Buckaroo,
Não tenho a menor idéia do que significa “boas intenções” pra você e nem onde isso se encaixa no que eu disse. “Boas intenções” são coisas que um indivíduo faz e que ele, e somente ele, julga boa! Mas isso não é suficientemente objetivo pra analisar qualquer coisa que se queira. Entretanto, já que você insistiu nisso, onde está a objetividade disso e como podemos considerar as “boas intenções” de alguém pra analisar o que quer seja?
Não considero fácil ou mesmo muito útil procurar delinear objetivamente "boas intenções".
O que enxerguei como tal no que você disse foi, "
quando pagamos por alguma coisa, pagamos por aquilo que queremos. O infeliz quer a droga, somente. A violência pode, e somente pode, vir a ser um efeito indireto da estrutura desse mercado e da sua repressão."
Ou seja, a lógica de que, porque eu quero X, se alguém me oferece esse X, pelo fato de eu simplesmente querer X, não tenho a menor responsabilidade ou culpa por Y e Z que o meu fornecedor faça para me prover X, mesmo que eu esteja perfeitamente ciente disso, não seja nenhum ingênuo.
Simplesmente não acho que cola. Parece que é só trocar o X de "droga" para algo como "prostituta", "aparelho de som", "carro", e o Y e Z poderem abranger desde "a mesma" violência usada pelo tráficou ou adicionar-se coisas como "escravidão", que de repente a lógica não vale mais.
Pelo visto você não percebeu, mas eu simplesmente peguei todo um processo e dei a minha concepção de onde acontece a violência e isso não foi uma defesa da legalização ou qualquer outra coisa além da descrição em si. Ou seja, eu detalhei um processo, dei o nome aos bois, o pingo dos “is”, enfim, dei a minha idéia da descrição do processo que estamos discutindo até para os fins de definição.
A importância disso, a meu ver, e inclusive, da percepção nossa sobre responsabilidade e seu alcance (que não pode ser direta somente para aquilo que escolhemos ser direta!) precisam estar sempre bem definidos, pra não corrermos o risco de falarmos besteiras e melhor definirmos as políticas do que quer seja. Não sei da sua idéia de responsabilidade, por isso, pergunto. O que é responsabilidade pra você? Outra questão que eu gostaria que você respondesse, se é direta a responsabilidade pelos crimes do tráfico, por que é direta?
Simplesmente não pode ser "direta", pelo fato de que a pessoa paga para as gangues, e elas é que "se preocupam" com a metodologia e a violência necessária, e a pessoa não tem que fazer o trabalho sujo. É só pagar, recebe a droga, e pronto.
A "minha idéia de responsabilidade", no que concerne ao tema, para não correr o risco de fugir do assunto, é que é irresponsável, condenável, que se pague para gangues violentas nos fornecerem coisas. E como o Donatello bem lembrou, é até bastante argumentável ser preferível não pagar por coisas até menos relacionadas a violência que as mesmas pessoas estejam oferecendo, talvez até de forma totalmente legal, desde que ajude a somar para os fundos da gangue.
Se boas intenções tiram qualquer culpa daquele que recebe o produto da violência, então não seria nada demais freqüentar um prostíbulo de escravas.... mimimi
Quando eu disse que além de prolixos vocês montavam comparações bizarras, foi ironicamente sério. O que isso tem a ver com o caso ou qualquer outro caso?
Como disse, "drogas", são só uma variável, uma das coisas pelas quais se pode pagar, financiando um esquema criminoso. Prostitutas, que por acaso são escravas, é outro. Pagamos por X, e os fornecedores fazem Y e Z. Pagamos por maconha/sexo. e os fornecedores matam pessoas/escravizam pessoas. Isso é o que tem a ver com o caso. Não é bizarro apenas porque maconha e sexo, ou sexo com prostituas, são coisas bem diferentes. A questão nunca foi especificamente fumar maconha, mas o "esquema" maior das coisas que gira em torno disso, e a lógica subjacente do problema é exatamente a mesma.
A responsabilidade ou a culpa jurídica é definida em lei. A moral, vai de cada um, é pessoal. A qual afinal você se refere?
Uma vez que, não é mais ilegal comprar especificamente drogas para consumo, porque a lei assim define, só posso estar falando da segunda.
Mas não se trata simplesmente de ser "de cada um", a menos que defendamos um relativismo absoluto onde vale tudo, só com a leve ressalva de que pode ser ilegal.
Pelo que entendi, você alega que “boas intenções não podem financiar a violência”.
Eu não imagino de onde tirou isso. O meu ponto é praticamente o contrário. Financia-se a violência a despeito de quaisquer boas intenções, de não se querer a violência. Se pagamos para uma gangue violenta nos fornecer inocentes ioiôs, pagamos por essa violência, a menos que banquemos os santinhos ingênuos e vítimas do sistema, lavando as mãos sobre o que quer que façam para nos dar o puro e imaculado produto ou serviço pelo qual pagamos.
Eu achei isso um tanto vago... Pareceu que você queria dizer, “usuários não podem financiar a violência”. Posto dessa maneira, a princípio, eu não teria por que discordar. Entretanto, com um bocado mais de atenção, percebe-se que comprar drogas, por si só, não é violência. É uma compra, e somente! Todavia, o processo continua e a estrutura desse mercado, como eu já disse, gera a violência onde eu já elenquei. Daí, cada um tem sua idéia de como resolver isso, por exemplo, (e parabéns, aqui você foi objetivo)
Essa é uma questão complexa geralmente simplificada demais com legalização versus proibição. Nos Países Baixos, poster-boy dos defensores da legalização, a maconha é na verdade proibida, porém bastante tolerada.
Sou a favor de algo próximo disso, ou uma legalização extremamente limitada, bem mais limitada do que é hoje cigarro ou álcool. Sem industrialização e comércio aos moldes de cigarro e cerveja. Algo que, de alguma maneira, ainda que forçada, deixasse o acesso às drogas "legalizáveis" mais como um hobby de alguns do que como um verdadeiro mercado. Meio como colecionadores de tampinhas e selos e o seu "mercado".
Fugir da dicotomia de liberação versus proibição parece ser o único jeito de fugir da dicotomia de problemas decorrentes do uso e abuso de drogas versus a violência do tráfico.
Pra confirmar, isso aqui significa, de maneira figurada, não veja o maconheiro e pau no traficante?
Não necessariamente. O melhor talvez fosse ver os dois. Pau no traficante violento, e pau naquele que compra dele, em vez de comprar de um outro ou produzir para consumo e distribuir/vender para quem mais conheça e saiba usar.
Por outro lado, como disse, é bem complicado. O combate policial aos traficantes violentos é parte do que faz com que eles "precisem" continuar sendo violentos. Excluindo as guerras entre gangues. As vezes penso se não seria melhor, ainda que certamente questionável em todos os graus, quase que praticamente ignorar o tráfico de modo geral. Eles não precisam mais se defender da polícia, a menos que de repente tentem algo meio como um verdadeiro golpe de estado, podem matar uns aos outros o conforme acharem necessário. Problema deles. E, infelizmente, daqueles que vivem nas comunidades onde são travadas essas guerras e que estejam sob o poder desses quase-governos paralelos. Mas poderia ser que isso acabasse gradualmente levando a uma pacificação entre as gangues. Quase que reproduzindo o processo civilizatório da história humana, que eventualmente estabeleceu o comércio e a não-coerção como melhor mecanismo de resolver as coisas com menores custos para todos lados. Lembro vagamente de já ter ouvido ou lido que passos nesse sentido tendem mesmo a acontecer, que o crime organizado vai se tornando menos violento e assim melhorando os negócios.
Por outro lado, como disse, não sei, simplesmente, da resposta definitiva. Penso também que talvez ações diametralmente opostas pudessem ser melhores. Como uma verdadeira operação militar. Literalmnente declarar uma estado de sítio nas favelas, transferindo as famílias para abrigos provisórios ou mesmo novas habitações "permanentes" (como Cingapura, Cohab, etc). Aqueles com envolvimento com o tráfico podem ir se entregando se temerem pelo pior, ou tentar se esconder, mas quando a favela estiver desocupada e completamente cercada por grades e muros, eventualmente, depois de alguam contagem para se entregar quantos quer que mudem de idéia, vão subir um monte de caveirões, esqueletões, ossadões e etc. Ou mesmo exército propriamente dito, como operação militar mesmo, de recuperação de território ocupado por forças inimigas/terroristas.
Novamente, não é algo que sem pontos questionáveis, sendo "todos" possivelmente para um monte de gente. Mas como disse, não sei qual é a solução geral para o problema. A única coisa da qual tenho segurança é de que contribuir financeiramente com as gangues violentas não é parte da solução, nem algo que deva ser visto como aceitável, não pior do que comer carne ou andar de carro.