Interessante como esses supostos espiritos continuavam assentando nele a despeito das ignomínias praticadas pelo dito cujo. Pode-se dizer que tais espíritos seriam cúmplices criminosos ao ajudar na construção de uma fama que só serviria pra atrair mais e mais vítimas incautas.
Como já foi dito, meu caro Sergio, os espíritos não são todos bons ou santificados; são exatamente o que eram ao desencarnar. Então, JD atraía aqueles com os quais se afinava.
Neste mundo não existem vítimas inocentes; todos cumprem um destino segundo o que fizeram em vidas anteriores.
Embora eu tenha profundo respeito pelo colega JungF e não menor gratidão por todos os seus ensinamentos, que ao longo de todos estes anos provaram ser mais que apenas pérolas atiradas aos porcos, ou até mesmo que pelo milagre da paciência e compaixão até mesmo alguns porcos podem apreciar a singela beleza de uma pérola, sobre esta questão em particular eu teria algumas pequenas discordâncias.
Pois o próprio mestre Jesus nos deixa uma clara lição sobre isso:
Também os escribas, que haviam descido de Jerusalém, diziam: “Ele está possuído por Belzebul: é pelo príncipe dos demônios que ele expele os demônios”. 23 Mas, convocando-os, dizia-lhes em parábolas: “Como pode Satanás expulsar a Satanás? 24 Pois, se um reino estiver dividido contra si mesmo, não pode durar. 25 E se uma casa está dividida contra si mesma, tal casa não pode permanecer. 26 E se Satanás se levanta contra si mesmo, está dividido e não poderá continuar, mas desaparecerá. 27 Ninguém pode entrar na casa do homem forte e roubar-lhe os bens, se antes não o prender; e então saqueará sua casa”
Espíritos imundos não curam, não fazem o bem. Não levam refrigério às famílias dos aflitos. Ainda que este mundo seja para expiação e aprendizado o mal é causado pelos maus, e o bem obra dos bons.
Pois se os bons fizerem o mal e os maus fizerem o bem, o que poderiam aprender as almas de existirem nessa confusão de mundo? Estaria assim refutada a lei mais importante a reger os significados e propósitos deste universo: a lei do Karma!
Sobre isto, caríssimos, faz-se mister apenas compreender (ainda que se precise explicar pela milionésima vez) algo mui claro: Espiritismo não é religião. Espiritismo é apenas uma faceta da realidade.
Espíritos existem, espíritos bons existem. Espíritos querendo ajudar pessoas existem.
Existiam antes de Kardec e se fecharem todos os centros - de picaretas ou não - continuarão existindo. Porque diferentemente de santos católicos e divindades druidas não são invenções de mentes imaginativas ou delirantes. Espírito é substantivo concreto.
Outra confusão comum que se faz é entre mediunidade e santidade. Santidade é algo tão real quanto um deus druida, mas mediunidade é um caractere presente em certos indivíduos e geneticamente determinado por esta pessoa apresentar atividade peculiar da glândula pituitária e do pâncreas em associação a certos tipos exóticos de refluxos estomacais.
Ou seja, ninguém escolhe ser médium. Ninguém estuda ou treina para ser médium e, mais relevante que tudo, ninguém merece ou desmerece ser médium. Nascer médium é tão somente algo como nascer canhoto ou estrábico. Um tipo de característica que pode estar presente tanto em um Chico Xavier como no maníaco do parque.
Mas aí levantam maliciosamente a questão: por que espíritos atuariam por meio de médiuns de caráter duvidoso?
Veja bem, se estivéssemos falando dos santos da igreja se manifestando por meio de pervertidos, seria esta uma perplexidade justificável. Porém aqui falamos de espíritos, e espíritos somos todos nós, pessoas comuns com virtudes e defeitos; com a única diferença de que alguns espíritos carregam um apêndice corpóreo e outros não.
E você por acaso consegue prever o futuro? Claro que não, você é espírito.
Então, antes que um cético intelectualmente desonesto acuse mentores ascencionados de cumplicidade em um golpe de estelionato, deveria ser coerente com seu alegado ceticismo e apresentar qualquer prova de que o JD estava mesmo incorporando espíritos enquanto abusava de mulheres ou se aproveitava materialmente de incautos.
Na verdade o que ocorreu é que JD era um médium autêntico e possuía as habilidades raras para o tipo de trabalho que realizava e por isso foi usado como um canal. Assim fez fama mundial e atraiu multidões de peregrinos à sua pequena cidade, após milhares de curas inexplicáveis pela medicina convencional. Porque seria preciso muita fé cética para acreditar que um completo farsante que nunca curou num uma unha encravada, foi capaz de enganar não milhares, mas centenas de milhares.
Mais difícil ainda porque a fama do JD veio do boca a boca. Não havia por trás nenhuma grande mídia nem a máquina de uma super instituição religiosa (como a ICAR promovendo seus supostos santos), que pudesse explicar sua extraordinária projeção logrando êxito em se estender para muito além das fronteiras nacionais. Qualquer um que procurasse João de Deus só o fazia por indicação de alguém que houvesse experimentado em 1ª pessoa a realidade da cura espiritual. E foram milhares e milhares e milhares. Seria mesmo ridículo atribuir este volume espantoso de curas a algum efeito placebo ou até doenças psicossomáticas se considerarmos apenas algumas destas obviedades:
- Uma tal taxa de cura por efeito placebo, se fosse possível, tornaria sem efeito toda a metodologia aplicada há décadas em testes de novos medicamentos realizados pela indústria. No entanto é bastante bem documentada a incidência percentual de efeito placebo em uma amostra qualquer corroborada por grupo de controle.
- Da mesma forma são as pseudo-doenças de origem psicossomática. Sabemos que tipos de doenças reais podem ser confundidas com disfunções psicossomáticas e suas prevalências no conjunto da população. Não obstante todos os dados são inconsistentes com o registro documental do que ocorria em Aquidauânia.
- Se fosse possível enganar milhões por simples sugestão, a maioria dos que procuraram João de Deus já teriam sido curados antes em consultórios por médicos convencionais. Ora, você quer poder de sugestão mais forte do que um médico real, com um diploma de médico, receitando um medicamento referendado pela Anvisa como um droga eficaz para o tipo de problema que você imagina ter?
Incontestável é o fato de que o médium realizou milhares de curas. Incotestável também é o fato de que não há explicação científica honesta para isso.
Porém, infelizmente, também é incontestável que o médium é culpado dos crimes que o acusam e que fez fortuna com o espiritismo. Mas só um cético enviesado por doses cavalares de "whishful thinking", diante do exposto, veria nisso qualquer tipo de evidência de fraude da própria mediunidade. Há uma clara contradição e duplipensar aí: pois as provas que se amontoam no inquérito policial ainda seriam poucas e débeis comparadas com as provas de mediunidade que se avolumam em mais de 30 anos de serviços prestados por uma comunidade de elite de espíritos curativos. Notem bem, de elite! E uma elite, por definição, é qualquer conjunto composto por entes perfeitos, incriticável. Então por que as matérias policiais seriam prova aceitável dos maus feitos, enquanto milhares de matérias investigativas que, ao longo de décadas, sempre atestaram os milagres mediúnicos ocorridos em Aquidauânia, não contam?
O que realmente se deu é de simples explicação, embora não menos lamentável. Em algum momento, por um misto de assombro e vaidade, o médium se permitiu ser instrumento da nobre causa dos espíritos sem nada ganhar por isso além de reconhecimento e gratidão. Porém em 1997 ele decide dar um ultimato aos espíritos: com o argumento de que "só o que trabalha de graça é relógio", JD exige ser mais bem recompensado por sua dedicação e ao encontrar resistência aconselha os espíritos a procurarem outro médium. Ou "outro trouxa", nas palavras de JD.
O que você faria? Decepcionaria milhares de doentes desenganados, deixaria todas aquelas pessoas desamparadas? E aqueles que tinham consumido todas as suas economias para viajar até Goiás confiando no testemunho honesto de pessoas boas? Naquela altura os espíritos sentiam que tinham responsabilidade por estas pessoas. Além do mais, a reivindicação do médium não era de todo injusta, uma vez que todos nós que também trabalhamos com honestidade e amor não deixamos de sermos pagos por isso.
No entanto, algo que o mundo espiritual jamais toleraria seriam os abusos. E sobre estes execráveis episódios foram tão pegos de surpresa quanto toda a comunidade espírita brasileira. Nunca desconfiaram de nada pois JD sempre tomava a providência de bloquear o canal antes de molestar alguma de suas vítimas. E se mesmo seus assessores diretos e até familiares, jamais souberam de coisa alguma, por que é menos provável que os espíritos, vivendo em um outro mundo, outra dimensão, pudessem estar incientes de desvios que ocorriam atrás da privacidade de portas cerradas?
Apenas assimilem de uma vez por todas estas simples verdades:
- Médium não é santo.
- Espírito não é deus.
- E espiritismo não é religião!