Ah, agora entendi e gostei da explicação! Deveras, a lei de causa e efeito espírita difere substancialmente do carma (que não é proposição só do budismo), basicamente pelo fato de que, mesmo sendo parecidas em suas proposições, provêm de bases ideológicas distintas. A concepção do carma, ao que me parece, surgiu para fundamentar a existência das castas, sendo, pois, uma lei inexorável: ninguém escapa de seu destino!
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O espiritismo aparenta minimizar essa dureza e oferece o livre-arbítrio e o planejamento da nova existência no plano astral como meios de abrandar o que, de outra forma, seria experiência terrivelmente dolorosa!
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Claro, isso em linhas bem gerais
Sim, o abrandamento.
Deve-se principalmente a um aspecto das Leis Divinas, o qual visa educar e não punir. Se não houver reincidências, isso que caracteriza recalcitrância, ensinamentos são ministrados... como num curso em recapitulação; então volta-se ao ambiente da Terra para a devida aprovação.
A recordação, subjetiva, quase como uma intuição, ou, até, instinto de preservação ajudará nas escolhas a serem feitas.
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Você, caro psicólogo analítico, às vezes retruca às críticas, noutra vezes responde com a mudez, aliás, o Pedro Reis, numa reflexão de singular inspiração, disse tudo a respeito de seus silenciamentos. Falo disso porque lembrei do esquecimento reencarnativo, o qual torna o sonho multividas inexequível! Você, Jung, ao encarar o problema deu uma de Kardec, retrucou superficialmente e pouco elucidou desse enormíssimo óbice!
Você colocou bem a questão. É um óbice de fato: mas não intransponível, pois a nossa mente, ou seja, o nosso espírito, evolui a cada choque biológico promovido pelas reencarnações. Mais avançado no terreno evolutivo e mais objetivas se tornam as lembranças. Veja, tudo questão de tempo.
Aptidões, vocação, nostalgia, simpatias e antipatias, são o resultado das experiências que se somam; então não se pode dizer que esquecemos de tudo quanto vimos ou ouvimos na espiritualidade. Compõem as estruturas do nosso inconsciente profundo, frequentemente emergindo ao nível do subconsciente.
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O problema pode ser assim resumido: como conciliar a ideia de um livre-arbítrio com a proposta de que há um plano a ser cumprido que não é conhecido? O discurso é até bonitinho: na erraticidade o candidato, assessorado por especialistas em polividas, traça o projeto da nova existência, no qual se agregam os castigos por males feitos na vida que foi vivida com os passos a serem dados visando a evolução espiritual. Aí, o coitado nasce e não recorda bulufas. Se em vida não topar com o ensinamento espírita sequer saberá que viveu antes e que deverá realizar o que não tem a menor ideia do que seja...
A diferença entre as pessoas demonstra o equívoco dessa assertiva. Bons, maus, inteligentes, beócios, trabalhadores, néscios, gênios, etc. Ou seja, se não houvesse as lembranças subjetivas estaríamos sempre no mesmo nível, tábula rasa. O pacote genético com que nascemos atua sobre o corpo, o cérebro, sistema nervoso, etc. Mas não sobre virtudes, dotes morais e intelectuais.
Uma família com diversos casos de autismo, ou músicos, matemáticos, alcoólatras... A tendência seria buscar um padrão genético.
São criaturas que no passado, irmanados pela afinidade incidiram em ações que no presente se desdobram nas reações.
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Como eu disse, o que há de pior por aqui, por aqui fica após a morte. Quer dizer, os mal feitores ou ignorantes compõem uma sociedade contígua a dos humanos encarnados; já aqueles que denotam avanço moral ou intenção de melhoras são acolhidos em ambientes afastados da crosta. Contudo ninguém, encarnado ou desencarnado anda ao desamparo das forças do Bem e hordas contínuas de bons espíritos incessantemente trabalham a benefício daqueles que se encontram na ignorância ou na maldade, ressaltando-se, inobstante, o respeito ao livre-arbítrio de cada um.
Fico a me perguntar: com é que sabe dessas coisas? Quem lhas revelou? E quem as revelou deixou material que permita conferir o que é afirmado? Ou é ASQ? Sei que se pronunciou junguicamente a esse respeito, quando asseverou: “não creio, sei”, fazendo eco ao seu xará alemão. De qualquer modo, a dúvida persiste...
Pensar que você gasta seu tempo tentando compreender como me saio nestes assuntos é motivo de grande orgulho para mim.
Tudo o que falo aqui está nas obras de Kardec e um outro tanto em Emmanuel e André Luiz. Então, para quem acredita eu diria que são instruções reveladas pelos espíritos envolvidos na tarefa de iluminação da humanidade... Isso tomará tempo.
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“hordas de bons espíritos” soa contraditório...
Sim, soa, mas o vocábulo admite "multidões" como sinônimo.
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Se os malfeitores ficam perto da crosta e os bons vão para longe não seria um problema? Parece com a situação atual do país, em que os bandidos atacam, fazem o ganho, partem e a polícia chega depois...
Veja como transcorreu a caminhada da civilização até agora. Crimes, guerras, genocídio, torturas, opressão, etc.
Seus autores estão por aqui, e entre eles este ajuste de contas.
Ora são vítimas inocentes ora cruéis agressores. Este processo perdura,
entre eles, até que haja a saturação ou o perdão. Os bons espíritos interferem sugerindo novas atitude aqui e lá, apos a morte. Isto ajuda sempre, mas a saturação no sofrimento é sempre eficaz.
Ainda não entendi qual vai prevalecer quando o livre-arbítrio entra em choque com o trabalho das “hordas do bem”... imagine um faminto por aventura sexual a caminhar no trilho de uma bela manceba que lhe sorrira? Se um espírito bisura no ouvido do sujeito: “não vá atrás, se for vai se dar mal” e ele responde “vá se ferrar, quem manda em mim sou eu!”, e segue adiante... por que, indago-lhe, ele não dá ouvidos ao clamor da prudência?
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Sim, sei que responderá algo mais ou menos assim: “eis exemplo do uso (mau uso) do livre-arbítrio: o degas foi avisado, mesmo assim quis arriscar... isso acontece de montão, a todo momento os espíritos-guias estão lançando avisos que são olvidados!”
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Então, vamos estender a imaginação. Ele vai atrás e se ferra! Aí diz para si mesmo “putz, eu deveria ter ouvido a voz na minha cabeça!”.
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Numa outra possibilidade: ele segue no propósito incerto e se dá bem, passa a noite curtindo delícias mil! Em dado momento, pensa: “que raio de voz era aquela que me dizia para voltar?”
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Conseguiu entender onde quero chegar?
Perfeitamente.
Linhas atrás dizia que a evolução moral não é a mesma pois são diferente as idades dos espíritos; uns, recentemente chegados ao plano da civilização, outros, veteranos e teimosos; muitos aceitam de boa mente os ensinamentos que a dor proporciona e por aí vai. Mas sempre prevalece as experiencias do passado. O instinto sexual, uma da mais importantes forças que o ser humana precisa aprender a administrar, pelas graves consequências de seu mau uso, acaba por se tornar, ao longo do tempo, fator de correção para os muitos desvarios a que estamos sujeitos. Aquele homem que você citou como exemplo ouvirá a voz interior ou não, dependendo de o quanto já tenha sofrido pela escolha errada. Ainda que daquela vez nada tenha acontecido, sofrerá as consequências cedo ou tarde. Então lembrará daquela voz.
Resumindo, no início de nossa evolução o sofrimento é mestre convincente. Repetidas vezes cometemos certos erros e sofremos, gradualmente, suas consequências.
Mais à frente já somos capazes de escolher os caminhos que nos proporcionam a paz e o equilíbrio e nossos erros não ocorrerão pelo prazer que enganosamente proporcionam, mas erramos por falta de vigilância ou fragilidade.