Não recrimino (muito) o Cientista.
Mais uma vez, você sendo tão compreensivo comigo. Até me comove. E como foi bonito isso que você postou! Você é um poeta, Feynman!
Também já fui muito encabrestado em relação ao sacrossanto método científico (que não existe), e duvidava que um cientista de verdade pudesse acreditar em deus. Nada como conhecer a comunidade de perto para esclarecer as coisas. Quase paradoxalmente, descobri ainda mais poder na ciência ao constatar que seus feitores podiam ser crentes em qualquer coisa: se a teoria sobrevive, é por seus méritos. E não pelos méritos idiossincráticos do cientista pesquisador. Isso é fascinante.
A que comunidade você está se referindo? À da mangueira? Ou seria à científica? Você já foi encabrestado por ela? Pobre Feynman! Nem você escapou!? Logo você que soube resistir a ela, tão bravamente, com seus diagramas! Veja o que o sistema pode fazer com o ser humano!
Você está redondamente enganado, Feynmam. O método científico existe *sim* e é, graças a ele, que pessoas com mentes mágicas são capazes de produzir alguma coisa que se possa chamar ciência. Os *cientistas* podem dispensá-lo completamente e é isto o que o faz, por vezes, parecer um tipo de utopia científica, mas suprima o método, da humanidade, e ela retornará a não menos que a idade média muito rapidamente. O que você esperava mais que isso? Que algo tão óbvio e ridiculamente patético quanto o "método científico" pudesse ser absoluto, infalível, um guia perfeito para a verdade?
As mentes mais medíocres crêem, piamente, que vivemos numa era de grande conhecimento e desenvolvimento tecnológico. Vejo bem diferente disso. Estamos na pré-história da ciência. Ainda vivemos num tempo em que mentes acreditam (umas bem lá no fundo e outras descarada e vergonhosamente bem à superfície) que o universo possa ser alguma coisa que elas digam ou pensem. Ainda não saímos da escolástica. Aristóteles fez um formidável trabalho de imbecilidade e alcançou sucesso porque disse exatamente as coisas que todos já sabiam e gostavam de ouvir. Foi o maior malfeitor identificável da humanidade. A libertação desse jugo é muito difícil e, depois de mais de 2000 anos, o processo ainda nem se iniciou como se pode observar, claramente, aqui.
Não seja preconceituoso em relação a mim, Feynman. Está me fazendo lembrar de quando eu tinha 12 anos de idade e, observando familiares bebendo cerveja à vontade, indaguei: por que vocês bebem (e tanto) desse líquido inútil e, até, prejudicial? A resposta de um meu tio foi semelhante à sua: quando você tiver 18 anos vai beber também e vai gostar muito. Até hoje não consigo esquecer o sentimento de comiseração que tive por ele naquele momento. Ele morreu antes que eu completasse 18 anos e não pôde verificar o quanto estava errado. O maior erro que um ser humano pode cometer nas suas relações sociais é tomar o outro por ele próprio. Não faça isso. As pessoas são diferentes (muito diferentes), Feynman (você, grande Feynman, especialmente, devia saber disso). Não faz idéia de quem sou nem de com quem interajo. Não está me levando a sério, mas não estou brincando aqui.
Isso de que você diz estar sofrendo é o triste resultado do treinamento da mente em *o que pensar*, em detrimento de *como pensar*. É o que as universidades fazem (e sempre fizeram) de melhor. Mas ainda me permito nutrir-me com esta última ilusão -- de que é possível prover liberdade a alguém contra isso.
se a teoria sobrevive, é por seus méritos.
Uma frase quase etérea mas o problema não é a continuidade de uma teoria e, sim, seu surgimento. O interessante é observar que você acaba de projetar "méritos" sobre uma teoria, subtraindo-os de seu próprio teorizador. Isto me parece um estágio ulterior do pensamento mágico, quando já não se projetam mais as propriedades mentais somente nas coisas mas, até nas idéias e abstrações. Acho que aí fecha-se o ciclo da magia. Talvez seja o resultado de querer ser poético demais.
Uma teoria com méritos próprios... Ah!!! Só mesmo o grande Feynman para sair com uma dessas!
Já sabe a resposta?