Mas AlienígenA, eu não acredito nesse Estado empresário nem no Estado autoritário.
Que tipo de estado você considera mais funcional?
Como muita gente, acho que um Estado que se limita às suas atribuições naturais é um Estado que funciona melhor. Mas parece que ninguém consegue chegar a um acordo sobre quais seriam as atribuições mínimas e necessárias de um Estado.
O estado mínimo é aquele que assegura direitos básicos - segurança pública, justiça e policiamento.
Como já disse, não entendo de liberalismo e nem pretendo fingir entender.
Das ideologias que conheço minimamente, e não tenho profundo conhecimento de nenhuma delas, é a que faz a análise mais cética dos fatos, na minha opinião.
A minha dificuldade com isso vem de existirem muitos discursos que se auto classificam como "liberais." Me lembro, por exemplo, de vários textos do finado forista Libertário com propostas que me pareciam claramente ridículas. Como substituir o Poder Judiciário por empresas que seriam pagas pelas partes em conflito para fazer mediação jurídica e até aplicar penas.
Será que é preciso explicar o quanto isso é ingênuo?
O libertário ou libertarista, até onde compreendo, parte dos princípios liberais para chegar ao anarcocapitalismo (com bons argumentos, mas impraticáveis, na minha opinião), diferente do liberal ou liberalista, que defende o estado democrático de direito.
Você apontou muitos problemas do modelo de Estado que são bem conhecidos. Mais agudos em alguns Estados, menos em outros... Certamente o Estado no Congo é mais disfuncional que na Noruega, embora, no passado, também estes países do norte europeu tenham tido sociedades profundamente corruptas.
Só que apontar problemas é fácil, Karl Marx também fez uma análise brilhante dos problemas do capitalismo no séc. 19. Mais difícil é encontrar alternativas viáveis.
O brilhantismo do marxismo é ofuscado, na minha opinião, pelo vício de analisar o capitalismo de uma perspectiva meliorista, como uma espécie mecanismo, e que, portanto, pode ser aprimorado trocando ou aperfeiçoando peças de sua engrenagem e não como uma espécie de organismo, em que intervenções geram efeitos colaterais imprevisíveis. Fora que Marx simplesmente pregou a divisão de classes, sem elaborar a questão. É um tanto óbvio, apesar desse discurso sedutor, que as "classes" disputam espaço antes entre si do que com as demais, trabalhadores atrás das mesmas vagas e capitalistas atrás dos mesmos consumidores, numa constante mobilização. Uns são contratados ou promovidos enquanto outros demitidos, uns reduzem de tamanho ou fecham as portas enquanto outros abrem e crescem. E todos atrás de privilégios, através da intervenção estatal, um piso salarial aqui, uma taxa extra ali, em detrimento de todos demais. Todos em busca de um abrigo embaixo de um cobertor que nunca para de crescer.
Ninguém precisa me convencer sobre o mal uso e os desvios daquilo que eu pago como imposto; mas existe alguma alternativa real, implementável, que substitua as taxas e impostos? Porque se não existir o que nos resta é insistir no combate à corrupção e lutar contra os gastos desnecessários ou ineficientes.
Insistir na redução do estado é insistir no combate à corrupção e gastos desnecessários e ineficientes.
A ideia de Estado mínimo eu aceito, só não sei a minha ideia de mínimo é a mesma que a sua.
O liberalismo, infelizmente, é contra-intuitivo. Não oferece vantagens imediatas, mas sim pequenos sacrifícios imediatos em troca de maiores vantagens futuras.
Outro ponto: você observa que a fiscalização e a legislação não impedem todas as formas de charlatanismo e estelionato, e isso é fato. Mas também o mercado não impediria e ainda liberaria todas as outras.
Mas não seriam impostas.
Sobre as religiões parece que o meu ponto não ficou muito claro: existe um órgão, o PROCON, com a atribuição de proteger o consumidor nas suas relações com empresas e prestadores de serviço. Mas não existe o PROCON da religião nem um Código de Defesa do Fiel, o que permite que o cidadão seja explorado e lesado na Igreja Universal de uma forma que não é possível para o consumidor nas Lojas Americanas ou nas Casas Pernambucanas.
O problema de um produto que exige fé para funcionar é que a culpa é sempre do consumidor.
Há casos e casos, que se multiplicam a cada dia, de pessoas que perdem tudo nestas arapucas disfarçadas de igreja e simplesmente o pobre diabo quando percebe que foi ludibriado não tem a quem recorrer. Ninguém precisa me dizer que há uma enorme competição entre religiões que se reinventam de muitas maneiras disputando o mercado de fiéis. Isso nós estamos vendo, mas o que eu estava falando era sobre a falta de proteção jurídica dos fiéis nas relações com estas instituições, e de como isso propiciou a emergência de verdadeiros impérios empresariais especializado no estelionato em massa.
Assim como jogos de azar. Precisamos proteger as pessoas delas mesmas. Fechar as casas de jogos para que as avós, figuras outrora respeitáveis, virem contraventoras.
E diante dessa realidade a gente constata que estes "consumidores", ou seja, estes fiéis, não foram capazes de depurar este "mercado", extirpando pelo poder de escolha aquelas denominações não idôneas, que se especializam em lesar as pessoas. Na verdade ocorreu o oposto: estas organizações criminosas só se multiplicam e crescem. Por benefício da escolha do próprio consumidor, que sem orientação nem proteção legal, é induzido a escolher o pior "produto religioso" contra seus próprios interesses.
Essa ideia de depuração é puritana, não reflete a realidade. O mundo não é e nunca será o paraíso, ou como você mesmo disse, não é feito de santos - nem do lado dos trabalhadores, nem dos capitalistas, nem dos consumidores. Cada um está atrás de seus próprios interesses. Enquanto houver quem queira comprar soluções mágicas, haverá quem esteja disposto a vendê-las e esse é o tipo de produto que trás em letras garrafais na embalagem que não oferece garantias e nem aceita devolução. A criminalização serve apenas para criar um mercado paralelo que termina por prejudicar toda a sociedade.
Era isso que eu quis mostrar, esse era o meu exemplo de que a seleção do consumidor não vai necessariamente levar a excelência daquilo que é oferecido pelo mercado. Pode até acontecer o contrário.
A excelência é resultado da busca pelo maior retorno possível pelo menor custo, tanto de um lado, o do consumidor, quanto do outro, o do fornecedor, mas não necessariamente. Ela é maior onde o consumidor é mais exigente e vice-versa, desde que o estado, é claro, não interfira. E em média, o mundo viu a excelência saltar nos últimos séculos, não por acaso.
Só vou relatar brevemente um caso que me lembrei agora...
Antigamente a IURD fazia grandes reuniões no Maracanã e conseguia juntar mais gente que em clássico de futebol. Então se viam aquelas cenas dos pastores carregando sacos e sacos de dinheiro na cabeça... Em um destes cultos o bispo exortou a multidão a jogar fora os óculos! Quem tivesse algum problema de visão era pra jogar fora os óculos que Jesus iria curar.
Todo mundo tirou os óculos e dessa vez os obreiros recolheram milhares de sacos com os óculos da galera.
Nem precisa dizer que saíram de lá tão míope quanto chegaram, mas um jornal descobriu que a Universal já tinha feito um acordo prévio com uma cadeia de óticas e os caras venderam os óculos daquela galera toda! Hahahahaha! Isso é cômico!
Daí o jornal mandou um repórter interpelar o Bispo Macedo sobre o caso, só que no meio da entrevista ele notou que o próprio Edir Macedo TAMBÉM USAVA ÓCULOS!
- Mas como o senhor diz que vai curar o problema de visão das pessoas se o senhor mesmo usa óculos?
E ele responde na maior cada de pau:
- Não, o que eu disse é que quem tem fé é curado. Mas eu mesmo nunca tive essa fé.
E o trouxa volta pra casa ceguinho, no dia seguinte tem que comprar outro par de óculos, e mesmo assim continua lá dando dinheiro pro vigarista.
Quer dizer... só o mercado, a competição, a livre concorrência... não evitam esse tipo de coisa.
Boa sorte em convencer a massa comovida a não acampar nas redondezas dos presídios em protesto contra a perseguição aos seus ídolos, atrapalhando a rotina da cidade. Como diz o sábio, pra corno todo sofrimento é pouco. Tente abrir seus olhos se quiser conquistar sua inimizade.