Nas classes médias também.
Eu diria que a maioria dos bandidos hoje são de "classe média baixa" (na definição atual usada pelo IBGE, que lhe considera rico se ganhar mais que 3000 reais) e nenhum passa fome.
Você tem dados sobre a classe média? A classe média está praticando sequestros, latrocínios, roubo de automóveis, roubo a bancos? Para mim é novidade que tenha havido
um aumento considerável da criminalidade na classe média.
Os ricos também cometem crimes quando há repressão frouxa, só muda o tipo de crime que cometem (tendem a ser crimes menos arriscados e mais lucrativos).
Isso é interessante. Eu já havia tocado neste ponto.
Você está reconhecendo que a condição social e a qualidade de vida influencia ( quase determina ) o tipo de crime e o nivel de risco que uma pessoa está disposta a correr.
É perfeitamente lógico, o risco assumido é inversamente proporcional ao que se tem a perder. Alguém com um razoável padrão de vida não vai arriscar ter sua cabeça arrancada para roubar o fogão de uma creche.
Já aquele que não tem nada, que vive sem perspectivas em condições durissimas, está mais disposto a grandes riscos, aos crimes violentos. Portanto mais uma vez explicando porque a pena de morte não tem efeito intimidador, o que é corroborado pelas estatísticas. E explica também porque qualidade de vida influencia índices de criminalidade, coisa que a pena de morte não faz.
A pena de morte nos EUA é muito pouco aplicada. Estima-se de que apenas 1 em cada 300 assassinatos resulta em execução lá. E os estados que não aplicam pena de morte têm a prisão perpétua, que tem efeito praticamente igual (eu prefiro a pena de morte por outros fatores). Uma aplicação tão infrequente reduz bastante o efeito dissuasor e intimidador da mesma.
A pena de morte é pouco aplicada? Acha que essa é a causa?
Mas você reparou que em
TODOS os 36 estados que aplicam a taxa de homicidios é
MAIOR? E notou que em
CADA UM dos 14 estados que não adotam a taxa de homicídios é
MENOR do que em
QUALQUER UM dos estados adotam a pena de morte?
E percebeu que estamos falando de estados de um mesmo país, comparando realidades semelhantes?
Por que você acha que isto não representa um dado com algum significado sobre a eficácia da pena capital, mas ao mesmo tempo considera a comparação do Brasil com 5 países totalmente diferentes entre si e com o próprio Brasil, um dado extremamente significante?
A repressão aumentou no eixo Rio-São Paulo [...]
Os delegados e médicos legistas com quem tive contato me disseram que muitos bandidos e traficantes do eixo Rio-São Paulo emigraram para as capitais do Nordeste e estabeleceram "células" aqui, formando mais bandidos.
É sobre isto que eu estava falando no outro post. Sobre os tais "outros fatores", e um deles são os efeitos de uma instalação do que eu chamo de uma cultura do crime, e como isto adquire o seu próprio "momentum", a sua própria inércia.
Mas eu não quero entrar nessa tese agora porque é algo mais complicado.
Um outro fator importante, mas também complicado de delimitar, é uma mudança sutil mas progressiva de valores na sociedade brasileira, com uma cultura cada vez mais influenciada pelas pressões do consumo, com os valores mais superficiais prevalecendo sobre aspirações mais intrinsecas. Uma mentalidade onde o TER se confunde com o SER, ou seja, o individuo estabelece sua auto-imagem, sua auto-referência ( e por consequência sua auto-estima ), com base no seu poder de adquirir, de possuir, e na transferência do seu status como pessoa para o "status" de coisas que ele pode possuir ou usufruir, com esse "status" sendo o prestigio de uma marca ou "grife". E é curioso como o próprio objeto de consumo perde seu valor intrínseco ( como por exemplo sua funcionalidade ou o grau de conforto e prazer que proporciona ), para ter o seu valor determinado pelo que representa como um simbolo ou uma referência de sucesso.
Bom, mas isso é complicado de elaborar e você pode estar achando que eu viajei na batatinha, mas não da para compreender a evolução do problema da criminalidade no Brasil, nos últimos 30 anos, sem compreender o papel e a interação destes 3 fatores.
1 - Não tanto a desigualdade ( embora também tenha seu peso ) mas condições de vida muito duras, um cotidiano cada vez mais penoso para a população de baixa renda. Especialmente aquela que vive nas favelas e periferias dos grandes centros urbanos. E como isto, aliado a outros fatores, contribui para o embrutecimento do homem.
2 - A criação de uma "cultura do crime", com seus valores permeando toda a sociedade, mas especialmente as classes economicamente menos favorecidas. A cultura do crime dissemina valores, sua ética própria, mas também "know-how". Torna facilmente acessivel o conhecimento de como praticar diversos tipos de delinquência. E essa cultura tem seu próprio impulso, sua própria inércia. Ou seja, mesmo cessando outras causas a cultura do crime se torna ela mesma uma causa, embora inicialmente tenha surgido como consequência.
3 - A criação de pressões psicológicas de consumo - às vezes sutis - sobre uma massa que não tem os meios para consumir. Como estas pressões são direcionadas para associar o tipo de consumo com a imagem que o individuo constrói de si mesmo. A propaganda é smepre pensada para um consumidor especifico, mas quando veiculada atinge indiscriminadamente a todos. Como a Xuxa, nos anos 90, criando toda uma geração de frivolos consumidores compulsivos. Fazendo seus "baixinhos" desejarem brinquedos caros e meninas de 7 anos maquiagem e roupas sensuais, mas 80% das crianças que assistiam em todo o Brasil não podiam ter nada daquilo.
Mas para elaborar eu teria que escrever um livro ou uma tese. Posta assim, tão superficialmente e tão sem embasamento, para muitos pode não fazer sentido.
No entanto é preciso compreender e trabalhar com as causas reais do problema, e não com as causas que parecem fáceis.
É como em uma velha anedota:
Um sujeito estava procurando a chave de casa no jardim quando passou um amigo.
- O que você está fazendo?
- Procurando minha chave.
O amigo se dispôs a ajudar e depois de horas de esforço sem sucesso disse:
- Tem certeza que perdeu aqui, já olhamos tudo.
- Claro que não, perdi lá dentro. Mas aqui é mais fácil procurar porque é bem mais iluminado.