Hebreus 9:27 nega isso cabalmente
Curiosa, a força da interpretação particular, condicionando o pensamento e as idéias.
Refiro naturalmente ao meu modo de entender, sempre, esta passagem:
Óbvio que o homem morre apenas uma vez...
Mas sua alma, imortal e eterna, renasce em outros corpos, outros homens, que por sua vez também morrerão apenas uma vez.
Bela tentativa interpretativa, Spencer, mas a leitura do texto esclarece a fragilidade de sua ideia, ou não leu o que lá consta? Confira (Hebreus 9:27,28):
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“27 E, como aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo depois o juízo,
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28 assim também Cristo, oferecendo-se uma só vez para levar os pecados de muitos, aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o esperam para salvação.”
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A reencarnação não é o tema desse livro (que provavelmente não foi escrito por Paulo), a declaração do verso 27 é usada contra a reencarnação pelo discurso que apresenta, não porque o autor estivesse analisando as múltiplas existências. O objetivo daquele discurso é outro.
Então, veja só: você advoga que a morte seja uma só, uma para cada corpo. Neste modo de pensar, a reencarnação não seria “mexida”, pois o “suject” vive sua vida, morre (uma vez) e volta quantas outras vidas e mortes necessárias forem, até sua plena purificação.
Acontece que deveria ler por inteiro: “aos homens está ordenado morrerem uma só vez, VINDO DEPOIS O JUÍZO”.
Então, no ensino de Hebreus, após a morte vem o julgamento divino, portanto não cabe retornos continuados, nem mesmo com o jeitinho que pretendeu implementar.
O objetivo do livro é mostrar que Jesus morreu pelos pecados da humanidade uma única vez, o que foi suficiente para garantir a todos a salvação. Hebreus é uma apologia da morte redentora de Cristo em prol da humanidade pecadora.
Também está implícito no discurso que cada pessoa é única, seu corpo e alma formam uma unidade, pela qual Jesus morreu salvificamente. Isso colide frontalmente com a visão espírita de que o corpo é mera “casca”, podendo a alma ocupar numerosos organismos distintos em sua caminhada reencarnacionista.
Em resumo, o tema do livro de Hebreus, conquanto não discuta a reencarnação, mostra que a linha discursiva do Novo Testamento é incompatível com o pensamento reencarnacionista.
- (condescendentemente não vou abordar os EQMs, Lázaro e outros mencionados nos Evangelhos.)
Não precisa ser condescendente. A ressurreição de Lázaro é uma história que pode ser lenda. Mas, considerando que é apresentada com fato (para quem crê), não há problema: Lázaro continuou Lázaro: se lhe foi concedida uma esticadinha na existência, significa que sua morte foi cancelada, ele continuou a viver como Lázaro, até encontrar o fim como é o destino de todos.
Quanto à EQM, esta significa Experiência de QUASE Morte, quer dizer, o sujeito não morreu e, contrariando o que alguns advogam, não foi ao céu e voltou. A experiência se dá no limiar entre a vida e a morte. A regra é: morreu não volta, se voltar é porque não morreu... Os sonhos que alguns reportam (apenas alguns), de terem tido experiências espirituais, são inverificáveis e acham explicação nas reações psíquicas ante a ameaça da derrocada orgânica.
O conceito do Carma, que aparece aqui e ali em textos dos espíritas, obedece simplesmente a uma abrangência do princípio: - a cada um será dado segundo suas obras... também, e com mais frequência, denominado, lei da ação e reação, ou, lei de causa e efeito, a explicitar a inquestionável Justiça Divina.
Quando tiver um tempinho, explique ao Criaturo a diferença entre o carma e a lei de ação e reação espírita, pois para ele é tudo a mesma coisa...
“A cada um será dado segundo suas obras” Kardec copiou do Evangelho: “O que o homem semear isso também ceifará”, que Rivail malabarizou para o reencarnacionismo, embora a declaração de Jesus não abranja a reencarnação.
Acho que aqui cabe um desafio cordial:
expliquem, caros amigos, a Justiça Divina, (sem malabarismos teológicos), onde a dor, o sofrimento e a destinação humana é tão precária e casuística. Correndo o risco de ser sentencioso demais, digo, apenas a Reencarnação bem compreendida e estudada, pode justificar o horror e a miséria do mundo. Óbvio, se cremos em Deus e na sua Justiça.
Explicar a justiça de Deus sem conhecer o plano de Deus (supondo que exista) é desafio irrespondível. Quanto à reencarnação só é “justiça” quando vista na aparência, sem aprofundamento. Que raio de justiça é o sujeito saber que está pagando por crimes dos quais não guarda a menor lembrança de ter cometido? As fantasias de justiça reencarnacionista engendram idealizações horripilantes, tipo atribuir mortes em tragédias a castigos de males praticados noutras vidas. O texto que segue ilustra, após meu comentário abaixo:
Kardec exaltava o que
parece ser uma verdade: a reencarnação promoveria integral reparação, perante Deus, dos atos reprováveis. Se numa existência não for possível viver condizentemente, na próxima os erros serão corrigidos. Caso não o sejam, novas vidas − quantas necessárias − serão disponibilizadas, até que aquela alma tome jeito...
Foi isso que encantou Kardec e encanta seus seguidores: a possibilidade de um vaivém de duração indefinida, ou mesmo infinda, a proporcionar contínuo e inexorável progresso.
Será que as almas, após numerosas idas e vindas, não entram em depressão, por ter que ficar nessa faina de nascer-morrer a perder de vista? Ou não cobram melhoria no processo, dizendo: ó Senhor, por que não nos faz recordar naturalmente as existências passadas para que possamos acelerar essa caminhada evolutiva? Do jeito que está, a gente sempre escorrega e não pode corrigir o rumo, tendo que repetir, inumeráveis vezes, experiências que seriam melhor ajeitadas se houvesse lembrança...
As explicações que Kardec deu para não haver recordações não esclarecem por que Deus optaria pela forma mais demorada e dolorosa de promover a evolução espiritual.
Vejamos exemplo da tese da “justiça reencarnativa”.
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A TRAGÉDIA DE BIAFRA NA ÓTICA ESPÍRITA
-Luciano dos Anjos-
Pior, tragicamente pior que a do Vietnam é a guerra interna de Biafra, onde uma disputa fratricida pelo poder extermina diariamente milhares de criaturas absolutamente alheias ao processo político da Nigéria.
São mães e crianças aparentemente inocentes que sofrem na carne a conseqüência da discórdia de seus lideres fanáticos, especialmente o diabólico general Ojkwo. Mas, então – é de se cogitar – onde está Deus? Como é possível explicar a hediondez que se vem praticando ali, num quadro incontestavelmente dantesco, contra populações civis inermes que só querem e só desejam a paz, não importa o governo que lhes dêem? Não consola a ninguém justificar tais atos de barbárie com os ignotos desígnios do Criador ou as origens pecaminosas dos seus ascendestes. Onde está a bondade de Deus? Onde, a justiça de Deus?
Meu caro leitor, somente o Espiritismo pode explicar a incongruência dessa cruel realidade. Somente a Doutrina de Allan Kardec consegue fazer luz nas trevas dessa incógnita, que, nos termos em que se nos oferece à razão, sem uma cabal explicação, resulta em desconsolo, desesperança e até revolta.
No “Grupo Ismael”, de que faço parte, na Federação Espírita Brasileira, em plena reunião, meu companheiro Francisco Thiesen interpreta para nós a mensagem do entendimento em torno do doloroso processo coletivo de Biafra. A ponderação é justa e precisa. Não há por que estranhá-la, tais os elementos de aclaramento que alinha.
Morrem em Biafra, sofrem ali os piores horrores duma guerra irracional, são torturados, queimados, dilacerados em Biafra, exatamente aqueles Espíritos que, há quase um quarto de século, integravam a horda nazista que tantas desgraças impuseram aos seus semelhantes! Repare-se que, essencialmente os jovens, as crianças acima de tudo, são as principais vitimas do abominável movimento separatista. Observe o leitor as imagens que as revistas nos transmitem: criaturas esquálidas, cadavéricas, morrendo de inanição no meio das ruas; esqueletos se arrastam nas sarjetas e a antropofagia começa a generalizar-se; os corpos se amontoam em tétricas pilhas, misturados aos quais há alguns que ainda se estertoram, mas para quem não há a mais mínima esperança de socorro; a cremação é a única solução e nela alguns mortos vivos vão gemer suas últimas dores.
Outros, ainda respirando, acabam devorados pelos abutres, quando não são as formigas que lhes vêm assinalar as derradeiras torturas físicas e psicológicas. A loucura encontra muitos deles; a peste extermina milhares; o suicídio responde pelo desespero de mães que a ele recorrem antes de consumar a dramática e incoercível necessidade de devorar as carnes dos próprios filhos!
Onde foi, mesmo, que já vimos esse quadro aterrador? Certamente em Auschwitz, em Dachau, em Buchenwald, campos de concentração alemães, nos quais os sanguinários nazistas faziam sabão de judeus e “abat-jours” da pele dos prisioneiros...
Não há por que por em duvida: alguns desumanos nazistas já voltaram e resgatam na própria carne os seus repulsivos crimes. É essa dura mas justa resposta que o Espiritismo oferece e que, antes de macular a perfeição de Deus, dá-lhe configuração equânime e sábia. O Cristo fora portador dessa implicação: “A cada um será dado segundo as suas obras”...
A Lei da Reencarnação é a única justificativa honesta e sem rebuços, que o Espiritismo trouxe aos homens e que basta para coloca-los diante dos efeitos da alegria ou da dor, da tormenta ou da paz, conscientes da sua verdadeira causa. Isto vale dizer (e aqui entra o maior benefício que a Doutrina dos Espíritos legou ao mundo): devemos sopesar cada ato, cada palavra, cada pensamento nosso, pois em função deles faremos desenrolar o nosso amanhã, que bem poderá ocorrer na tranqüilidade e na despreocupação das areias de Copacabana, ou nas aquerônticas terras de Biafra...
E agora, se me perguntam, ainda, onde está Deus, posso responder conscientemente: Deus estava no Reich e não foi ouvido...
http://www.omensageiro.com.br/artigos/artigo-43.htm