qualia, e como os processos dos quais quale parece emergir não são algo a partir do qual se pudesse inferir que isso fosse ocorrer a partir da observação externa/descrição, e conhecimento da mecânica envolvida (conhecimento atual). Não sabendo, não há como podermos afirmar seguramente que não é o caso em qualquer outra instância além do cérebro, quando isso ocorre no cérebro. Obviamente, também não podemos afirmar ser -- apenas podemos ser agnósticos, até que se tenha meios de verificar isso, ou até que ocorra uma reviravolta no desenvolvimento conceitual da coisa, uma tremenda sacada, e todos digam, "ah, então qualia é isso! Putz, que bobagem, quem imaginaria que era algo assim tão simples, agora é tão claro".

E realmente essa coisa toda de propriedade "nova" da física é algo que soa bastante estranho. Além de uma afirmação um tanto ousada, pode parecer implicar quase que numa espécie de "animismo" universal, o que não é a idéia; "consciência" nesses casos não seria o "eu interior", que seria uma talvez algo como um arranjo mais complexo de qualia, mas "apenas" algo que decorre de certos/quaisquer processos físicos sob a "perspectiva" de um dado sistema ou de suas partes pertinentes.

se for a respeito da consciência de equipamentos esse trololó todo, sim temos. Não existe nada disso. Groselha.
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Offline Adriano

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #89 Online: 07 de Fevereiro de 2011, 23:32:24 »
Por que em todo texto que eu leio sobre isso alguém explica a questão de forma bem mais sucinta do que eu? Que saco. Acho que todos que escrevem sobre o assunto ficaram "esculpindo" exaustivamente uma descrição até ficarem bem afiados.
Simplesmente por serem pessoas especializadas nestas funções, onde os indivíduos dedicam praticamente toda a sua existência para esta finalidade, pois é algo não voltado somente para nós, mas para toda a cultura e num contexto temporal, voltado não somente para o presente mas também para o futuro. Além da contextualização acadêmica, inseridos na estrutura de respeitadas universidades e todas as suas respectivas exigências para uma carreira de sucesso, não só do acadêmico como também da instituição.

Também tenho o mesmo "qualia" de melhor compreensão com os conteúdos informacionais acessados diretamente pela minha subjetividade, sem essa problemática de intersubjetividade e que Dennett classifica como heterofenomenologia.

Por mais que tentemos emular aqui algo sobre as discussões muito mais amplas e detalhadas do nível acadêmimo, jamais chegaremos perto, sempre ficaremos limitados pela nossa simples estrutura de um fórum de internet.

E eu vejo o mesmo erro acontecento no argumento de qualia, seja o evoluido com Chalmers ou com a fértil imaginação de Ned block. Tentam emular a dinâmica cultural que viabiliza o status quo de seus conhecimentos subjetivos e que embasam os seus experimentos mentais. Eu tenho uma infinidade de argumentos que gostaria de postar na tentativa de ser mais claro, que melhorei no meu aprofundado da temática. Mas vou compartilhar desta questão imaginativa sua, deste "meme" objetivado no tópico e lamentar a minha falta de sucesso na clareza explanatória destes conteúdos  :P
Princípio da descrença.        Nem o idealismo de Goswami e nem o relativismo de Vieira. Realismo monista.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #90 Online: 08 de Fevereiro de 2011, 01:19:03 »
Há alguns anos eu teria reagido mais ou menos da mesma maneira a esse tipo de afirmação. O problema, suponho, é não entender bem o que é qualia, e como os processos dos quais quale parece emergir não são algo a partir do qual se pudesse inferir que isso fosse ocorrer a partir da observação externa/descrição, e conhecimento da mecânica envolvida (conhecimento atual). Não sabendo, não há como podermos afirmar seguramente que não é o caso em qualquer outra instância além do cérebro, quando isso ocorre no cérebro. Obviamente, também não podemos afirmar ser -- apenas podemos ser agnósticos, até que se tenha meios de verificar isso, ou até que ocorra uma reviravolta no desenvolvimento conceitual da coisa, uma tremenda sacada, e todos digam, "ah, então qualia é isso! Putz, que bobagem, quem imaginaria que era algo assim tão simples, agora é tão claro".

E realmente essa coisa toda de propriedade "nova" da física é algo que soa bastante estranho. Além de uma afirmação um tanto ousada, pode parecer implicar quase que numa espécie de "animismo" universal, o que não é a idéia; "consciência" nesses casos não seria o "eu interior", que seria uma talvez algo como um arranjo mais complexo de qualia, mas "apenas" algo que decorre de certos/quaisquer processos físicos sob a "perspectiva" de um dado sistema ou de suas partes pertinentes.

se for a respeito da consciência de equipamentos esse trololó todo, sim temos. Não existe nada disso. Groselha.

Então você já sabe quais são não apenas os correlatos neurais da consciência, mas exatamente de quais processos emergem qualia. Fascinante. Se não for pedir muito, esclareça a nós e ao mundo, e se não for óbvio o bastante (temo que não será para todos nós), se aprofunde em como descobriu que apenas desses específicos processos físicos neurais podem emergir qualia, e não em qualquer outra situação.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #91 Online: 08 de Fevereiro de 2011, 01:47:09 »
Dúvidas sobre a experiência subjetiva como uma ilusão que experienciamos subjetivamente (...) devido a linguagem:

- Essa tentativa de eliminacionismo através da linguagem me pareceu ser mais uma hipótese de emergência do que de inexistência/ilusão. Não é uma ilusão de experienciar subjetivamente já uma experiência subjetiva, que portanto existe?

- se a linguagem possibilita isso (chame-se de emergência ou ilusão), seria possível também "engabelar" alguém, ou que alguém ficasse "confuso" com a sua linguagem a ponto que essa pessoa "tivesse a ilusão" (experimentada subjetivamente...) de qualia diferentes dos que se pensa serem "normais", isso é, daqueles associados (supostamente) a estímulos corriqueiros (como luz visível)? Por exemplo, uma "nova cor"? Ou com qualquer outra "categoria" de qualia. Se não, por que não?

- se é afirmado que a experiência subjetiva é uma ilusão, e tudo que conhecemos do mundo se dá através da nossa experiência subjetiva, então como se responde a afirmação de que qualquer outra coisa é possivelmente uma ilusão? Que "batatas não existem"? O eliminacionismo acaba implicando numa espécie de niilismo solipsista; só experienciamos essa ilusão da experiência, e portanto não temos como realmente saber qualquer coisa.

Offline _tiago

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #92 Online: 08 de Fevereiro de 2011, 01:50:08 »
Giga,

O neurocientista Benjamin Libet, da Universidade da Califórnia em São Francisco, recrutou voluntários para fazerem exatamente o que foi proposto acima. Um relógio permitiu aos voluntários perceberem em que momento exatamente eles decidiram agir, e ao colocar eletrodos em seus pulsos, Libet pôde avaliar o tempo exato do início da ação. Mais eletrodos em seus couros cabeludos puderam reportar um padrão particular de ondas cerebrais chamado de "potencial de reação", que ocorre prontamente antes de qualquer ação complexa e está associado com o planejamento cerebral dos próximos movimentos.

Pelo estudo do cara, milésimos de segundos antes da ordem consciente de mover o braço ser acionada, algum outro processamento, submerso em região ou nível ainda desconhecido, prepara ou aciona o mecanismo consciente que deverá pedir a execução da ordem "mover o braço"?

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #93 Online: 08 de Fevereiro de 2011, 02:33:22 »
Eu acho engraçado o Buckaroo utilizar o famoso e conhecido exemplo da consciência de um termostato, pois é mais uma refutação de Dennett para o memeplexo de qualia e toda a religião zumbi* que o acompanha:

Citar
Até aqui, temos uma consideração claramente instrumentalista, anti-realista, dos estados intencionais: eles não existem de fato, são apenas considerados tendo em vista determinado fim. Contudo, Dennett considera a necessidade de estados internos, o que adiciona um novo elemento à sua posição. Isto não significa que sua noção de estados internos seja idêntica a de um realista, ao contrário, ela reafirma uma forma de anti-realismo. Considere-se um termostato. Tal artefato pode ser designado a adequar a temperatura de um determinado recinto. Para tanto, ele possui uma determinada estrutura interna que o torna capaz de distinguir o quente do frio. Caso enriqueça-se o artefato, dotando-o de um aparelho visual e auditivo, sua estrutura interna será alterada, acompanhada por sua representação do mundo. O termostato poderá, agora, identificar a temperatura do recinto até mesmo pelas vestimentas ou conversas de quem nele se faz presente. Pode-se dizer, portanto, que, devido a uma alteração na estrutura interna do artefato, ele possui agora novas crenças, representações sobre o mundo. Para Dennett, estados internos não são algo de místico e misterioso, são, na verdade, estados estruturais de um sistema, determinando sua representação do mundo e seu comportamento. Mais complexo sejam estas estruturas internas, mais complexo o sistema. Reside aí a distinção entre artefatos, animais e homens: são sistemas com diferentes graus de complexidade interna, como afirma Dennett:

" There is no magic moment in the transition from a simple thermostat to a system that really has an internal representation of the world around it. The thermostat has a minimally demanding representation of the world, fancier robots have more demanding representations of the world. Finally you reach us " 9 ( Dennett, 1987:32). Link

Novamente um tipo de "refutação" que parece passar simplesmente por cima do problema sem conseguir percebê-lo.

Eu fico meio estupefato e sem saber como começar a contra-argumentar/explicar, uma vez que o cara de alguma forma conclui que qualia não existem.

O que é feito aí, é simplesmente a descrição superficial dos mecanismos de um termostato e a afirmação de sua analogia com um cérebro, que de certa forma simplesmente aumenta apenas em complexidade quanto a quantidade de estados internos nos quais pode se configurar, e coisas que pode processar. Ótimo. O problema (difícil) é que, pelo menos com cérebros, desse processo, surge a experiência subjetiva desses estados.

O que Dennett (se é que foi ele, não prestei atenção em quem escreveu e no que é citação) faz é partir da hipótese de que termostatos não teriam qualia emergentes de seus estados internos, e por analogia, concluir que também não temos. Para mim ele partiu de uma não-observação (inexistência de qualia em termostatos) e então entrou em negação. O lógico me parece ser partir da observação -- temos qualia -- e daí nos perguntarmos (não digo que é realmente possível concluir) se sistemas suficientemente análogos (talvez termostatos não sejam, talvez sim, não sabemos), também os têm.

Além de ser um caso extraordinário de petição de princípio, é uma imbecilização da navalha de ockham. É meio como delinear que os humanos, como seres vivos, não fazem nada mais que os seres unicelulares fazem: nascem, crescem, se alimentam, excretam, se reproduzem, e morrem. Logo, não somos multicelulares/não temos cérebro/nosso cérebro não faz nada de verdade, só um monte de ativações sem sentido porque todo o resto pode ser explicado no nível unicelular, etc. Negando aquilo que é a nossa própria experiência, tudo que conhecemos.




*Searle demonstra bem esse sentimento na academia:

Citação de: A consciência vista de fora
De acordo com Searle, por sua vez, o livro "The Conscious Mind é um sintoma de um certo desespero nos estudos cognitivos atuais"(Searle, 1998, p.162).


Searle não é negac... eliminacionista de qualia. A citação um pouco mais completa é :"The Conscious Mind é um sintoma de um certo desespero nos estudos cognitivos atuais: seria difícil de desistir do programa de pesquisas principal -- funcionalismo computacional - mas ainda não foi dada uma explicação funcional remotamente plausível da consciência".

(fonte)

Offline Gigaview

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #94 Online: 08 de Fevereiro de 2011, 02:55:34 »
Giga,

O neurocientista Benjamin Libet, da Universidade da Califórnia em São Francisco, recrutou voluntários para fazerem exatamente o que foi proposto acima. Um relógio permitiu aos voluntários perceberem em que momento exatamente eles decidiram agir, e ao colocar eletrodos em seus pulsos, Libet pôde avaliar o tempo exato do início da ação. Mais eletrodos em seus couros cabeludos puderam reportar um padrão particular de ondas cerebrais chamado de "potencial de reação", que ocorre prontamente antes de qualquer ação complexa e está associado com o planejamento cerebral dos próximos movimentos.

Pelo estudo do cara, milésimos de segundos antes da ordem consciente de mover o braço ser acionada, algum outro processamento, submerso em região ou nível ainda desconhecido, prepara ou aciona o mecanismo consciente que deverá pedir a execução da ordem "mover o braço"?

Sim, no vídeo é uma eternidade de seis segundos!!! Dê uma olhada aqui: http://en.wikipedia.org/wiki/Neuroscience_of_free_will
Brandolini's Bullshit Asymmetry Principle: "The amount of effort necessary to refute bullshit is an order of magnitude bigger than to produce it".

Pavlov probably thought about feeding his dogs every time someone rang a bell.

Offline Gigaview

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #95 Online: 08 de Fevereiro de 2011, 03:09:41 »
(Aviso: ainda não terminei de ver o vídeo. A BBC bem que poderia ter feito a gentileza de quebrá-lo em partes)

Por falar em quebrar em partes:



É um apanhado interessante de coisas, mas um tanto desconexas. O problema é que "consciência" pode pelo menos uns dois ou três significados um pouco distintos. Pode ser como o cérebro processa as informações do mundo ao redor, guarda informações, faz decisões, e nisso há a ramificação do problema do livre-arbítrio...

Não sei porque, mas pessoalmente não sei que problema do livre-arbítrio é esse. Não vejo problema algum em sermos
guiados por cadeias de causas e efeitos. O que muitos não parecem perceber é que o fato de essas cadeias existirem
não implica de forma alguma que as respostas do cérebro humano sejam previsíveis. Elas podem muito bem ser caóticas
(no sentido de sensibilidade a condições iniciais) e extremamente complexas. Porque é tão fácil aceitar que o clima da Terra seja
regido por relações de causa e efeito, mas não a mente humana?


concordo 100%. não há problema algum com o livre-arbítrio a não ser um monte de pessoas querendo encontrar racionais toscos para dizer que não o temos.

OK, mas o que você acha do último experimento do vídeo em que a escolha (apertar o botão) acontece segundos depois de se "iluminar" a área do cérebro onde se processa a decisão? Quem está decidindo? Quem é que está enganando quem nessa estória?

Não sei se estou sendo simplista demais e não vendo coisas que você está vendo.  Isto só quer dizer que ele começou o processo de decisão alguns segundos antes de ter efetivamente apertado o botão.

De fato, não é tão simples assim. Abaixo parte do início do texto da Susan Blackmore que postei no tópico Même, Eu mesmo, Eu (../forum/topic=23040.0.html#msg529107). A ótica de Susan é a ótica da memética. O Buckaroo, Adriano e Dr. Manhattan discutem as perspectivas de Dennet e Chalmers dentre outros.

Suspenda seu braço à sua frente. A qualquer momento que você decidir, de sua livre e expontânea vontade, flexione seu pulso. Repita isto algumas vezes, estando certo de que você o faz tão conscientemente quanto puder. Você provavelmente irá experimentar algum tipo de processo de decisão no qual você deixa de não estar fazendo alguma coisa e então decide-se a agir. Agora, pergunte a si mesmo: o que deu início ao processo que conduz à ação? Foi você?

O neurocientista Benjamin Libet, da Universidade da Califórnia em São Francisco, recrutou voluntários para fazerem exatamente o que foi proposto acima. Um relógio permitiu aos voluntários perceberem em que momento exatamente eles decidiram agir, e ao colocar eletrodos em seus pulsos, Libet pôde avaliar o tempo exato do início da ação. Mais eletrodos em seus couros cabeludos puderam reportar um padrão particular de ondas cerebrais chamado de "potencial de reação", que ocorre prontamente antes de qualquer ação complexa e está associado com o planejamento cerebral dos próximos movimentos.

A descoberta controversa de Libet foi que a decisão de agir veio depois do potencial de reação. Parece que é como se não houvesse um "ser" consciente comandando as sinapses e dando início às ações.

Esta e outras pesquisas fizeram-me acreditar que a idéia do "ser" é uma ilusão.


Provavelmente não estão medindo todos os parâmetros corretamente. O cérebro é uma questão bem complexa.
Seguindo o processo científico, eles deveriam fazer alguma hipótese a partir desta constatação e checar se ela pode determinar/prever alguma reação que se desconhece.

Fico com a falta de mensuração correta.

É possível. Mas lembre que não são parapsicólogos que conduzem as pesquisas...eheheheheheh

Existe muita polêmica em relação à interpretação dos resultados, uma delas diz que o que se mediu foi apenas um estado em que o cérebro "presta atenção" durante o experimento e que a mente "consciente" já estava no comando de todo o processo. Variantes dos experimentos foram realizadas, todas ainda sujeitas a algum tipo de crítica.

Dê uma olhada aqui: http://en.wikipedia.org/wiki/Neuroscience_of_free_will
Brandolini's Bullshit Asymmetry Principle: "The amount of effort necessary to refute bullshit is an order of magnitude bigger than to produce it".

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« Resposta #96 Online: 08 de Fevereiro de 2011, 03:24:27 »
Já que voltou um pouco essa parte do livre-arbítrio, acho curioso que o Dennett defenda livre-arbítrio e "elimine" qualia ao mesmo tempo. Não existir livre-arbítrio me parece algo bem mais facilmente aceitável/razoável do que qualias serem uma "ilusão".


Se bem que ao menos me parece que o livre-arbítrio do Dennett é meio entre aspas. Um livre-arbítrio "pragmático", não havendo a proposta de que a consciência/processos mentais que resultam nas nossas decisões sobrepujam o determinismo físico. No cotidiano humano é um conceito útil, virtualmente real, mas se for levar para o campo da [neuro]física é quase que filosofia de botequim, ou semântica, uma redefinição do que são coisas como "vontade" e "arbítrio" -- que são determinados. A "liberdade" é só um leque maior de possíveis resultados/reações em comparação a organismos que respondem de forma mais simples ao ambiente.

Offline Gigaview

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #97 Online: 08 de Fevereiro de 2011, 03:28:42 »
A visão do Cientista está de acordo com o Epiphenomenalism. (http://en.wikipedia.org/wiki/Epiphenomenalism)

Brandolini's Bullshit Asymmetry Principle: "The amount of effort necessary to refute bullshit is an order of magnitude bigger than to produce it".

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Offline Adriano

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #98 Online: 08 de Fevereiro de 2011, 08:20:33 »
Dúvidas sobre a experiência subjetiva como uma ilusão que experienciamos subjetivamente (...) devido a linguagem:

- Essa tentativa de eliminacionismo através da linguagem me pareceu ser mais uma hipótese de emergência do que de inexistência/ilusão. Não é uma ilusão de experienciar subjetivamente já uma experiência subjetiva, que portanto existe?
A ilusão ocorre nas tentativas de experimentos mentais para tentar provar um deus/religião que não tem contrapartida alguma na realidade objetiva. Os Skyhook, os ganchos presos aos céus. No negacionismo destas inexistência existe muita coerência física e biológica para demonstrar a falácia de buscar apenas na experiência do indivíduo na cultura. A questão é que a nossa proposta é melhor em termos de embasamento físico e biológico.

- se a linguagem possibilita isso (chame-se de emergência ou ilusão), seria possível também "engabelar" alguém, ou que alguém ficasse "confuso" com a sua linguagem a ponto que essa pessoa "tivesse a ilusão" (experimentada subjetivamente...) de qualia diferentes dos que se pensa serem "normais", isso é, daqueles associados (supostamente) a estímulos corriqueiros (como luz visível)? Por exemplo, uma "nova cor"? Ou com qualquer outra "categoria" de qualia. Se não, por que não?
No próprio tópico temos um exemplo citado da literatura de Oliver Saks demonstrando como a experiência subjetiva impede que uma pessoa percebe a própria cegueira. Ela mesma se ilude e acredita piamente nesta ilusão. O que seria isto? Um qualia invertido mas sem estar presente num mundo imaginário alternativo?

Ampliando um pouco mais vemos as religiões e toda a sua deformação informacional sobre os qualias da espécie, negando o que são conteúdos já consagrados por praticamente toda humanidade. E replicamos muito bem estas situações de confronto destes ambiente, nas discussões com o que denominamos de crentes, os zumbis céticos, que não possuem o qualia da descrença.

- se é afirmado que a experiência subjetiva é uma ilusão, e tudo que conhecemos do mundo se dá através da nossa experiência subjetiva, então como se responde a afirmação de que qualquer outra coisa é possivelmente uma ilusão? Que "batatas não existem"? O eliminacionismo acaba implicando numa espécie de niilismo solipsista; só experienciamos essa ilusão da experiência, e portanto não temos como realmente saber qualquer coisa.
Não extrapole. A ilusão é apenas considerado para o qualia e todo o epifenomenalismo. Vou ilustrar com uma citação do meu "artista" cognitivo predileto:

Citação de: A consciência vista de fora
Em um artigo posterior escrito especificamente para criticar Chalmers, Dennett compara o autor dualista a um vitalista:

Imagine algum vitalista que diz aos biólogos moleculares:
Os problemas fáceis da vida incluem aqueles de se explicar os seguintes fenômenos: reprodução, desenvolvimento, crescimento, metabolismo, autoreparação, autodefesa imunológica... Esses não são [problemas] tão fácil, é claro, e podem tomar mais de um século ou algo assim para que os pontos finos sejam tratados, mas eles são fáceis em comparação com o problema realmente difícil: a própria vida. Nós podemos imaginar algo que seja capaz de reprodução, desenvolvimento, crescimento, metabolismo, auto-reparação e autodefesa imunológica, mas que não seja, veja bem, vivo. O mistério residual da vida estaria intocado pelas soluções a todos os problemas fáceis. De fato, quando eu leio as suas abordagens da vida, eu fico me sentindo como a vítima de um engodo (Dennett, 1996)
E complementando a metáfora artistica que você começou mimetizando, eu diria que para mim as obras de Dennett são um espetáculo cinematográfico, Chalmes é apenas o antagonista, aquele que faz um monte de merda, mas mesmo assim contribui muito para a história toda ficar emocionante.

Até porque, se for para ir além na inteligência visual, temos que consider estes espetáculos homéricos que construímos com a tecnologia e não apenas ficar na escultura, que utiliza uma tecnologia há muito ultrapassada (problema fácil) e não possibilita a experiência de tantos qualias paras os indivíduos em geral :P
Princípio da descrença.        Nem o idealismo de Goswami e nem o relativismo de Vieira. Realismo monista.

Offline Adriano

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Re: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #99 Online: 08 de Fevereiro de 2011, 08:27:21 »
É possível. Mas lembre que não são parapsicólogos que conduzem as pesquisas...eheheheheheh

Existe muita polêmica em relação à interpretação dos resultados, uma delas diz que o que se mediu foi apenas um estado em que o cérebro "presta atenção" durante o experimento e que a mente "consciente" já estava no comando de todo o processo. Variantes dos experimentos foram realizadas, todas ainda sujeitas a algum tipo de crítica.
Nos estudos com superdotados, estes demonstram fazer melhor utilização cerebral, medido pelas suas frequências. Ou seja, no grupo de controle, os comuns tendem a demandar maior esforço cerebral para realizar a mesma atividade e com menor desempenho.

A visão do Cientista está de acordo com o Epiphenomenalism. (http://en.wikipedia.org/wiki/Epiphenomenalism)
Com certeza não é, muito menos a sua, com a sua fascinação com a memética. A do cientista também está mais voltada ao funcionalismo, ao entendimento da consciência como um grande computador muito potente e ainda não igualado, algo semelhante ao que o Dr. Manhattan postou:

Citar
Funcionalismo

Como foi dito acima, muitos filósofos aceitam o argumento da múltipla realizabilidade, e por isso rejeitam completamente o fisicalismo e o reducionismo. O argumento motivou o ponto de vista conhecido como funcionalismo, o qual defende que estados mentais não são físicos, mas sim funcionais. Um estado funcional descreve um relacionamento entre certos estímulos sensoriais (inputs) e certos comportamentos e outros estados mentais (outputs).

Uma dor é funcional em virtude do seu papel causal. O papel causal é determinado por certos estímulos e estados mentais, e determina comportamentos e estados mentais futuros. Assim, embora a dor não seja idêntica à enervação de certa fibra cerebral, é ao menos idêntica a algum estado funcional.

Geralmente, estados funcionais são especificados como estados de uma máquina de Turing. Assim, ao menos alguns funcionalistas defendem que estados mentais são estados de uma máquina de Turing.
« Última modificação: 08 de Fevereiro de 2011, 08:36:13 por Adriano »
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