Autor Tópico: Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência  (Lida 133256 vezes)

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Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #600 Online: 19 de Fevereiro de 2012, 18:36:59 »
Já fiz algumas perguntas direcionadas ao Buckaroo, por ele não respondidas, acho que neste mesmo tópico.

Eu não vi, ou não lembro de ter visto. Se houver outras, por favor as refaça.

 

Citar
O conhecido efeito do membro fantasma deixa de existir pela simples verificação de que se trata de um efeito ilusório?

Que eu saiba não é exatamente isso que acontece, mas o truque com os espelhos é meio que um "hack" no mapeamento cerebral, criando uma ilusão para curar outra.



Citação de: Cientista
Uma alucinação desaparece quando se está cônscio, de qualquer forma, de que trata-se de uma alucinação?
Não.


Citação de: Cientista
Considere, apenas como uma empenhada manifestação de muita boa vontade sua que seja, que sejamos o produto de um processo ilusório. Em que condições você proporia que a ilusão desapareceria ao verificarmos que é uma ilusão? Afinal, do que se trata uma ilusão? Ou você propõe que ilusões, ou melhor, efeitos ilusórios não existem?

Se interpretei corretamente isso no contexto dessa discussão, o que você está propondo é que tudo isso que temos como "experiência subjetiva" seria "ilusório", e não iria desaparecer apenas por isso, da mesma forma que as outras ilusões não desaparecem apenas por estarmos cientes disso. Penso que isso é essencialmente uma falsa analogia, pois qualquer ilusão nossa já é uma experiência subjetiva. Ou seja, seria mais ou menos análogo a dizer que não há um problema com a origem da vida, que seria explicada com a teoria da evolução, mas esta só funciona a partir do momento em que já existe vida ou algo muito próximo disso, não podendo assim explicar a origem da vida mesmo.

Essa contestação de qualquer forma é restrita a apenas um ou alguns dos conceitos de qualia existentes, e tenho a impressão que algumas vezes por aqui os dois ou quantos lados forem da discussão usam uma mesma terminologia para conceitos diferentes. É perfeitamente aceitável, e o mais razoável, que qualia ou experiência subjetiva seja uma ilusão no que isso significar que, essas propriedades observadas subjetivamente não são algo real, inerente a física daquilo que ativa nossos sentidos. Isso é, a freqüência de luz de uma dada cor não tem inerentemente alguma propriedade desconhecida que é aquilo que percebemos como dada cor. É só uma ilusão, como um "rótulo mental" que teoricamente talvez pudesse ser arbitrário.

O problema dos qualia que penso que eu e a maioria dos que aceitam isso como um problema enxergamos não trata desse primeiro conceito, mas sim no funcionamento e natureza desse "rótulo mental", como uma ilusão. Não é um problema que desaparece apenas por se identificar nossas percepções como "ilusões", mas começa justamente tendo isso como ponto de partida, e sem questionar isso.


Citar
Como o termo já cunha, qualia é a proposta filosófica de que há *qualidades* subjetivas que o "eu" seria capaz de captar de certas propriedades físicas da realidade e que seriam totalmente desvinculadas de variações quantitativas das mesmas. Eu já fiz um certo esforço para demonstrar a invalidez dessa perspectiva, notadamente no caso das cores, aqui:

../forum/topic=24235.75.html#msg583158

Se você ainda não leu, por favor, leia e procure ponderar bem.

Não sei se ainda li, mas me parece mesmo que usamos o mesmo termo para significados distintos, por essa sua última descrição de qualia.

Offline -Huxley-

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #601 Online: 19 de Fevereiro de 2012, 19:40:57 »

Se interpretei corretamente isso no contexto dessa discussão, o que você está propondo é que tudo isso que temos como "experiência subjetiva" seria "ilusório", e não iria desaparecer apenas por isso, da mesma forma que as outras ilusões não desaparecem apenas por estarmos cientes disso. Penso que isso é essencialmente uma falsa analogia, pois qualquer ilusão nossa já é uma experiência subjetiva.

Eu também estou com extrema dificuldade para entender esse conceito de “ilusão de consciência subjetiva”. Se me parece que estou consciente, então estou. Não posso ter ilusão da consciência se não estiver consciente. Foi por isso que coloquei aquele trecho de texto do Searle na página 22 em que é dito: “(...)o fenômeno padrão das reduções eliminatórias é mostrar que o fenômeno reduzido é apenas uma ilusão. No entanto, no que diz respeito à consciência, a existência da ilusão é a própria realidade.”.

Uma consequência lógica de se acreditar na “ilusão de consciência = negação da realidade da consciência” é a necessidade de afirmar que o “penso, logo existo” NÃO É uma visão de realidade absolutamente irrefutável.
« Última modificação: 19 de Fevereiro de 2012, 20:08:34 por -Huxley- »

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #602 Online: 19 de Fevereiro de 2012, 20:22:57 »
Acho que o Dennett comete o mesmo erro em algum trecho já anteriormente citado. O que chamam de "inexistência" poderia ser no máximo emergência.

Mas quanto ao ponto do Cientista, eu acho que o trecho posterior a esse deixa bem claro ser um problema de terminologia (ele estaria lidando com as concepções "realistas" e "relocacionistas" de qualia). Ele concorda conosco, mas o problema para ele acaba onde para nós apenas começa.

Fiquei até surpreso em saber que há quem supõe que "qualia" seriam uma espécie de propriedade real captada pelos nossos sentidos, paralela às propriedades "clássicas", em vez de uma representação/rotulação das propriedades "clássicas".

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #603 Online: 19 de Fevereiro de 2012, 21:12:26 »
Buck,

O problema é que não há esse problema da qualia, se o vermelho parecesse verde, chamaríamos o verde de vermelho, sem mudar absolutamente nada a alguém

E e eu disse algo diferente disso? :hein:

O problema é o que é esse "parecer". Seria possível que pessoas diferentes enxergassem "negativos" ou "cores inimagináveis", apenas dando os mesmos nomes às mesmas freqüências de luz, como quer que "pareçam" subjetivamente, sendo as "aparências" criações "puramente mentais", arbitrárias? Ou a natureza física do cérebro faz com que uma dada freqüência de luz seja sempre percebida por cérebro suficientemente igual/saudável com uma determinada "aparência", que seria igual a de qualquer outro cérebro (ou cérebro humano)? Não sendo esta um rótulo 100% arbitrário (diferentemente de uma palavra), mas algo de alguma forma físico, ainda que um produto do cérebro, e não algo inerente àquela freqüência de luz. Etc.


Citar
O ponto a que eu quero chegar é: não interessa como vemos o vermelho, todos rotulam aquela luz com o comprimento de onda X de vermelho, não interessa como sentimos o toque, todos chamam um a sensação tátil de algo encostando em você como um toque. São apenas rótulos.

 ::) Talvez "não interesse", para você, mas é justamente o centro da discussão.

Não sabemos o que é isso, como se dá essa "rotulação mental" (que, para deixar claro, não é usar um termo ou outro para uma sensação, percepção, mas a natureza da percepção/experiência -- tudo aquilo que constitui a sensação de "como é ser como uma pessoa".

A partir de termos a experiência de sermos uma pessoa, imaginamos que é razoável supor não ser muito diferente a experiência de "como é ser um chimpanzé", e um pouco mais distante a experiência de "como é ser um cachorro", ou um morcego, mas que "a experiência de ser um jogo de bilhar" é algo destituído de sentido. Mas aquilo que nos dá a experiência de sermos uma pessoa é o nosso cérebro, e é um "jogo de bilhar" que ocorre em nossos e em outros cérebros, apenas em vez de bolas de PVC temos toda uma variedade de proteínas e entrando em "caçapas" também de outra composição química. No entanto existe a experiência subjetiva de "ser como uma pessoa", enquanto "ser uma mesa de bilhar" é apenas coisa de desenhos Disney. O que causa essa diferença, além do óbvio? Onde realmente termina essa experiência subjetiva? Talvez seja "mais cedo" do que imaginamos, se supomos que é preciso apenas de algo suficientemente parecido com nosso cérebro -- pois como postaram anteriormente, aparentemente durante o sonambulismo as pessoas não tem uma experiência subjetiva, estão num estado de sono inconsciente.



Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #604 Online: 19 de Fevereiro de 2012, 21:27:39 »

A questão é que não temos uma base neurofisiológica para explicar o como é que o cérebro cria essas representações, e as representações que eu falo são o gosto, a visão, o olfato, o tato.

Frisando novamente que, assim como saber toda a cinética necessária para o entendimento do motor de um carro não nos leva a entender seu som e suas sombras, poderíamos saber tudo que há para saber de neurologia e como a informação é codificada no cérebro, sem ainda entender como é que delas surgem as suas "aparências".


Citar
Isso não leva a uma óbvia conclusão de que existe uma dicotomia mente/cérebro. A única conclusão que leva é que mais estudos são necessários para a compreensão do fato.

Eu tenho uma forte impressão de que é algo inerentemente insondável. Só podemos observar coisas como "observadores externos". A única coisa que podemos observar por essa perspectiva subjetiva é nossa própria perspectiva quando temos os estados neurais que nos dão experiência subjetiva. Não temos como "colocarmos uma mini-câmera" para tentarmos observar "outras" subjetividades, e acho que de modo geral tentar entender isso a partir de observações externas se parece demais com um "representacionismo ingênuo", como se em algum lugar do cérebro fôssemos encontrar maçãzinhas vermelhas e esterquinho fedidinho em miniatura.

E ironicamente (ou não), acho que essa é a melhor "explicação" que eu já vi. Seria tudo um aspecto da realidade do que acontece de fisicamente em nosso cérebro que só pode ser "observado" por essa perspectiva. Acho que no texto que li isso tinha alguma analogia, ou melhor explicação, mas não me lembro. Depois vejo se encontro esse texto. Talvez já tenha colado um trecho aqui mesmo.

Offline Sergiomgbr

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #605 Online: 19 de Fevereiro de 2012, 21:41:30 »

Propriedades reais captadas pelos nossos sentidos não são o que os qualia viriam a hipoteticamente se converter logo após serem corroborados pela ciência deixando de ser então representações ou rótulos das propriedades clássicas dos nosso sentidos? Qual é a surpresa de se supor isso?
Até onde eu sei eu não sei.

Offline Sergiomgbr

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #606 Online: 19 de Fevereiro de 2012, 21:50:19 »
Essa questão de qualia é uma investigação nonsense, a princípio, pelo potencial de indagações que pode produzir até no nível de questionar se você comprende minhas dúvidas como eu as concebo, como algo que enquanto eu pergunto se "tem pão novo" isso significa pra você se "vai chover"? O nosso próprio código de linguagem, no caso, seria questionável(como é de fato pois se trata de uma formalização!) a níveis absurdos.
Até onde eu sei eu não sei.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #607 Online: 19 de Fevereiro de 2012, 21:50:58 »

Tenho a impressão que a questão dos qualia é apenas um problema filosófico inventado para combater o fisicalismo.

Eu já tenho a impressão de que os ateus desmerecem/fogem do assunto porque, sob análises mais preguiçosas, parece poder ser favorável a idéias de "alma" e etc. Então tem uma resistência a lidar com isso, encaram como uma ameaça a [des]crença.



É muito dificil lidar com a subjetividade, entendendo a subjetividade como "o mundo interno de todo e qualquer ser humano. Este mundo interno é composto por emoções, sentimentos e pensamentos". http://pt.wikipedia.org/wiki/Subjetividade

Assista o vídeo abaixo e responda o que aconteceu com a vermelhidão do vermelho daquela moça.



Como é que isso faz o problema de qualia "desaparecer", em sua perspectiva?

Acho que apenas se você supor que: ou o qualia "vermelho" é algo inerente a frequência de "luz vermelha", algo físico que existe fora do cérebro; ou que é algo que apenas existiria na mente ou no cérebro, mas que este é "a prova de hipno-hacking", e portanto "não existiria", uma vez que o que vimos seria prova de que é possível "hackear" isso.

Mas aceitando ao vídeo "at face value", ele só refuta a esses conceitos, ainda há a experiência subjetiva daquela mulher que viu a freqüência de luz que normalmente rotulamos como "amarelo" com o qualia "vermelho", e a freqüência de luz normalmente por nós chamada/vista como "vermelho" como se tivesse o qualia que associamos à pouca luminosidade.

O que eu digo é que não sabemos o que aconteceu além do óbvio/superficial, que ela teve essa ilusão; não sabemos o que é essa "imagem mental" e como ela é criada, apenas que não é algo impossível de ser "hackeado". Isso que eu disse de alguma forma parece um "ataque ao fisicalismo"? Como?

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #608 Online: 19 de Fevereiro de 2012, 22:31:11 »
Acho curioso que, ao mesmo tempo em que todo mundo por aqui parece ser "representacionista" em vez de adepto de "naive/folk/common-sense realism", essa perspectiva "representacionista" da realidade dificilmente pode existir sem "qualia", aqui significando essa própria representação, ou como a representação "aparece" a nós, não meramente suas bases neuronais.

Acho mais fácil de "entender" o que se passa pela cabeça de um "naive-realist" do que de um representacionista que "nega" a própria experiência com exemplos que mostram como as pessoas tendo experiências -- refutação que seria mais do "naive-realism" do que de qualia nesse sentido representacionista.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #609 Online: 19 de Fevereiro de 2012, 22:47:18 »
Daniel Dennett, identifica quatro propriedades que são comumente associadas aos qualia, isto é, os qualia são:

    inefáveis; isto é, não podem ser comunicados ou apreendidos por outros meios diferentes da experiência directa.
    intrínsecos; isto é, são propriedades não relacionais, que não se alteram conforme a relação da experiência com outras coisas.
    privados; isto é, todas as comparações intersubjectivas dos qualia são sistematicamente impossíveis.
    directa ou imediatamente apreensíveis pela consciência; isto é, "experienciar um quale" é "saber-se que se experiencia um quale, sabendo-se que é isso mesmo tudo quanto há a saber sobre esse quale".


Até posso mudar de idéia um dia, mas no momento vejo esses qualia como versão do dragão na garagem da neurociência.

Qual o problema com essas características? Como elas fazem da nossa percepção da representação cerebral dos dados sensoriais um "dragão na garagem"?

Por que isso é "pior", mais "dragão na garagem", do o "efeito do observador" na física? Daria para dizer que esses estados "não existem" se estão sendo sempre mudados a cada medição, nunca podendo ser duplicadas as medições sobre um mesmo objeto.

E eu acharia até mais razoável alguém negar a existência de quanta do que da própria experiência subjetiva... está quase como um niilismo, do tipo achar meio doidas as propriedades do universo de começar do nada ou algo assim, e então concluir que o universo não existe, que é um "dragão na garagem".

Offline FZapp

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #610 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 02:11:16 »
Buckaroo, para mim a principal diferênça é que a física quântica é a que melhor explica fenômenos reais. Se não gostar da teoria, podemos propor outra, desde que se encaixe com as observações.

Já o qualia é uma explicação em si mesma, incomprovável, e como Gigaview também acho que é um dragão verde (não, laranja).
--
Si hemos de salvar o no,
de esto naides nos responde;
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algun día hemos de llegar...
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Offline Cientista

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #611 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 02:16:25 »
Vamos tentar melhor. O Huxley afirma que não pode ter ilusão de consciência se não estiver consciente. Certamente que se não houver o processo corrente, a dinâmica do maquinário que produz o efeito consciente, não poderá haver a ilusão. Mas isso não implica em que a própria sensação do processo *como mais que o simples processo* (explico melhor a seguir, pois vejo que muito está sendo desconsiderado) não seja ilusória.

O Buckaroo está enganado em pensar que meu conceito é diferente do dele. É o mesmo. A qualidade que é projetada no parâmetro físico não está lá mais que parametricamente, mas é projetada todavia. Eu entendo perfeitamente que alega-se uma *percepção especial* da mesma grandeza. Tanto que o cerne mesmo do criado problema de qualia estaria nas supostas diferenças subjetivas que seriam percebidas por cada um. Fica claro que o que eu disse não foi bem entendido.

De novo quanto ao Huxley, exatamente, "penso, logo existo" NÃO É uma visão de realidade absolutamente irrefutável. E eu já toquei nisso em outro tópico. Vou ver se acho. Ainda assim, "existo, logo penso" seria a confirmação de "penso, logo existo"? É preciso definir o que é esse pensar e o que é e no que implica esse existir.

De volta ao Buckaroo, não, não tão precisamente concordo com vocês (já esclareci que nossas concepções de qualia não são essencialmente diferentes). Na verdade, o que ocorre é que vocês criam um (duplamente suposto) problema novo onde um antigo já está extinguido. O pensamento primordial filosófico, gerador do senso místico de religiosidade em expressões diversas, totalmente destituído de informações empíricas sobre sistemas complexos dinâmicos, realimentados, programados e de respostas automáticas não permite o tipo de questionamento que pode haver com tais informações. Com tais informações, o que descobre-se é que o "eu" É uma ilusão. Nós não acabamos de descobrir o "eu", a consciência para, a partir de agora, tentarmos descobrir o que seria. Fomos e somos esta ilusão todo o tempo e, agora, temos meios para concluir que é uma ilusão.


Agora, o porquê do "*como mais que um simples processo*" mais acima.

Da maneira como vocês interpretam o que significaria a ilusão consciente ser ilusão, faz parecer que, seja ou não ilusão, não haveria ulteriores implicações. Quaisquer outros desdobramentos seriam os mesmos e não faria diferença alguma sermos ou não ilusões de existir. Mas é claro que há implicações tremendas e enormes diferenças. Ser ilusão significa que não se tem escolha, que não se tem controle sobre si mesmo. Ser ilusão significa que há determinismo e que a ilusão consiste, precisamente, na incapacidade de perceber isto diretamente. Por esta razão, é deste tipo de incapacidade que se deve procurar dotar replicadores da consciência humana. É por aí que devem ser delineados os modelos implementáveis do terceiro nível de programação -- o nível do por quê?
« Última modificação: 20 de Fevereiro de 2012, 02:19:52 por Cientista »

Offline Cientista

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #612 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 02:31:26 »
Achei e aqui está:


"Nietzsche lembrou que o “eu penso” de Descartes não poderia mostrar um sujeito agindo, pois, se observarmos a nós mesmos corretamente veremos que não é o eu que pensa, é o pensamento que vem ao eu, pegando-o até mesmo desprevinido. Não é só no sonho que o pensamento dá ordens ao eu ou aparece ao seu bel prazer, também na vigília o pensamento funciona sem comando. Ninguém consegue a todo momento comandar o que pensa. O pensamento vem ao eu como ele quer."


Mas o "penso" de Descartes não se refere necessariamente a um ato voluntário e ativo do indívíduo (pode ser ativo ou não) e sim ao fato dele SABER que pensa, de ter consciência desse pensamento. Se ele tem consciência do pensamento, logo ele sabe que ele existe. Essa crítica de Nietzsche não diz absolutamente nada contra isso, é uma mera divagação ou "curiosidade" paralela baseada em uma interpretação semântica alternativa (e errada) da frase do Descartes.

A crítica não é a parte do "existo", mas a idéia de sujeito que Descartes tem - livre, autônomo e com existência independente do mundo físico.

Descartes defende isso??

A minha leitura do que ele afirma não me permitiu tirar essa conclusão, mas apenas essa:

 

1- Ele defende que a forma correta de se obter conhecimento é duvidando sistematicamente de tudo. Nesse processo, sobrariam apenas aquelas coisas mais auto-evidentes, que seriam como os axiomas da matemática, sobre as quais todo o resto do conhecimento se assentaria.

2- O "axioma" mais fundamental existente seria a própria existência do sujeito pensante. Essa é a verdade mais fundamental, dado que o próprio fato de pensarmos já nos informa que existimos. Daí o "Penso, Logo Existo".

3- Nada é dito sobre o sujeito. Não se afirma que ele é independente do mundo físico, autônomo, livre, que ele controla o próprio pensamento e o diabo a quatro. Afirma-se APENAS e TÃO SOMENTE que o sujeito pensante SABE que ele próprio existe. Só isso.
A falácia cartesiana...

Se parte-se do princípio da dúvida sistemática sobre tudo, a última coisa da qual se duvidará, como se verifica, na prática, ocorrer, será de si próprio, o 'centro duvidador', permitam-me chamar assim. Até mesmo nunca se duvidará dele, que se torna um núcleo inexpugnável porque, para manter a tática de abordagem da realidade pela dúvida, o centro duvidador é essencial. E esta foi a razão do que poderia-se chamar de (permanente) "fracasso" no "progresso científico humano", o que torna verificado o fato de que a dúvida sistemática não é um caminho para ciência, a menos que ela não permita que sobre absolutamente nada duvidável, em circunstância alguma, como o "eu", por exemplo, o que seria contraditório pela própria descrição acima.

A existência do "eu" não é uma base axiomática fundamental válida e já se bate de frente nas suas contra-provas. Axioma muito mais fundamental é a inexistência do "eu", que se adapta mais abrangentemente na realidade. Se o pensador sabe que existe, está enganado pelo próprio pensamento.

A suposta existência do "eu" é a mentira mais fundamental.

Um pensador científico adota a crença sistemática em tudo que ele não inventa e que pode ser empiricamente verificado, como, por exemplo, a verificação da existência de todas as demais formas de vida e de que tais formas de vida guardam semelhanças genéricas e essenciais com ele mesmo. A partir daí e de muitas outras verificações empíricas, verifica que pensar não é evidência de existir, mas de pura ilusão de existir. Então, o "penso, logo existo" é um princípio que, cientificamente, cai por terra. Assim, o centro cognitivo pode se desfazer e ser adotada uma "transformação" adequada de referencial cognitivo, cujo centro não seja mais a rede física processadora do "eu".

Offline DDV

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #613 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 11:39:13 »
Tópico interessante. Vou favoritar pra ler tudo com calma depois.
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Offline Moro

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #614 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 13:26:35 »
Interessante? Para mim é uma discussão simples desviada do que interessa para um sem fim de considerações sem sentido. O hard problem simplesmente nao é hard nem problem.
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Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #615 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 16:55:20 »
Buckaroo, para mim a principal diferênça é que a física quântica é a que melhor explica fenômenos reais. Se não gostar da teoria, podemos propor outra, desde que se encaixe com as observações.

Já o qualia é uma explicação em si mesma, incomprovável, e como Gigaview também acho que é um dragão verde (não, laranja).

Qualia não é "explicação" alguma, qualia é a "coisa"/fenômeno a ser explicado.

Essa discussão carace muito de uma definição universal dos termos.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #616 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 16:59:23 »
Todos os posts do Agnóstico são meio equivalentes alguém que, numa discussão sobre física subatômica, ficasse falando coisas como "putz, mais dessa enrolação de partículas menores do que prótons, neutrons e elétrons... já não é claro que na prática, só existem os elementos da tabela periódica? E essa metafísica bullshit toda custa caro... trocentos bilhões e nada de bóson higgs... nenhuma particulazinha subatômica que seja... e logo vão estar construindo um maior para ver se encontram o groselhon, o loroton, o marmeladon, o conversafiadon. Quando é tudo muito simples, não existe nada além de prótons, elétrons e nêutrons. Quando as pessoas vão finalmente entender isso e parar de viajar?"

Offline Geotecton

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #617 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 17:12:57 »
[...]
e logo vão estar construindo um maior para ver se encontram o groselhon, o loroton, o marmeladon, o conversafiadon. Quando é tudo muito simples, não existe nada além de prótons, elétrons e nêutrons. Quando as pessoas vão finalmente entender isso e parar de viajar?"

 :histeria:
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Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #618 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 17:43:05 »
O Buckaroo está enganado em pensar que meu conceito é diferente do dele. É o mesmo. A qualidade que é projetada no parâmetro físico não está lá mais que parametricamente, mas é projetada todavia. Eu entendo perfeitamente que alega-se uma *percepção especial* da mesma grandeza. Tanto que o cerne mesmo do criado problema de qualia estaria nas supostas diferenças subjetivas que seriam percebidas por cada um. Fica claro que o que eu disse não foi bem entendido.

Eu não sei bem o que você quer dizer por uma "pecepção especial", que fosse diferir de uma "ilusão" a ponto de realmente discordarmos.


Citação de: Cientista
De volta ao Buckaroo, não, não tão precisamente concordo com vocês (já esclareci que nossas concepções de qualia não são essencialmente diferentes). Na verdade, o que ocorre é que vocês criam um (duplamente suposto) problema novo onde um antigo já está extinguido. O pensamento primordial filosófico, gerador do senso místico de religiosidade em expressões diversas, totalmente destituído de informações empíricas sobre sistemas complexos dinâmicos, realimentados, programados e de respostas automáticas não permite o tipo de questionamento que pode haver com tais informações. Com tais informações, o que descobre-se é que o "eu" É uma ilusão. Nós não acabamos de descobrir o "eu", a consciência para, a partir de agora, tentarmos descobrir o que seria. Fomos e somos esta ilusão todo o tempo e, agora, temos meios para concluir que é uma ilusão.

Não sei como o "eu" acabou entrando na discussão, acho que "eu" e "qualia" são suficientemente distiontos para merecerem um tratamento separado, ou no mínimo uma elaboração melhor de como uma coisa se conecta com a outra. De outra forma só  se acrescenta confusão com o que cada um quer dizer com os termos ou suas respectivas inexistências.


Citação de: Cientista
Agora, o porquê do "*como mais que um simples processo*" mais acima.

Da maneira como vocês interpretam o que significaria a ilusão consciente ser ilusão, faz parecer que, seja ou não ilusão, não haveria ulteriores implicações. Quaisquer outros desdobramentos seriam os mesmos e não faria diferença alguma sermos ou não ilusões de existir. Mas é claro que há implicações tremendas e enormes diferenças. Ser ilusão significa que não se tem escolha, que não se tem controle sobre si mesmo. Ser ilusão significa que há determinismo e que a ilusão consiste, precisamente, na incapacidade de perceber isto diretamente. Por esta razão, é deste tipo de incapacidade que se deve procurar dotar replicadores da consciência humana. É por aí que devem ser delineados os modelos implementáveis do terceiro nível de programação -- o nível do por quê?

Continuo sem entender exatamente do que discordamos. Não acho que exista "livre-arbítrio", e que sim, essa percepção cotidiana disso é uma ilusão. Não sei o quanto isso é igual às ilusões que nos representam ou codificam o mundo captado por nossos sentidos, exceto por serem ilusões.



Enfim, ainda me parece que você simplesmente usa o termo "ilusão" para o que eu uso o termo "qualia", que talvez poderia descrever também como "ilusões produzidas pelo sistema nervoso que nos conferem uma capacidade de orientação bastante funcional" -- onde as "ilusões" no sentido corriqueiro seriam "distorções" dessas ilusões que façam com que as correlações delas com propriedades do ambiente sejam menores de forma a não servirem mais como uma orientação funcional.

Independentemente disso, do que exatamente queira dizer por essas "ilusões", fico curioso em saber que outras "coisas", que outros tipos de seres -- como outros animais ou robôs -- supõe que poderiam ser sujeitos a ilusões suficientemente similares à humana, e por que. Quais as bases para a suposição de que isso ocorre, que "experienciariam subjetivamente uma ilusão de experiência subjetiva" de forma bastante similar a humana. Minha curiosidade é especialmente quanto às ilusões relacionadas ao sistema sensorial, embora talvez julgue que para que haja essa "categoria" de ilusões, precise haver primeiramente a outra, o "eu".

Offline Sergiomgbr

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #619 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 17:53:15 »

[...]
e logo vão estar construindo um maior para ver se encontram o groselhon, o loroton, o marmeladon, o conversafiadon. Quando é tudo muito simples, não existe nada além de prótons, elétrons e nêutrons. Quando as pessoas vão finalmente entender isso e parar de viajar?"

:rola:
Até onde eu sei eu não sei.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #620 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 18:11:32 »
Há quem perceba um vácuo entre o estímulo, sua percepção no cérebro e seu entendimento e à esses hiatos denominam qualia. Eu, por minha vez, ainda não vi função pra ela.

Não é bem um "vácuo", é aquilo que "temos a impressão" de ter, de experienciar quando vemos cores (por exemplo), mas que aparentemente não ocorre com uma pessoa com "visão cega" ou com um sonâmbulo, e que também não costumamos presumir acontecer com tantas outras coisas que tenham percepções de estímulos e seus respectivos entendimentos (como eletrônicos variados).

Uma ilustração seria com a noção meio caricata do "homúnculo". As coisas são meio como se houvesse em nossas cabeças um "eu" em miniatura para quem são projetadas essas imagens (ou símbolos) do mundo exterior, de acordo com as informações sensoriais. Quando a pessoa é sonâmbula, tudo (ou quase tudo) ocorre sem que as coisas sejam projetadas por esse "homúnculo", que está completamente inconsciente no momento. Com "visão cega" é algo um pouco parecido, mas o "homúnculo" está acordado e consciente, embora não lhe seja projetada imagem alguma na "tela". Ele se julga incapaz de se orientar visualmente, mas no entanto o restante do cérebro ainda tem alguma capacidade de fazer isso, e ao homúnculo isso parece um "palpite certeiro", do qual ele próprio duvida.


Mesmo descartando esse "homúnculo" ou algo muito análogo como parte do "mecanismo" (usei aqui apenas para melhor visualização do problema), até porque seria um "loop inifinito", ainda há o problema dessas percepções correlacionadas a imagens que percebemos e o fato de que essa percepção aparentemente não é "necessária", dado que há casos onde ela não ocorre apesar de ainda haver orientação visual, e naquilo que for necessária -- como a uma orientação visual talvez mais refinada -- ainda não é nem um pouco evidente exatamente o que é isso, além de que uma "ilusão". Como a neuroquímica cria essas "imagens", "odores", "sons", que, obiamente, não são "miniaturas" do que se encontra no mundo exterior, mas "ilusões" ou "representações"/"símbolos". Podemos criar uma outra coisa, um robô, um computador, que também tenha "algo" assim correlacionado a um fluxo de informações, de processamentos? Ou todo o processamento de um computador não seria nunca acompanhado dessa "experiência", mas algo "puramente mecânico", na falta de uma expressão melhor para algo que julgamos não ser dotado dessa "experiência interior"? Como podemos saber?

Offline Sergiomgbr

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #621 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 18:29:45 »
Um vaticínio pressupondo uma instância para Qualia. Já que temos a percepção das propriedades do mundo que nos rodeia como por exemplo, a diferenciação de um átomo de ferro de um de mercúrio, pela massa atômica etc. e mais amiúde há diferenciações entre isótopos e entre ions da mesma substância, ser-nos-á perfeitamente factível que cada indivíduo é único mesmo em como interpretam "a vermelhidão do vermelho", pois todo o mecanismo de detecção da "vermelhidão do vermelho" está condicionado a condicionantes a níveis cada vez mais insuspeitos das características intrínsecas da matéria como por exemplo, spins de um eletron. Assim a "vermelhidão do vermelho" não sendo convencionável.
Até onde eu sei eu não sei.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #622 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 18:53:46 »
Existe tanto a possibilidade de que cada pessoa tenha suas próprias "paletas" individuais, supondo poder ser algo bem arbitrário, bem como por alguma restrição física, serem mais parecidas/não arbitrárias (não em relação direta com o estímulo, mas em relação a como ele seria codificado fisicamente no cérebro).

Acho que para saber isso teria que se ter como "entrar na cabeça" das pessoas e ver como as cores são representadas internamente em cada um.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #623 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 20:28:38 »
Revendo um post anterior do Cientista para ver se tiro dele algo que não tinha tirado antes.

O "problema *difícil*" (por favor, traduzamos o hard do hard problem assim) da consciência não existe pois que é, simplesmente, *a* ilusão. Veja, não é, simplesmente, "uma" ilusão. É a própria, em "pessoa". A ilusão é a essência da consciência; é a própria "substância" de que a consciência, o "eu", é feito.

Aqui novamente me parece mais ser o caso de trocar o termo "qualia" por "ilusão" e achar que pronto, explicou a coisa toda, acabou com as "crendices estúpidas", quando só trocou um termo e deu por encerrado, cruzando os braços achando que fez alguma coisa.



É por isso que não é possível percebê-la diretamente pois tal seria equivalente a um tipo de suicídio quase arquetipicamente equiparável ao da mitológica Medusa olhando-se no espelho.

Não sei quem falou qualquer coisa sobre que deveríamos "perceber diretamente" que são ilusões. A nossa percepção direta é de um "realismo folk/naive", e apenas a partir de alguma introspecção entendemos o "problema", que as coisas no ambiente não são diretamente vista mas codificadas em "ilusões" ou "qualia" (ou qualquer que seja um termo mais neutro e que evitasse a confusão do uso comum de ilusão como uma "percepção falha", e não como "percepção")


Toda ilusão é criada linguisticamente. A linguagem é a única maneira pela qual um sistema cognitivo pode distorcer a realidade porque a linguagem estrutura-se por representações simbólicas da realidade e, também (e aqui está o problema), por representações simbólicas das representações simbólicas*.


*Acho que a proposta do Gilberto passa por aí.

Novamente tendo a interpretação de que apenas troca "qualia" por "ilusão", e refuta mais noções parecidas com um "folk realism" -- como a que a de a nossa "ilusão" do vermelho fosse não algo criado em nossos cérebros, mas algo realmente inerente à freqüência de luz vermelha.




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A pergunta não é por que nós vemos assim; a pergunta é o que você esperaria ver se não fosse assim. No processo evolutivo, o sistema óptico-cerebral (ou neuro-óptico..., não estou certo de qual seria o termo mais adequado) "teve que encontrar" alternativas para além das percepções de luminância (gradações de cinza) para enriquecer, de alguma forma, a eficiência competitiva. Então, o sistema visual evoluiu para a percepção de outro tipo de *gradações* (porque é o que a percepção de cores é; nada qualitativo mas gradativo) -- cores (ou, mais apropriadamente, matizes) variando gradualmente. Só isso, o reconhecimento de que todo um aparato físico visual totalmente específico para a percepção de cromaticidades teve que evoluir na fisiologia neurológica e visual, sem o qual nenhuma "subjetividade colorida" poderia ter lugar já é suficiente para demonstrar a natureza física dessa subjetividade.

Aqui parece dialogar com algum espantalho de um interlocutor que ignorasse evolução, e que supusesse que a questão de alguma forma nada tivesse a ver com física.

O problema é que, sabendo como se deu a evolução da visão a cores, e praticamente tudo que houver para se saber do processamento visual, ainda não é possível responder com qualquer certeza que representação ou "ilusão" de uma dada cor a um indivíduo é a mesma a todos indivíduos da mesma espécie sem diferenças como daltonismo ou algo neurológico, apenas que eles identificarão as mesmas cores pelos mesmos "nomes", mas nada podemos dizer sobre se "ver o mundo através de seus olhos" seria igual. Muito menos "o que é" isso, além de "uma ilusão funcional/adaptativa".



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Também, não há qualquer motivo para concluirmos que, já que foi um processo evolutivo cujo resultado estrutural (portanto, herdado por todos os descendentes normais) que delineou o aparato visual de cromaticidades, uns enxerguem algo diferente dos outros.

Apenas se você supuser que há correlações  muito fortes entre o estímulo, a cadeia de processos que ele desengata no sistema nervoso, e a representação/"ilusão" resultante. Mas não é de forma alguma algo garantido, e não temos como saber sem podermos de alguma forma ter "experiências subjetivas compartilhadas", ou de alguma forma conhecimento muito seguro de como são codificados os "píxeis" dessas ilusões/"o que são" esses píxeis.

As possibilidades para algo "fugir" disso vão desde variação genética neutra (porque a atribuição de ilusões de uma dada cor para a cor certa não é essencial para a adaptação, apenas que todo o repertório de ilusões fosse utilizado, uma para cada cor), até ser simplesmente algo não rigidamente determinado geneticamente, mas variáveis geradas "aleatoriamente" pelos cérebros individuais, desde que sempre pudessem discernir um estímulo de qualquer outro, por qualquer que fosse o rótulo/ilusão.

Eu não tenho uma opinião se é mais provável ser de uma maneira ou outra, mas parece razoável poder ocorrer coisas mais ou menos nesse sentido, parece haver algo que se aproxima um pouco disso em pessoas mais aptas a diferenciar tons de uma cor, sejam pessoas normais apenas melhor treinadas (como esquimós e variações de branco) ou com daltonismo (que distinguem melhor tons de cáqui do que não-daltônicos, onde talvez a esses tons estejam sendo aplicadas "ilusões" das cores que eles não identificam por insensibilidade ótica). O vídeo postado pelo Gigaview também talvez sugira que não seria nada espantoso que fosse algo "inventado" por cérebros individuais dada a aparente facilidade com que as "ilusões" foram trocadas na percepção subjetiva daquela mulher. Mas poderia bem ser de qualquer forma que fossem simplesmente "classes" de ilusões distintas, que "de fábrica" realmente a visão/ilusão de todos fosse "a mesma", mas isso não impedisse que fosse "hackeada" de forma que não tem muito em comum com sua determinação original.






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E os distúrbios de percepção cromática, que até devem reforçar essa concepção que acabo de apresentar, também devem determinar perceções idênticas em cada um dos portadores de cada tipo de distúrbio. Assim, qualquer variedade de dicrômatas e acrômatas, daltônicos, tritanópicos, etc. devem ter, em cada grupo específico, as mesmas percepções visuais, ainda que consideradas subjetivamente.

Mas vamos um pouco além. Basta uma simples 'olhada' atenta no diagrama CIE para entender isso (e alguns livros o apresentam em preto e branco). A distinção "qualitativa" (não é subjetiva, esta, pois são duas propriedades físicas totalmente diferentes da luz que são distinguidas) nesta visão mais complexa desenvolvida evolutivamente não é entre cores variadas, entre vermelho, verde, azul ou qualquer outro matiz, mas, apenas, entre luminância e matizes. Os matizes interpenetram-se quando variam, *exatamente*, assim como tons de cinza (luminâncias variadas). Apenas, nunca demos nomes específicos para certas gradações distinguíveis de tons de cinza, a menos de claro ou escuro que pode gerar a tal "subjetividade" também. Poderíamos, assim, falar na "cinzicidão" (com um nome específico, claro) de um certo cinza em relação a outros e nos perguntarmos se todos vêem aquele cinza específico "da mesma forma" e se há subjetividade nisso. Não existe subjetividade em nada além da ilusão. Aliás, o cinza, normalmente, é considerado uma cor também, *qualitativamente* diferente de branco ou preto, que não são considerados, tecnicamente, cores. Na escala dos matizes (tons de cinza "coloridos") teríamos algo análogo aos limites preto e branco -- as transições vermelho/infravermelho e violeta/ultravioleta.

Eu leio, leio, mas você simplesmente "afirma" a coisa, não tem nenhuma base maior do que alguém que dissesse que as percepções subjetivas são individuais e essencialmente infinitas, com diferente pessoas não vendo apenas espectros embaralhados, mas até cores que para a outra são inexistentes. E tudo variaria graus de valores de uma para a outra e etc, de forma que essa pessoa poderia até fazer um texto parecido com esse, apenas dizendo exatamente o contrário.


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Poderá o iludido dedicado e insistente alegar que a ilusão não pode ser provada. De fato, talvez seja a única coisa (paradoxalmente) "provável" que não pode ser provada. Mas pode ser feito algo muito melhor que isso: a ilusão pode ser mostrada assim como tem sido inumeravelmente mostrada a inexistência de deuses e demais artefatos mágicos e, inutilmente, para quem insiste na decisão de acreditar. Todavia, como a consciência não existe, não existem decisões e escolhas; tudo é como tem que ser.

Como disse algumas vezes, o problema não é o fato de ser uma "ilusão", mas qual é sua natureza exata, além de meramente se dizer que é causada por algum dado processo neurológico da qual ela não resulta de nenhuma forma minimamente "evidente". Ou seja, que é ilusão, OK, falta o "mister M" vir e mostrar qual é o truque.

Essa comparação com deuses, duendes e magia foi uma tremenda de combinação de uma saída pela esquerda deixando um espantalho-decoy. E o pior, parece que o espantalho acaba sendo do próprio argumento, pois tanto quanto posso me lembrar, todos os que defendem "qualia" no tópico não parecem divergir em nada significativo quanto a isso ser uma ilusão, muito menos algo que justificasse essas comparações desesperadas.

Não tem ninguém dizendo algo como "existem essas moléculas-fantasma, que compõem os qualia, elas fogem de todas leis da física e ficam geralmente guardadas debaixo do pote de ouro dos duendes no fim do arco-íris". O que se pergunta/coloca é que, diferentemente de "outras ilusões", essa(s) não é/são algo que conseguimos explicar, o que seria mais do que dizer ser uma ilusão, mas ser capaz de entender como elas se originam, não apenas paralelamente ao que.

Friso novamente que isso independe de se acreditar em livre-arbítrio ou algo que o valha; eu pelo menos não acredito, acho que o Huxley também não, e ironicamente, o Agnóstico faz o mesmo pouco caso com a idéia de não haver livre-arbítrio que ele faz com qualia, para se ter uma idéia de como são independentes.


Offline Cumpadi

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Re:Uma visão cética (sem bullshits filosóficos) da consciência
« Resposta #624 Online: 20 de Fevereiro de 2012, 20:30:47 »
Qualia não é "explicação" alguma, qualia é a "coisa"/fenômeno a ser explicado.

Essa discussão carace muito de uma definição universal dos termos.
O problema é que é um fenômeno inexistente, como se observa quando tentam tentam defini-lo, aliás nem conseguem definir ele direito.
http://tomwoods.com . Venezuela, pode ir que estamos logo atrás.

 

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